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‘Não podemos mais tributar salários’, afirma Marcos Cintra

Segundo o secretário da Receita Federal, prioridade do governo com as mudanças é estimular a geração de empregos

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Por Adriana Fernandes e Fabio Serapião
Atualização:

BRASÍLIA - O secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, diz que a prioridade do governo é fazer uma desoneração total e permanente dos tributos que as empresas pagam sobre a folha de pagamento para estimular a geração de empregos. Para compensar a perda na arrecadação do governo, e uma das alternativas é criar um novo imposto sobre qualquer tipo de pagamento.

Marcos Cintra disse acreditar que o imposto único federal pode começar a ser cobrado já em 2020. Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADAO

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Como será a mudança nos tributos federais?

Vamos propor essa reforma dos tributos federais. A prioridade do governo é a desoneração da folha de salários (as empresas, em geral, recolhem ao INSS um porcentual de 20% sobre a folha de pagamentos). É um tributo que gera desemprego e é o grande financiador da Previdência. Só que a base dele, que é a contribuição patronal, está sofrendo o impacto do mundo moderno. Está se dissolvendo. A relação de trabalho formal, carteira assinada, está ameaçada. Hoje, as pessoas têm autoemprego, têm trabalho informal e formal ao mesmo tempo. É o Uber da vida, é o marido de aluguel... Precisamos substituir a base atual por uma mais parruda que dê mais estabilidade e permita geração de emprego. Não podemos mais tributar salários. A única tributação sobre salário se dará sobre o Imposto de Renda.

De que forma?

A ideia é eliminar a contribuição patronal ao INSS e substituir essa base de financiamento por outra. Temos duas alternativas para gerar a mesma arrecadação que a folha de salários gera hoje. Ou colocamos uma alíquota adicional no Imposto Único Federal ou podemos criar um imposto sobre pagamentos.

Como funcionaria esse imposto sobre meios de pagamentos?

Não é a CPMF. É diferente. É muito mais amplo. Ele abrange toda e qualquer transação econômica, incluindo as que ocorrem fora do sistema bancário. A CPMF pegava só as transações feitas pelo sistema bancário. Por exemplo, escambo não era atingido pela CPMF. Uso de papel-moeda também não. Como vamos pegar? A legislação vai dizer o seguinte: é um imposto sobre todo e qualquer pagamento, seja pelos bancos, cartão de crédito, as operações cambias, pagamento em dinheiro. É um tributo do futuro.

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De que forma se dará essa tributação?

Por exemplo, eu vendo um carro. Eu recebo R$ 50 mil em dinheiro. Na hora que for registrar o carro no nome do comprador, vão exigir o comprovante de pagamento referente a esse valor. Se eu troco um apartamento por uma fazenda, na hora que eu for fazer a escritura, tem de recolher.

A contribuição ao INSS sobre faturamento de alguns setores também acaba?

Tudo que financia a Previdência, incluindo o Funrural e o sistema S, e onera a folha de salários será eliminado.

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Qual das duas opções de financiamento da Previdência o sr. prefere?

A do imposto sobre pagamentos. Quanto maior a alíquota do imposto, maior o estímulo à sonegação. A elisão fiscal, sonegação, evasão variam na proporção direta da alíquota. Eu prefiro um imposto de pagamentos, que vai ter uma alíquota baixa. Ainda estamos fazendo estimativas. Será em torno de 0,8% a 1,2%. Dessa forma, não precisaria subir a alíquota do Imposto Único Federal. Quando o IVA nacional (que vai unificar os impostos federais com o ICMS, estadual, e o ISS, municipal) for aprovado, a acoplagem será imediata.

Quando as mudanças poderão entrar em vigor?

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Eu acredito que no primeiro semestre teremos condições de fechar a proposta do IVA nacional. Como ele é mais complexo e vai envolver discussão com prefeito e governador, eu acho que dificilmente será aprovado nos primeiros seis meses, um ano, olhando o exemplo de 30 anos que nós temos. A minha expectativa é que na segunda metade deste governo já possamos fazer o acoplamento com o Imposto Único Federal.

A criação do imposto federal e a desoneração da folha já podem começar em 2020?

Vai depender da tramitação no Congresso. A tramitação vai ser muito mais tranquila e menos polêmica. Até o final deste ano eu acho que teremos aprovado para começar em 2020. Vai precisar de transição. Em vez de acabar completamente com a contribuição, podemos reduzir pela metade e, depois de três meses, calibra a alíquota e retira a outra metade.

O que acontecerá com o Simples e outros regimes especiais de tributação?

Teremos quatro regimes especiais. Vamos ter de criar um regime diferenciado para preservar a Zona Franca de Manaus. A ideia é não só garantir algum estímulo tributário como também acoplar uma política de desenvolvimento regional. A Zona Franca tem um parque e uma população instalada que não podemos desconsiderar. O Simples vai continuar existindo. O terceiro regime especial será o de setor financeiro, bancos, corretoras, distribuidoras. Em nenhum lugar do mundo os bancos são tributados pelo IVA da maneira convencional. O quarto regime especial é o da construção civil.

Mas vai tributar remédio e comida igual?

Vai. Só que a Receita tem a nota fiscal eletrônica e vamos lançar a nota de serviços. Temos todo o perfil de consumo de todas as famílias que estejam no limiar de receber isenção fiscal. A pessoa vai comprar a comida com uma única alíquota. No final do mês, ela recolhe as notas e, uma vez cadastrado, soma-se o volume das notas fiscais e ela recebe o dinheiro.

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Isso vai funcionar no Brasil?

Funciona. Ela vai ter de, na hora da compra, pedir a nota fiscal para estar registrado que ela comprou.

As desonerações, então, vão acabar?

Todas. Esse é o projeto. O PIS/Cofins tem centenas de casos especiais que foram aprovados em função de lobbies, o que criou uma legislação que ninguém entende. Existem privilégios tributários que beneficiam apenas uma empresa.

O setor de serviços vai topar esse IVA?

Eles vão topar por causa da desoneração da folha. Por isso, vou apresentar os dois juntos.