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Muito barulho por pouco

Por Josef Barat
Atualização:

À semelhança da peça de Shakespeare, a discussão da Medida Provisória (MP) 595-A, que visa a disciplinar a exploração direta e indireta de portos e instalações portuárias, teve muita conversa e muitas idas e vindas. Parlamentares esgrimiram com palavras (nem sempre elegantes) para, ao fim e ao cabo, aprová-la com muito barulho por pouco.Na verdade, houve alguns avanços na concepção do novo marco regulador. Primeiro, a possibilidade de os terminais privados situados fora dos chamados portos públicos operarem cargas de terceiros. Outra inovação: liberar os portos privados de contratar trabalhadores sem a vinculação aos Órgãos Gestores de Mão de Obra dos portos públicos, que monopolizam a contratação. Tais medidas removem obstáculos que inibiam investidores e operadores portuários privados de implantar novos terminais e ampliar escalas de operações. O aumento da oferta de serviços portuários e um ambiente de maior competição reduzem significativamente os custos das operações. Isso significa, por fim, maior competitividade das exportações brasileiras e redução dos altos custos do abastecimento do mercado interno. Mas, ao remover obstáculos aos portos privados, como lidar com os portos públicos?Como se sabe, o processo de concessões, a partir das reformulações introduzidas pela Lei n.º 8.630/93, optou por fragmentar as concessões nos sítios portuários, contemplando as operações por tipos de cargas. Ou seja, não foram feitas concessões para o sítio portuário como um todo. Com prazos diferentes de concessão, operações especializadas e frágeis gestões do porto em seu conjunto - herança do jogo político partidário da gestão estatal -, o sítio portuário passou a ser palco de recorrentes conflitos de interesse. Conflitos que ficaram patentes nas discussões no Congresso, onde grupos de parlamentares se entrincheiraram em frentes de defesa de interesses fragmentados nos sítios portuários.Nesses embates, perdeu-se a chance de encaminhar soluções mais abrangentes e efetivas para os portos públicos, que sofrem de deficiências históricas e crônicas em termos de layout das instalações e interfaces com ferrovias e rodovias. São deficiências que comprometem o funcionamento dos portos e encarecem as operações.Alguns aspectos exaustivamente mostrados pela mídia se sobressaem, como o longo tempo de espera de caminhões e trens para entrar no sítio portuário e a crônica incompatibilidade entre as infraestruturas de transporte terrestre e as de acesso ao porto. São recorrentes os congestionamentos de caminhões nas rodovias em períodos de escoamento de safras, bem como a utilização de vagões ferroviários para estocagem nas longas esperas.Outro fator restritivo da produtividade dos portos é o longo tempo de rotatividade de caminhões e vagões ferroviários nas operações de transferência de cargas e contêineres. Restritiva também é a carência de áreas de retroporto que possam regular os fluxos terrestres, reduzindo os congestionamentos no sítio portuário. Por fim, cabe lembrar as frequentes deficiências nos canais de acesso por falta de dragagem, o que limita consideravelmente o acesso de navios e a competitividade dos portos.Há ainda um longo caminho a percorrer para os portos do País ingressarem no século 21. O mais importante é introduzir modelos de gestão mais coordenados e reduzir a fragmentação das concessões portuárias. Grandes complexos portuários não são mais meros polos de carga e descarga de navios, mas elos cruciais de complexas cadeias de suprimento em escala mundial. A competitividade de um porto depende cada vez mais de atores exógenos à gestão portuária e ganharam importância novos fatores de gestão de custos em ambiente competitivo. Os portos tornaram-se empreendimentos comerciais, com gestão altamente profissionalizada e forte influência no desenvolvimento regional. Melhor afinar o barulho com esta realidade.

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