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Morte de Joseph Safra marca fim de uma era no círculo das altas finanças

Com fortuna de US$ 23,2 bilhões, ele foi também o último representante de sua geração em família de banqueiros

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Por Redação
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A morte do banqueiro Joseph Safra nesta quinta-feira, 10, aos 82 anos, marca o fim de uma era no círculo das altas finanças. Joseph, mais conhecido no Brasil como José, era o último sobrevivente de uma estirpe de grandes banqueiros, que prosperou nos últimos 60 anos no País, construindo seus bancos à sua imagem e semelhança.

Joseph era também o último banqueiro de sua geração na família, cuja história no ramo bancário se iniciou em Alepo, na Síria, onde havia uma próspera comunidade judaica à qual os Safras pertenciam, com o financiamento de caravanas de camelos e a negociação com ouro, durante o Império Otomano.

O banqueiro Joseph Safra. Foto: Renata Jubran/Estadão - 25/11/2010

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Seu irmão Edmond, que controlava o Republic National Bank of New York, vendido ao HSBC por US$ 10,3 bilhões em maio de 1999, foi morto meses depois, no apartamento em que vivia com a mulher Lilly, em Mônaco, após um incêndio criminoso provocado por um de seus empregados. Moise, o outro banqueiro da família, que dividia com Joseph a gestão do Safra no Brasil e acabou decidindo seguir voo solo em 2006, vendendo a ele a sua participação, morreu em 2014.

Dono de uma fortuna calculada em US$ 23,2 bilhões, de acordo com a revista Forbes, Joseph era o homem mais rico do Brasil e o 63.º do mundo. Era considerado o banqueiro mais rico em atividade no planeta. Hoje, o conglomerado da família inclui, além de bancos na Suíça, no Brasil e em Nova York, mais de 200 imóveis ao redor do mundo, entre eles o famoso Gherkin Building, em Londres.

Ele tornou-se conhecido também por suas ações filantrópicas. Foi um dos maiores doadores dos hospitais Albert Einstein e Sírio Libanês, em São Paulo. À Pinacoteca do Estado, ele doou esculturas de Rodin e ao Museu de Israel, em Jerusalém, o manuscrito original da Teoria da Relatividade de Albert Einstein. Durante a pandemia da covid-19, o banco doou cerca de R$ 40 milhões para hospitais e Santas Casas.

Vítima do Mal de Parkinson, mesma doença que acometeu Edmond e Moise, Joseph morreu de causas naturais, segundo o comunicado divulgado pelo banco e pela família. Embora tivesse mudado para Genebra com a mulher Vicky em 2014, para acompanhar de perto os negócios do banco suíço Sarasin, que comprara dois anos antes, ele estava em São Paulo ao falecer e foi sepultado no Cemitério Israelita do Butantã, na zona oeste da cidade.

Há tempos ele já não viajava e havia voltado a morar em sua mansão no bairro do Morumbi, na zona sul. Seguidor das tradições do judaísmo, Joseph fez questão de comparecer à sinagoga nas comemorações de Pessach, a Páscoa judaica, em abril, mas já debilitado pela doença teve de ir em uma cadeira de rodas.

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Em solenidade no Dia Internacional em Memória das vítimas do Holocausto, Safra ao lado da ex-presidente Dilma . Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Desde a mudança para a Suíça, quando passou a gestão para os filhos, ele já não participava do dia a dia dos negócios, embora nunca tivesse se afastado totalmente. Ainda procurava conversar com executivos do banco, como nos velhos tempos, quando ocupava uma ampla sala, no 22.º andar de um edifício de 24 andares localizado na esquina da Avenida Paulista com a Rua Augusta, na região central de São Paulo. Em sua sala, destacava-se um retrato de seu pai, Jacob, falecido no início da década de 1960, poucos anos após a fundação do banco, em 1955.

No comando do Safra, Joseph transformou o banco numa máquina de gerar lucros. Seu brilhantismo é reconhecido pela concorrência e até por quem saiu do Safra, hoje o sexto maior banco do País por ativos totais. Faz parte do folclore do mercado financeiro uma frase atribuída a ele, nos tempos em que ainda tinha o irmão como sócio: “Eu gosto de negócio que é bom para os dois: para mim e para o Moise”. O velho slogan do banco Safra – “Tradição secular de segurança” – simboliza de forma emblemática o perfil conservador que ele cultivava e que ainda hoje atrai uma clientela abonada para a área de private banking, em especial integrantes da comunidade judaica.

Safra com a mulher Vicky, em jantar beneficente. Foto: Paulo Giandalia/Estadão

Quando estava na ativa, não se desligava do trabalho mesmo quando estava em férias nos Alpes suíços com a família. Embora não ocupasse cargo executivo, era Joseph quem decidia praticamente tudo. Muitas vezes, enquanto sua família ia esquiar, ele ficava no telefone, conversando com os executivos do banco no Brasil e no exterior sobre os negócios. Embora fosse considerado um chefe duro com os subordinados, costumava ser generoso no reconhecimento de seus principais colaboradores, distribuindo bônus milionários no fim do ano.

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Ao contrário de Edmond, Joseph, com seu irmão Moise, diversificou bastante os negócios. Fez investimentos significativos em empresas de telefonia celular, máquinas pesadas, celulose e até em agropecuária, muitas das quais vendidas anos depois. Em 2012, junto com o empresário brasileiro José Luís Cutrale, Joseph ganhou a disputa por uma das maiores produtoras de bananas do mundo, a americana Chiquita Brands International, comprada por US$ 1,3 bilhão.

No fim da década passada, quando estava perto de completar 70 anos, Joseph havia começado a implementar seu plano de sucessão, para entregar o comando dos negócios aos filhos Jacob, Alberto e DavidEsther, a única filha, chegou a trabalhar no banco durante um ano, mas acabou saindo e hoje é dona da escola judaica Beit Yaacov, em São Paulo. A troca de bastão, porém, acabou adiada, por causa da crise financeira global, iniciada em 2008.

Joseph Safra, direita, com o irmão Moise. Foto: Epitácio Pessoal/Estadão

Agora, com a morte de Joseph, caberá à nova geração dar continuidade ao legado do pai no mundo das finanças. Jacob, o primogênito, cuida do Safra National Bank, em Nova York. No Brasil, David e Alberto dividiram a gestão do Safra por seis anos até o fim de 2019, quando Alberto deixou a instituição e abriu a gestora de recursos ASA Investments

Astuto como era, Joseph, provavelmente, já deixou tudo arranjado para o futuro, delineando qual quinhão caberá a cada um. Nas próximas semanas e meses, os desdobramentos de sua morte nos negócios da família deverão ficar mais claros. Mas, por mais capazes que sejam os seus filhos, não será uma tarefa fácil substituir um banqueiro como o pai no comando. Eles têm, porém, o privilégio de terem cursado uma das melhores escolas do ramo bancário do mundo, a de Joseph Safra. 

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