'Não tem como ter recuperação sem a vacinação', diz Mendonça de Barros

Economista afirma que segunda onda da covid ‘atropelou’ início de reativação da economia, no fim do ano passado

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Por Luciana Dyniewicz
3 min de leitura

O aumento de casos de covid-19 e a perspectiva de que a oferta de doses de vacina será intermitente são sinais de que a economia não se fortalecerá neste primeiro semestre. Na avaliação do economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da consultoria MB Associados, a economia está mais debilitada do que se esperava e, diante desse cenário, a falta de imunizantes é ainda mais preocupante. “Não tem como ter recuperação sustentada se não for precedida de vacinação em massa que permita reduzir o distanciamento social para sempre”, diz. 

A MB projeta um crescimento de 2,6% para o PIB – “um resultado muito fraco depois do que passamos no ano passado”, diz Mendonça de Barros. Por enquanto, porém, nem esse desempenho pífio está garantido. “Olha a situação limite de Manaus. Mesmo não querendo, foi preciso um lockdown. São Paulo também voltou com restrições maiores.” 

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José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados Foto: Daniel Teixeira/ Estadão

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Como avalia o ritmo de vacinação no Brasil e seus efeitos na economia?

Essa segunda rodada do vírus no Brasil e em outros lugares do mundo é que levou todos os ‘stakeholders’ a chegarem à conclusão de que não tem como ter recuperação sustentada se não for precedida por uma vacinação em massa que permita reduzir o distanciamento social para sempre. Caso contrário, você começa a reduzir o distanciamento, tem recaída e, aí, precisa fechar (os estabelecimentos comerciais) de novo. Então, a primeira coisa é que tem de ter vacina. A segunda é que estamos, lamentavelmente, atrasados na aquisição das vacinas e diante de um risco de a oferta de doses ser intermitente. Se você pegar os EUA, a Europa ou Israel, há a perspectiva de que, até julho, o mínimo crítico (da população) de risco já esteja vacinada. A expectativa é de queda forte no número de internações e de óbitos e de que, ao longo do verão, os serviços possam voltar a crescer. No Brasil, nós estamos atrasados nas compras e nas entregas de vacinas. No ano passado, os gastos (públicos) ajudaram a dar início à recuperação da economia. Essa recuperação foi atropelada pela segunda rodada do vírus. Isso vai fazer com que, no primeiro trimestre, a economia esteja muito mais devagar, porque temos novas medidas de distanciamento. Até a indústria, que estava melhor, deve cair nesse primeiro trimestre. 

Com o ritmo atual de vacinação, é possível ter pelo menos um segundo semestre melhor?

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Mesmo que a vacina esteja atrasada, o segundo semestre deve ser melhor. Ainda assim, projetamos para o ano 2,6% (de crescimento no PIB). É um resultado muito fraco depois do que passamos no ano passado. O primeiro trimestre enfraqueceu muito. É quase garantido que ainda vai haver uma discussão para o Orçamento e, saindo alguma coisa de auxilio emergencial, será em março. Isso significa que a demanda vai ser mais fraca até lá. Outra coisa que chama a atenção é o problema da oferta. Viramos o ano com mais de 200 mil carros encomendados que não foram entregues por causa de falta de algum componente. De motocicletas, foram 150 mil. E esse caso é ainda pior, porque as fábricas estão em Manaus e foram fechadas. Está faltando caixa de papelão e embalagens de vidro. A oferta não está conseguindo voltar com a velocidade que poderia. Isso joga a produção para baixo. Além disso, se olhar a inflação, além do custo de alimentação e energia, as matérias-primas industriais estão pressionando os preços. O primeiro trimestre será bem problemático. O segundo, por melhor que seja, será fraco. As projeções para o ano não apontam nada de especial. O mercado em geral estava mais otimista com 2021 e estamos vendo muita gente revisando as estimativas para baixo. 

No cenário de alta de 2,6% do PIB, a MB já considerava que a vacinação demoraria?

A vacinação especificamente não, mas, em dezembro, tínhamos certeza do recrudescimento da covid. A proporção da limitação na oferta da vacina só ficou clara no começo do ano. Mas a percepção de que, sem vacinação, não tem jeito também já tínhamos em 2020.

Dado que vocês não imaginavam a demora para vacinar a população, há um viés negativo para a estimativa de PIB de 2,6%?

Claro. Olha a situação limite de Manaus. Mesmo não querendo, foi preciso fazer um lockdown. São Paulo também voltou com restrições maiores. Quem sofre mais com isso é o serviço, a viagem, o lazer, o turismo. Não haverá recuperação em V. Em maio e junho de 2020, na comparação com abril, quando estava tudo parado, as taxas de crescimento em diferentes segmentos da economia eram enormes e simulavam uma letra V. Mas isso não vai se sustentar.

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