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'Modelo Brasil' ignorou o resto do mundo

Insistência na ampliação de gastos do governo trouxe efeitos negativos para a economia que ainda levarão anos para serem compensados

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Por Fernando Scheller
Atualização:

A longa aposta do Brasil na intervenção estatal para fomentar o crescimento foi a opção oposta à adotada por nações desenvolvidas. Os EUA, por exemplo, injetaram bilhões em bancos e empresas combalidas, incluindo a montadora GM, mas os subsídios foram retirados aos poucos. Para economistas, os números brasileiros mostram que a estratégia local foi equivocada.

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A retração da economia em 2015 e 2016 foi tão forte que o efeito no Produto Interno Bruto (PIB) per capita só deve ser compensado em 2023, nas contas do economista Simão Silber, da FEA/USP. 

O economista Samuel Pessôa, do Ibre/FGV, diz que, após a euforia da alta de 7,5% do PIB em 2010, que pôs o Brasil como exemplo de prosperidade na capa da revista The Economist, a desaceleração que começou em 2011 foi vista como um mal a ser combatido com todas as armas: “Reproduziu-se, então, o diagnóstico (para os problemas da economia), apesar de o remédio já ter sido exagerado mesmo em 2009”, diz Pessôa. Para definir a insistência no receituário, Silber recorre a um conceito atribuído a Albert Einstein: “Loucura é continuar fazendo a mesma coisa e esperar resultados diferentes.”

No governo Dilma, o encadeamento das decisões do governo se encaixa em um padrão que o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, classifica de moto perpetuo. Silber diz que essa narrativa começa a ficar mais clara a partir de agosto de 2011, quando há uma “limpeza” no Banco Central que abre caminho para uma série de intervenções do governo. 

A partir daí, foram várias as medidas contraditórias, aponta Pessôa: queda de juros em cenário de inflação em alta, congelamento de preços do petróleo e corte nas tarifas de energia elétrica por canetada, ampliação das desonerações a setores específicos e do papel do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) no financiamento a grandes empresas. “Até se insistiu na criação da indústria naval, que é algo caro e já tinha dado errado nos anos 1950, com JK, e nos anos 1970, com (Ernesto) Geisel”, diz o professor do Ibre/FGV.

À medida que o governo ampliou gastos, a situação fiscal se deteriorava e a economia reagiu muito pouco. Um “motim” entre os funcionários do Tesouro Nacional, noticiado pelo Estado à época, denunciou a prática das pedaladas fiscais – que consistia no adiamento de pagamentos que o governo deveria fazer a bancos e também a órgãos como o INSS. 

Com a eleição marcada para o ano seguinte, no entanto, não havia espaço para mudança de rota naquele momento, aponta Sérgio Lazzarini, professor do Insper: “Então, nessa situação, a solução foi pedalar, jogar as contas dos subsídios explícitos do BNDES para frente e maquiar resultados para dizer que estava tudo bem.”

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Futuro. Apesar dos efeitos catastróficos para a economia – que se refletiram no maior período de retração econômica do País em 120 anos –, os economistas concordam que o atual debate eleitoral não reflete uma consolidação em direção a medidas mais austeras na economia, com corte de gastos e reformas. 

A explicação para essa resistência pode ser histórica, na opinião de Mesquita, do Itaú Unibanco, pois o brasileiro está acostumado a ver o governo como provedor. “A ideologia (da intervenção) não é nova. Começa na década de 1930 do século passado, com (Getúlio) Vargas, continua com Juscelino Kubitschek e com os militares”, disse o economista. “A ideia de crescimento liderado pelo Estado têm seus adeptos à esquerda e à direita do espectro político.”

Silber, da USP, alerta, no entanto, que a mudança na trajetória dos gastos públicos é urgente. O direcionamento que foi apenas esboçado pela administração Michel Temer, segundo ele, precisa ser implementado – e rapidamente – pelo próximo governo. “Estamos na beira do precipício. Dependendo do governo que vier por aí, corremos o risco de perder o controle sobre a economia.”

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