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Novo método 'ajuda' o PIB, mas analistas ainda projetam retração em 2015

A Operação Lava Jato e o ajuste fiscal nas contas públicas tendem a impactar a economia neste ano, dizem economistas

Por Igor Gadelha , Mário Braga , Ricardo Leopoldo e Álvaro Campos
Atualização:

A nova metodologia de cálculo do Produto Interno Bruto (PIB) "ajudou" no desempenho da economia em 2014, mas ainda que a atividade tenha subido 0,1% os analistas falam em retração em 2015. A Operação Lava Jato e o ajuste fiscal nas contas públicas tendem a impactar o PIB, dizem economistas.

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Na Tendências, a previsão de recuo de 1,2% em 2015 deve ser mantida, segundo a sócia da consultoria, Alessandra Ribeiro. "Isto se justifica pelo fato de que no primeiro trimestre deste ano novos fatores devem fazer o PIB recuar ainda mais em 2015, como os desdobramentos da Operação Lava Jato e os ajustes de política econômica, com a perspectiva de maior alta de juro pelo BC que não havia há dois meses", afirmou Alessandra. 

A variação positiva do PIB de 2014 veio em linha com as estimativas do mercado e não devem afetar as projeções, segundo o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal, que projetou que o comportamento da atividade econômica neste ano deve ser similar à observada em 2014. "A dinâmica da economia não vai se alterar muito, mas vamos ver números mais fracos neste ano", avaliou o especialista. A projeção do ABC Brasil para o PIB deste ano é de queda de 1%, sem a atualização do modelo com os números revisados pelo IBGE. 

Para ele, o consumo das famílias e do governo, com variações positivas de 0,9% e 1,3%, respectivamente, em 2014 na comparação com 2013, deve apresentar resultados mais fracos em 2015. Assim, não tende a ser evitado um resultado negativo do PIB deste ano. "Em 2015, vamos ter a Agricultura segurando o resultado do PIB, a Indústria continuando fraca, os Serviços contribuindo menos e desempenhos mais fracos do consumo das famílias e do governo e dos investimentos", estimou. "Neste contexto, a economia em 2015 vai acabar em retração", disse.  O desempenho do PIB em 2014 veio basicamente em linha com o esperado, mas neste ano a economia brasileira não deve escapar da retração, avalia Margarida Gutierrez, professora do Coppead, da UFRJ. Para a professora, em 2015 haverá uma queda do PIB, já que este será um ano de ajuste fiscal e monetário. "A boa notícia é que, uma vez feitos esses ajustes, talvez possamos voltar a crescer no próximo ano", comenta. 

Nova metodologia. O Banco Fator projetava retração de 0,1% no PIB de 2014. Os números do IBGE mostraram desempenho bem mais positivo, mas o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves, diz não ser possível falar em resultado "melhor do que o esperado", em função da mudança na metodologia do IBGE. "A metodologia nova é um avanço em relação a anterior, sob todos os aspectos. É uma adaptação às normas internacionais. Mas por conta dessa mudança seria 'ingênuo' dizer que o PIB veio melhor do que o esperado", afirma.

Segundo o economista, olhando para 2015 as expectativas não são muito animadoras. Os dados já disponíveis para este ano mostram que a receita do setor de serviços continua em desaceleração forte, o que deve se refletir na atividade econômica. "Quando pegamos o ano fechado de 2014, o consumo das famílias andou muito pouco (+0,9%) e deve ficar abaixo disso este ano", comenta. Ele também vê uma retração nos investimentos, o que afeta a renda, o consumo e os gastos públicos. 

Modelo insustentável. O PIB do quarto trimestre do ano passado, que subiu 0,3% em relação ao terceiro, foi puxado basicamente pelo consumo das famílias (+1,1%) e não há sinal de uma necessária retomada nos investimentos (-0,4%), segundo avaliação da consultoria britânica Capital Economics. "Isso parece insustentável, dado o aumento no endividamento dos consumidores e sinais de que o mercado de trabalho está enfraquecendo", diz o texto, assinado pelo economista-chefe para mercados emergentes, Neil Shearing. A empresa previa expansão zero do PIB, na margem.

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A Capital Economics chama atenção para o fato de que a revisão metodológica feita pelo IBGE mostrou que o PIB brasileiro é maior do que o que se pensava. Isso significa que os déficits fiscal e em conta corrente são proporcionalmente menores em relação ao PIB. Segundo a consultoria, o déficit fiscal deve ter caído para 6,2% do PIB (de 6,7% antes), enquanto o rombo nas contas externas provavelmente recuou para 3,9% do PIB (de 4,2%). "Isso não elimina os receios sobre a deterioração das contas brasileiras ou a necessidade de austeridade por parte do governo, mas de fato faz a escala do ajuste necessário parecer menos assustadora". 

Recuperação improvável. A alta de 0,1% do PIB do Brasil em 2014 ante 2013 não surpreendeu o economista-chefe do banco Crédit Agricole, Vladimir Caramaschi. Na avaliação dele, o número positivo foi um "erro muito pequeno" quando se trata de cálculo de PIB em relação à queda de 0,1%, em média, esperada pelo mercado. Por causa disso, o economista prevê que o resultado não deve ter maiores impactos sobre os negócios nesta sexta-feira.

O economista avaliou que o resultado fraco do PIB no ano passado é resultado principalmente de um ambiente político conturbado e do esgotamento dos motores de crescimento que o País tinha até então, principalmente o consumo das famílias, que avançou 0,9% em 2014, ante 2,9% em 2013. De acordo com ele, as retrações de 4,4% na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) e de 1,2% na indústria, que já eram esperadas, refletiram esse cenário. "Acho pouco provável a recuperação dessa conta em 2015", previu Caramaschi. Para ele, não há perspectiva de melhora da economia brasileira, que apresenta um ambiente pouco propício para investimentos, diante da alta dos juros, baixa confiança de consumidores e empresários, crise na Petrobrás e ambiente político deteriorado. O Crédit Agricole projeta queda de 0,8% no PIB em 2015, com viés de baixa.  PIB potencial. Com revisões do PIB pela nova metodologia adotada pelo IBGE, o PIB potencial do Brasil subiu de 1,5% para 2%, comentou Vinicius Botelho, pesquisador do IBRE-FGV. O IBGE fez revisões sobre os resultados do produto interno bruto de 2010 (de 7,5% para 7,6%), de 2011 (de 2,7% para 3,9%), 2012 (de 1,0% para 1,8%) e 2013 (de 2,5% para 2,7%).  "Com um PIB potencial maior, na avaliação atual, num contexto de economia em recessão, sobe a probabilidade de ocorrer a desinflação apontada pelo Banco Central de 2015 para 2016", comentou Botelho. No relatório de inflação de março, o cenário de referência apontado pelo BC mostrou que a projeção era de que o IPCA subirá 7,9% neste ano, mas deve desacelerar para uma alta de 4,9% em 2016.  Na avaliação de Vinicius Botelho, a partir dos dados divulgados pelo IBGE, é possível constatar que o PIB neste ano receberá um impulso mais favorável do nível de atividade apurado em 2014, o que é conhecido por carregamento estatístico ou carry over em inglês. Antes, ele previa que o carry over do ano passado para 2015 seria de 0%, sobretudo porque esperava uma retração do PIB de 0,2% no quarto trimestre ante o anterior. Com a alta de 0,3 do PIB entre outubro e dezembro, na margem, divulgada hoje, a herança estatística deve ter ficado em 0,3%. "Avaliávamos que o PIB deste ano deveria cair perto de 1,5%. Com o carry over favorável, essa retração da economia para 2015 deve ficar entre 1,1 e 1,2%", disse. 

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