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O Brasil e o efeito dominó

Por Milton Lourenço
Atualização:

O governo norte-americano, para enfrentar a crise que se avizinhava, tomou medidas drásticas que deverão permitir que a economia do país retome o seu ritmo de crescimento. O resultado disso já se refletiu nos números de dezembro de 2007, que apontaram um recuo de 1,1% nas importações de bens pelos norte-americanos e um avanço de 1,5% nas exportações. Pode parecer pouco mas, para uma nação que nas últimas décadas se acostumou a sempre comprar mais, isso representa muito sacrifício. O outro lado da moeda é que a ânsia dos norte-americanos de comprar mais e mais sempre funcionou como um fator de impulsão da economia mundial. Agora, para sair da crise, os EUA estão na obrigação de aumentar suas exportações para fazer frente às despesas acarretadas pelas confusões em que se meteram nos últimos anos. O que isso afeta o Brasil? Pode não afetar muito, se levarmos em conta que, em 2007, o País exportou para os EUA apenas US$ 23,5 bilhões, quantia irrisória, se considerarmos que aquela nação representa 25% das exportações em todo o planeta. Mas não é por aí que se deve enxergar a questão. Nenhuma empresa - e, macroeconomicamente falando, nenhum país - pode comemorar o fato de vender pouco. No entanto, parece que é isso o que as autoridades monetárias brasileiras fazem quando, para respaldar a avaliação de que a situação do País está menos vulnerável, atribuem a queda nas vendas para o mercado norte-americano a um "esforço para diversificar exportações". E ainda chegam a ponto de exibir dados que mostram que, em 2003, 23,2% das exportações eram destinadas aos EUA, enquanto, em 2007, este porcentual recuou para 15,8%. Ora, isso é uma inversão de valores. Se o superávit do Brasil em seu comércio de bens com os EUA diminuiu 85% em 2007, caindo de US$ 7,1 bilhões do ano anterior para US$ 1,1 bilhão, esses números, em vez de revelarem qualquer "esforço para diversificação", o que mostram claramente é perda de mercado. O resto é pretender fazer o interlocutor de bobo. É óbvio que países que mantêm laços comerciais próximos aos EUA são os que mais vão sofrer se a recessão se confirmar, mas isso não significa que aqueles que vendem pouco para o mercado norte-americano estarão imunes a eventuais abalos. Assim, sob esse olhar enviesado, parece, então, que México e Venezuela são os países latino-americanos que mais deverão sofrer com os possíveis efeitos da crise. Afinal, de acordo com o Departamento de Comércio norte-americano, o superávit do México em seu comércio de bens com os EUA subiu de US$ 64,2 bilhões em 2006 para US$ 74,2 bilhões em 2007, enquanto o saldo positivo da Venezuela, um grande fornecedor de petróleo para os EUA, subiu até US$ 29,6 bilhões, ante os US$ 28,1 bilhões de 2006. Até aqui, as explicações para a redução da participação dos EUA na pauta de exportação brasileira, nos últimos cinco anos, limitavam-se a duas questões: uma taxa de câmbio desfavorável e a concorrência das mercadorias chinesas. Agora, há um fator mais letal: os efeitos da redução da demanda provocados pelo pacote baixado em janeiro pelo governo Bush. Diante disso, a tendência é que a presença de produtos brasileiros no mercado norte-americano venha a se tornar mais reduzida. Basta ver que, em 2007, enquanto as exportações totais do Brasil cresceram 16% em relação a 2006, as vendas para os EUA aumentaram apenas 2,2%. E só cresceram porque a exportação de petróleo bruto se manteve em alta. Sem preço para competir no mercado norte-americano, fabricantes brasileiros de produtos industrializados têm procurado mercados alternativos, especialmente na zona do euro, que já absorve 29,7% das exportações brasileiras. Mas a União Européia (UE) também está em fase de retração, pois suas vendas para os EUA caíram. A UE aposta na China e demais países asiáticos, mas, se os EUA passam a comprar menos dessas nações, parece claro que o mundo começa a rumar para um comércio mais retraído. É o chamado efeito dominó em que todos têm de suportar algumas perdas porque ninguém pode passar ao largo neste mundo globalizado. Portanto, só nos resta torcer para que os EUA se recuperem logo. E voltem a comprar mais. *Milton Lourenço é diretor- presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo. Site: www.fiorde.com.br E-mail: fiorde@fiorde.com.br

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