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''Muitos têm medo de nos receber''

Pesquisador do IBGE ouve palavrões e desaforos

Por Daniele Carvalho e RIO
Atualização:

Há cinco anos, o agente pesquisador José Rodrigues Augusto Gomes segue a mesma rotina de trabalho. Munido de palmtop e de um colete com a inscrição IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ele percorre cerca de 20 domicílios por dia coletando informações para a Pesquisa Mensal de Emprego (PME). Gomes, que atua na zona sul do Rio, diz ainda não ter observado os reflexos da crise em suas entrevistas. "Minha área abrange pessoas de classe média e média alta. Estas áreas devem ser as últimas a sentir o impacto da crise no emprego", analisa ele. Gomes é um dos 500 profissionais que trabalham nas seis regiões metropolitanas onde o levantamento é feito e que ajudam a traçar o retrato do emprego no País. Não é uma missão simples abordar os entrevistados desconfiados, o primeiro obstáculo que encontra. "Com o aumento da violência, muita gente tem medo de nos receber. Outros, lamentavelmente, disparam grosserias e palavrões. Mas não podemos desistir", narra ele. A dificuldade não deveria existir, uma vez que o IBGE envia uma semana antes de sua visita uma carta ao domicílio a ser pesquisado. "Essa carta traz um panfleto explicando a PME e a importância de respondê-la. Não chegamos de surpresa", frisa ele. A experiência adquirida nesses cinco anos fez Gomes chegar a uma conclusão: é mais fácil fazer a pesquisa nas áreas de menor poder aquisitivo da região metropolitana do Rio. "Na zona norte e nas favelas, observo que as pessoas fazem questão de participar. Servem até bolo e refrigerante para o pesquisador", relata Gomes. "Já na zona sul, área em que atuo, é diferente. Muita gente se nega a nos responder e a arrogância é grande. Mas a pior área de trabalho é a Barra da Tijuca. Já ouvi muito desaforo", reclama o pesquisador. Os agentes pesquisadores do IBGE têm horário livre de trabalho. Gomes diz que prefere iniciar sua ronda por volta das 15h e segue até as 21h. "Assim fica mais fácil achar o pessoal em casa. Sábado, quando não é dia de praia, é também uma boa ocasião para fazer a pesquisa", observa. Ao ser recebido em uma residência, entabula perguntas que, segundo ele, não duram mais do que sete minutos. "É rápido. Em média, são feitas 20 perguntas", detalha. O universo de perguntas feitas pelo IBGE engloba escolaridade, formação profissional, horas trabalhadas, remuneração, entre outras. Caso o entrevistado esteja desempregado, as indagações abordam sobre o tempo em que se encontra nessa situação, prazo em que está a procura uma nova ocupação e quando ocorreu o último contato feito com um possível empregador. Cada domicílio é pesquisado por quatro meses consecutivos. Cumprido esse prazo, a residência fica oito meses sem receber a visita do IBGE e depois volta a ser procurada por mais quatro meses consecutivos. Depois desse rito, a casa é substituída por outra. A cada mês, há renovação de um quarto dos domicílios consultados pela PME. MULTA O que muita gente ainda desconhece é a obrigatoriedade de receber os agentes do IBGE. "Quando um domicílio se nega a nos atender, o IBGE envia comunicado alertando que o decreto 13.177, de novembro de 1973, prevê pagamento de multa de até 20 salários mínimos para quem se recusa a nos atender", informa o pesquisador. Apesar da rotina puxada e nem sempre amistosa, José Gomes, que já atuou em outras áreas no IBGE, afirma sem titubear: "Gosto muito do meu trabalho."

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