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Metas de inflação: é hora de ajustes

Para analistas, sistema entra numa fase de importantes mudanças

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Por Fernando Dantas
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O modelo de metas de inflação, hoje utilizado por vários países, resistiu bem à crise financeira global. Agora, porém, o sistema pode entrar numa fase de importantes mudanças, ligadas à necessidade de prevenir a formação de bolhas especulativas como a que culminou com o colapso do Lehman Brothers em setembro de 2008. Esta foi, resumidamente, uma das principais conclusões a serem tiradas do primeiro dos dois dias do 11º Seminário Anual de Metas para a Inflação, organizado pelo Banco Central (BC), no Hotel Copacabana Palace, no Rio. O Brasil, anfitrião do encontro, que celebra neste ano dez anos de introdução das metas de inflação, é apontado como um dos casos de maior sucesso do modelo. No seu curto período de vida no País, o sistema enfrentou crises violentas de 2001 a 2003 e momentos de forte puxada dos juros para manter a inflação na meta. O saldo, porém, é amplamente favorável: antes da crise global, o Brasil atingiu o mais alto ritmo de crescimento das últimas décadas, com inflação controlada e estabilidade macroeconômica quase inimaginável dado o histórico de turbulências do País. O economista Klaus Schmidt-Hebbel, da Universidade Católica do Chile, e ex-pesquisador do BC chileno, mostrou, durante o almoço de ontem, um gráfico baseado em dados sobre o desvio da inflação efetiva em relação às metas em vários países. No caso brasileiro, depois de disparar, entre 2002 e 2004, e ficar muito maior do que a média de outros países, aquele desvio foi trazido para baixo até tornar-se, após 2008, menor que o da média tanto das nações desenvolvidas como das emergentes. "A experiência brasileira representou o maior teste de estresse de um sistema de metas de inflação já registrado", disse Armínio Fraga, sócio-fundador da Gávea Investimentos e ex-presidente do BC, responsável pela introdução do regime de metas no Brasil. Fraga fez a conferência de encerramento do primeiro dia do encontro. O economista americano Michael Woodford, entretanto, fez um alerta contra o excesso de "complacência" em relação aos sistemas de meta de inflação. Principal estrela acadêmica do seminário na quinta-feira, o professor da Universidade Columbia lembrou que o regime de metas "não isolou completamente o Brasil da crise". Mas foi, na verdade, o caso dos EUA - que não têm um regime explícito de metas - que suscitou críticas e sugestões sobre a atuação dos bancos centrais no futuro. O diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, observou que há analistas que veem na manutenção das taxas de juros americanas em nível muito baixo, por prolongado período, a causa principal da bolha financeira que viria a estourar no segundo semestre de 2008. Esse longo período de política monetária frouxa está ligado ao fato de que a inflação americana medida pelos índices de preços de produtos e serviços estava muito baixa. Havia, por outro lado, o que alguns chamam de "inflação de ativos", com a disparada do preços de imóveis e ações. Porém, seguindo a tradição dos BCs de só agir em razão da inflação de produtos e serviços, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) manteve os juros baixos. Sérgio Werlang, diretor executivo do Itaú-Unibanco, mencionou a possibilidade de se criar um índice separado de preços de ativos, com o qual o BC poderia secundariamente se preocupar, mantendo o foco no índice de inflação tradicional. Já Fraga e Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Santander, manifestaram resistência à ideia, enfatizando que o melhor caminho para lidar com bolhas de ativos são as medidas prudenciais em relação ao crescimento do crédito (sempre por trás das bolhas): regras contracíclicas de aumento de capital ou de provisões em momentos de euforia econômica. FRASES Michael Woodford Economista americano "O regime de metas (de inflação) não isolou completamente o Brasil da crise" Mario Mesquita Diretor do Banco Central "Há analistas que veem na manutenção das taxas de juros americanas em nível muito baixo, a causa principal da bolha financeira que viria a estourar no segundo semestre de 2008"

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