PUBLICIDADE

''O Brasil já vive a sua doença holandesa''

Para ex-ministro. País deveria taxar exportações de commodities para reduzir o impacto na indústria nacional

Por Jamil Chade
Atualização:

ENTREVISTA - Luiz Carlos Bresser-Pereira, economista e ex-ministro da Fazenda O Brasil já vive sua "doença holandesa". O governo sabe disso e terá de pensar em taxar as exportações de soja, minérios e outras commodities. Quem alerta é Luiz Carlos Bresser-Pereira. Em entrevista ao Estado, o ex-ministro da Fazenda no governo de José Sarney e de Reforma do Estado e Ciência e Tecnologia no governo de Fernando Henrique Cardoso, alerta que a alta no preço das commodities gerou uma situação à qual o Brasil terá de se adaptar. Se a alta dos preços é positiva para exportadores de recursos naturais, está na hora de o governo pensar em seu impacto para a economia e principalmente para a indústria nacional. Em Genebra para reuniões na ONU, Bresser-Pereira diz que o governo está "empurrando com a barriga" o problema.A "doença holandesa" é um termo cunhado por economistas após a experiência da Holanda com a exportação de gás natural nos anos 60. A receita que entrava acabou gerando uma valorização cambial que prejudicou o setor manufatureiro e o tornou menos competitivo no exterior. Para Bresser-Pereira, a mesma realidade já ocorre no Brasil com a exportação agrícola. Eis os principais trechos da entrevista: Como a alta nos preços de commodities tem impactado a economia brasileira? O Brasil já vive sua doença holandesa. Não há nenhuma dúvida disso. O governo sabe. Tanto a presidente Dilma Rousseff quando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, são conscientes disso. Mas não reconhecem.Por quê?Porque se reconhecerem terão de tomar medidas para lidar com ela. Por enquanto, o governo tem optado em empurrar esse assunto com a barriga. Qual seria o remédio?Hoje, o Brasil poderia tranquilamente aplicar uma taxa sobre exportações de commodities. De uma forma disfarçada, Delfim Neto já havia feito isso no passado com o café. Na realidade, essa taxa ao café vigorou no Brasil entre 1968 e 1991. Portanto, não é algo novo. Agora, precisamos repetir isso com a soja e com os minérios. Mas, neste momento, o governo parece não estar disposto a brigar nem com a Vale nem com os produtores de soja. O que o governo precisa fazer é demonstrar para esses grupos que, diante da alta nos preços internacionais, eles não perderão com a taxa e que a economia nacional ganharia. Há exemplo de país que adotou a taxa de exportação e conseguiu reequilibrar sua economia?Os Emirados Árabes taxam a exportação de energia em 98%. E é com isso que conseguem criar internamente um mercado de turismo e garantir a sua indústria tecnologia de ponta. Qual o risco de demorar para reconhecer o problema?Existem dois riscos. O primeiro, de uma queda no crescimento, ante o recuo na exportação de industrializados. O segundo é de a economia entrar em crise. Não seria para já. Mas viria de problemas sérios na balança de pagamentos. Em ambos os casos, seriam bolhas na economia brasileira que explodiriam. A exportação agrícola não é o único motivo da valorização cambial. Há também o ingresso de capital especulativo. O que o governo pode fazer diante disso ?Só há uma coisa a fazer: taxar a entrada de capital. Mas o governo já faz isso com o IOF. Ele funciona?Sim, funciona. Mas precisa ser adotado para todos os capitais. As medidas precisam ser mais drásticas, o governo sabe disso.Isso não espantaria capital estrangeiro do Brasil?O Brasil não precisa desse tipo de capital internacional. Hoje, uma multinacional que decide abrir produção no País vai ao BNDES e pega empréstimo. Não precisamos mais do Banco Mundial. Há uma alta taxa de substituição da poupança nacional pela poupança externa. Elas não se somam.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.