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O artificialismo da fusão das concessionárias

Por Ethevaldo Siqueira
Atualização:

Num de seus freqüentes lampejos de voluntarismo, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, anunciou, há dias, o desejo do governo Lula de incentivar a criação de uma grande concessionária nacional de telecomunicações, estimulando a fusão entre a Oi-Telemar e a Brasil Telecom. Para tanto, o governo criou até um grupo de trabalho com a incumbência de estudar e promover essa fusão. Mesmo sem reestatizar as duas teles, Lula e Hélio Costa estão empenhados em reconquistar o poder político no setor, por meio de uma golden share, uma ação especial que dá ao governo o poder de veto nas decisões da futura megaempresa. Recordo-me de uma proposta semelhante, feita por um grupo de profissionais do setor, em 1998, visando à criação de uma operadora nacional privada, inclusive com uma golden share nas mãos do governo. No caso, era a própria Telebrás, que seria transformada em megaoperadora nacional, passando a atuar também no mercado internacional, à semelhança da Telefônica e da Telmex. Não havia, em 1998, entretanto, grupos privados brasileiros com cacife suficiente para investir R$ 20 bilhões na aquisição do controle da Telebrás - sem falar nos R$ 100 bilhões que seriam exigidos pela ampliação da infra-estrutura setorial nos 5 anos subseqüentes à privatização. A idéia de uma grande operadora brasileira volta agora, num cenário totalmente diferente. E é bom frisar que, a rigor, ninguém é contra a criação de uma empresa de capital 100% nacional. O que se critica aqui é o caminho adotado, totalmente viciado e politizado. CONFIANÇA DO INVESTIDOR Em matéria de fusão de empresas, a alavanca mestra deve ser o interesse legítimo das partes e do País. Assim, a fusão da Oi e da Brasil Telecom, se um dia vier a ocorrer, não poderá ser um casamento arranjado, mas sim o resultado de um processo espontâneo, que se apóie na confiança do investidor, na estabilidade das regras, na autonomia e no profissionalismo da agência reguladora, numa legislação moderna, que defenda, acima de tudo, o usuário, com a exigência da prestação de melhores serviços por preços justos e declinantes, num ambiente de competição crescente. A reação inicial dos presidentes e acionistas controladores das duas concessionárias foi de surpresa diante da iniciativa e de espanto, ao saber da criação do grupo de trabalho para estudar o assunto. Na avaliação de Luiz Falco, presidente da Oi-Telemar, a iniciativa do governo ajuda pouco. E, convenhamos, nada apavora mais o investidor do que a idéia de uma golden share, instrumento que dá ao governo o direito de se intrometer e de politizar a gestão da empresa. UM OÁSIS As telecomunicações constituem, talvez, o único setor de infra-estrutura com abundante oferta de serviços dentro de padrões internacionais de qualidade, no Brasil de hoje. Nove anos depois da privatização, o número de acessos telefônicos (fixos e móveis) saltou de 24 milhões para os atuais 147 milhões. E o volume de capital privado investido na expansão da infra-estrutura setorial nesse período foi da ordem de R$ 135 bilhões, sem incluir aí o preço pago pela aquisição do controle do Sistema Telebrás. E um dado bem objetivo que nem Hélio Costa nem Lula mencionam: graças ao sucesso da privatização e de seu modelo de negócios, o Brasil tem hoje mais telefones fixos e celulares do que a soma não apenas da Telefônica e da Telmex, em seus países de origem, mas da Espanha e do México juntos. Compare, agora, leitor, o estado geral das telecomunicações com o caos aéreo, com os apagões de energia, o colapso das estradas, os péssimos serviços de saúde, previdência, educação, segurança e de Justiça do Brasil atual. Mesmo pagando o equivalente a quase 40% do Produto Interno Bruto em tributos, a população não conta com serviços minimamente decentes. Na área de comunicações, a grande urgência seria completar o processo de modernização institucional do setor, elaborando uma lei geral moderna e democrática, criando uma única agência reguladora para cuidar da telefonia, dos correios, da radiodifusão e demais formas de comunicação eletrônica de massa. No curto prazo, caberia ao governo formular políticas públicas que aplicassem, em favor dos segmentos mais carentes da população, os bilhões confiscados anualmente sob a rubrica do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust) e do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), entre outros. O QUE INCOMODA Mesmo assim, o governo Lula e, em especial, seu ministro das Comunicações, Hélio Costa, parecem incomodados com o sucesso das telecomunicações. Por isso, insistem em propostas tão inoportunas e confusas quanto a criação da megaconcessionária brasileira. Na área regulatória, eles continuam esvaziando o poder e cortando o orçamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), com o claro propósito de desmontar as bases institucionais do novo modelo. Nesse cenário, o melhor que o governo Lula deveria fazer seria não atrapalhar o desenvolvimento das telecomunicações.

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