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Nova regra de aposentadoria terá efeito só no curto prazo, dizem especialistas

Apesar de fórmula que exige soma de idade e tempo de contribuição de 85 para mulheres e 95 para homens incentivar trabalhador a esperar mais para requerer benefício, medida é considerada branda para resolver déficit previdenciário no longo prazo

Por João Villaverde e BRASÍLIA
Atualização:
Regra é ‘conquista’ para trabalhador, diz Rossetto Foto: DIDA SAMPAIO | ESTADAO CONTEUDO

Desde ontem os brasileiros têm uma nova regra para ter direito a aposentadoria integral, batizada de fórmula 85/95, que leva em conta a soma do tempo de contribuição ao INSS e a idade. Essa fórmula vai aumentar ao longo dos próximos anos. Quem não atingir a soma exigida na nova lei, sancionada pela presidente Dilma Rousseff, terá a aposentadoria calculada com base no chamado Fator Previdenciário, uma fórmula complexa que vigora desde 1999 e reduz o valor do benefício para as mulheres que não têm 60 anos e para homens com menos de 65 anos.

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A mudança nas regras tem o objetivo de melhorar, segundo o governo, as contas da Previdência. O salto de 40% no rombo da Previdência em 2016, que chegará a R$ 124,9 bilhões, segundo o governo, seria maior caso a nova lei não entrasse em vigor.

Segundo o especialista em assuntos previdenciários Leonardo Rolim, consultor legislativo da Câmara, a nova regra terá efeito positivo no curto prazo, por fazer homens e mulheres aguardarem alguns anos a mais para atingir os novos requisitos e, assim, escapar do fator previdenciário e ter direito ao benefício integral. “Mas, no longo prazo, essa nova lei é muito ruim para as contas públicas.”

Segundo Rolim, o governo deveria ter fixado o 85/95 como regra de acesso, e não de cálculo, e progressivamente igualar a soma para homens e mulheres até 105 pontos em 2050, o que reduziria o déficit da Previdência fortemente, em 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano.

A regra 85/95 valerá até 30 de dezembro de 2018. Ou seja, a soma da idade com o tempo de contribuição tem que ter como resultado 85 para mulheres e 95, para homens. A lei fixa a progressividade da pontuação 85/95, subindo em um ponto a cada dois anos, a partir de 31 de dezembro de 2018, atingindo o máximo de 90/100 em 31 de dezembro de 2026.

Segundo números da Previdência Social obtidos pelo Estado, o adiamento do requerimento da aposentadoria pode economizar R$ 14,7 bilhões ao governo entre o fim de 2015 e o fim de 2018, e outros R$ 13,3 bilhões de 2019 a 2022. O ministro do Trabalho e da Previdência Social, Miguel Rossetto, reconheceu que “a médio e longo prazo é possível aumento de despesa”, mas que a progressividade até 90/100 “reduz o impacto e preserva a sustentabilidade da Previdência”. Em nota, Rossetto disse que nova lei é uma conquista dos trabalhadores.

Para o economista Marcelo Abi-Ramia Caetano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a nova fórmula acaba incentivando as pessoas a se aposentarem mais tarde. “Para as mulheres, especialmente, o incentivo é gigantesco. Quem esperar alguns anos para chegar até a fórmula poderá ganhar a aposentadoria cheia, sem fator previdenciário”, disse.

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Segundo Caetano, a nova regra de aposentadoria pode elevar a idade média de aposentadoria no Brasil. Hoje, mulheres se aposentam aos 52 anos, em média, e homens, aos 54. A partir de 2027, quando a fórmula atingir o teto de 90/100 pontos, mulheres podem se aposentar aos 56 anos, em média, e homens, aos 60.

Os especialistas, Caetano e Rolim, defendem a instituição de uma idade mínima para a aposentadoria no Brasil e a equiparação dessa idade para homens e mulheres. Esse é o sistema que tem sido adotado no mundo desenvolvido. Essa é a posição da equipe econômica do governo, que vai propor esse debate no fórum federal com a participação de centrais sindicais e empresários. “O Brasil tem essa mania de resolver um problema criando outro. Não é deixando a diferença entre mulheres e homens em dez anos para aposentadoria que se resolverá a desigualdade cruel do mercado de trabalho. Essa diferenciação apenas quebra ainda mais a Previdência”, diz Rolim.

‘Desaposentação’. Ao sancionar a lei da aposentadoria, Dilma vetou o artigo inserido pelo Congresso que permitia a “desaposentação” – o mecanismo que permite aos cidadãos que já se aposentaram, mas continuaram no mercado de trabalho, pedirem que esse tempo extra seja somado ao cálculo da aposentadoria.

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Segundo dados da Previdência Social, o impacto imediato da desaposentação nas contas públicas seria de R$ 7,6 bilhões entre novembro deste ano e outubro de 2016 e de R$ 181,9 bilhões em 20 anos, considerando os 300 mil aposentados que estão na ativa hoje.

O veto presidencial, no entanto, ainda será analisado pelos parlamentares e pode ser derrubado. O partido que pressionou para incluir a desaposentação na lei, o PPS, já se pronunciou ontem favorável à derrubada do veto. Mas o governo avalia que, dado o impacto nas contas públicas e o fato de que a discussão está sendo feita também no Supremo Tribunal Federal (STF), os parlamentares devem manter o veto de Dilma.

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