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No mundo, só 10% dos domésticos têm direitos trabalhistas

Levantamento da OIT revela violações de direitos e vê esperanças após mudança legislativa no Brasil

Por JAMIL CHADE , CORRESPONDENTE e GENEBRA
Atualização:

Um levantamento recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela o nível de violações contra empregados domésticos no mundo inteiro e mostra que outros países podem seguir o mesmo caminho que o Brasil, que acabou de aprovar leis que modificam as condições de trabalho desse grupo. Uma contagem superficial da OIT estima que há 56 milhões de trabalhadores domésticos no mundo. O número pode ser bem maior já que o cálculo não inclui, por exemplo, 7,5 milhões de crianças com menos de 15 anos que também atuariam como domésticas. Ainda assim, os dados são reveladores. Apenas 10% dos empregados domésticos têm os mesmos direitos dos demais trabalhadores. Mais da metade não tem limitação de jornada e 45% deles não têm direito a folga semanal ou férias. Mais de um terço não tem direito a licença-maternidade e apenas metade tem garantias na lei de seus países de que devem receber pelo menos um salário mínimo. Por fim, um a cada três trabalhadores desse grupo está excluído por completo do alcance da legislação laboral: 15,7 milhões de pessoas. Apesar da situação precária, o número de domésticas explodiu no mundo nos últimos 20 anos. Mais 19 milhões passaram a atuar nesse tipo de trabalho, um aumento de 58%. Na América Latina, a alta foi de 9 milhões. No Brasil, os dados apontam que o número em 1995 era de 5,1 milhões, ante 7,2 milhões em 2009.Outro fenômeno é o de abusos contra estrangeiras em países ricos. A OIT admite que esse é um número desconhecido, já que milhões são clandestinas e nem sequer existem como cidadãs. "A situação precária de imigrantes e sua falta de conhecimento sobre a língua e leis locais os tornam vulneráveis a práticas abusivas, como violência física e sexual, abuso psicológico, o não pagamento de salários e outros problemas", alerta a OIT.Os números das regiões com mais empregados e piores condições de trabalho coincidem com o mapa da desigualdade global. Na Ásia são 21,4 milhões, ante 19,6 milhões na América Latina. Todos os países ricos juntos têm metade dos trabalhadores domésticos que existem no Brasil.A lista dos países com maior número de domésticas também coincide com a lista dos países com mais disparidades sociais. O Brasil lidera, com 7,2 milhões de empregadas. Na Europa, região com população superior à brasileira, o número é bem inferior, justamente pela menor desigualdade social e ainda pela existência de serviços públicos de creche.Desilgualdade. Se a nova lei no Brasil foi comemorada pela OIT, a entidade não esconde que a situação no País também espelha as disparidades sociais desse grupo de trabalhadoras. Uma a cada seis mulheres brasileiras trabalha como doméstica. Uma a cada cinco mulheres negras trabalhando no Brasil são domésticas. Em 2011, as domésticas no Brasil tinham uma renda de apenas 41% dos salários médios. 46% delas ganhavam apenas um salário mínimo, ainda que entre 2003 e 2011 tivessem recebido um aumento médio de 47% em seus salários.Enquanto as condições sociais não avançam, a OIT diz que é obrigação de governos garantir a proteção da classe. Com esse objetivo, aprovou em 2011 uma nova convenção estabelecendo direitos mínimos para trabalhadores domésticos. Em essência, o tratado exige que eles tenham os mesmos direitos de todos os demais.Até hoje, apenas quatro países ratificaram a convenção: Uruguai, Filipinas, Itália e Ilhas Maurício. Mas a aprovação da lei no Brasil é vista na OIT como um fator que pode abrir a porta para outras mudanças pelo mundo. "Com a aprovação da lei, o Brasil culmina seu processo de reconhecimento da dignidade e valor das domésticas, que são em sua maioria mulheres negras", diz Manuela Tomei, diretora do Departamento de Condições do Trabalho na OIT em Genebra. Segundo a OIT, vários países já começam a acompanhar os mesmos passos do Brasil, como Argentina e Índia. Outros sete países adotaram novas leis.

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