‘O Brasil poderia atrair muito mais investimentos’, diz economista do Goldman Sachs

Para Alberto Ramos, economista-chefe do banco Goldman Sachs para a América Latina, o risco fiscal do Brasil e a falta de reformas impedem uma entrada maior de capitais

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Por Filipe Serrano
3 min de leitura

Na visão do economista-chefe para a América Latina do banco Goldman Sachs, Alberto Ramos, o crescimento dos investimentos estrangeiros no Brasil ocorre por uma combinação de fatores: o avanço da vacinação contra a covid (ainda que lentamente), a melhora da perspectiva de crescimento para economia brasileira, os altos preços internacionais de matérias-primas produzidas pelo Brasil (como minério de ferro e soja), que favorecem setores exportadores, e o aumento da arrecadação federal, que reduziu o risco fiscal. 

Somado a um real ainda desvalorizado frente ao dólar, é natural que as empresas estejam retomando seus planos de investimentos, porque o custo ainda é baixo em dólares. "Agora, a gente não pode se contentar com pouco. O Brasil poderia estar atraindo muito mais investimento direto dado o potencial e a dimensão da economia. Se o Brasil tivesse uma situação fiscal saneada, e outro quadro político, poderia ter um investimento estrangeiro absolutamente extraordinário, mas não tem", diz Ramos na entrevista a seguir:

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O interesse pelo Brasil e o interesse por investimento estrangeiro aumentou com a volta do crescimento. Há uns meses havia uma perspectiva muito ruim de crescimento, um grande risco fiscal e bastante ruído político. Além do mais, os resultados das empresas ainda refletiam os prejuízos da paralisação durante a pandemia. 

Agora, com a retomada do crescimento, a melhora do resultado das empresas, é normal que elas decidam investir novamente no negócio e que isso leve a uma melhora dos fluxos de investimento. Além do mais, os preços de commodities estão elevados, o que também diminuiu o risco fiscal de curto prazo. A possibilidade de haver uma crise fiscal séria no curto prazo caiu significativamente, pela própria melhora da arrecadação, e com a aprovação do Orçamento e tudo mais.

'O Brasil desencantou', diz Ramos Foto: Mark McQueen/Goldman Sachs

Houve também alguns avanços em Brasília. A transição da liderança na Camara e do Senado. A Medida Provisória (MP) da Eletrobrás passou. Passou o Orçamento. Há agora alguma perspectiva de pelo menos uma parte da reforma tributária passar. Embora eu seja bastante pessimista sobre esse assunto. Acho que é uma reforma minimalista, bem longe do que o Brasil precisa. Existe também alguma possibilidade, pequena a meu ver, de ter uma reforma administrativa.

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Com um quadro de crescimento e risco fiscal de curto prazo contido, isso leva a uma melhora dos investimentos estrangeiros diretos. 

Agora, acho que a gente não pode se contentar com pouco. A gente podia estar atraindo muito mais investimentos dado o potencial e a dimensão da economia. O Brasil com uma situação fiscal saneada, com outro quadro político, poderia ter um nível de investimento absolutamente extraordinário, mas não tem. Não dá para celebrar porque o investimento direto está voltando a crescer um pouquinho.

O que impede uma entrada maior de recursos?

O que impede é o risco fiscal. O Brasil ainda tem uma situação fiscal extremamente débil. Os anos vão passando e as reformas fiscais não avançam. A gente começou a falar do ajuste fiscal quando a presidente Dilma foi reeleita. Era esperado que o Brasil iria voltar a ter superávit primário. Já estamos há 7 anos consecutivos de déficit primário, sem perspectiva de que chegue a um superávit no curto prazo.

Já no governo Bolsonaro, as reformas que aconteceram até agora ficaram bem aquém em relação ao que é necessário. Não dá para celebrar. Ainda temos um nível de dívida sobre o PIB em 80%.

E cada vez que há uma sobra no Orçamento, como agora, há mil e uma maneiras para justificar novos gastos. E o ajuste que é bom, nada.

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É de curto prazo. A gente precisa de 'n' vezes isso. O investimento é muito baixo. O estoque de capital é baixíssimo. A gente precisa de um aprofundamento da dinamica de investimento, tanto de investimentos locais quanto de estrangeiros. Há um déficit gigante de infraestrutura. O parque industrial precisa se modernizar. Infelizmente o estado que arrecada uma enormidade, gasta uma enormidade e investe pouco. É uma coisa meio disfuncional. O Brasil tributa muito, gasta muito e investe pouco. É uma combinação rara. 

Como está o interesse dos estrangeiros pelo Brasil?

O interesse sobre o Brasil caiu muito nos últimos dois anos. Caiu a ponto de o grande investidor estrangeiro ter se desinteressado. O Brasil desencantou. Agora está voltando um pouquinho. A própria moeda se valorizou, com a subida do juro, com a volta do crescimento. Aos trancos e barrancos, o processo de vacinação está avançando. Começou a haver um pouquinho mais de interesse. Mas em relação ao potencial do Brasil, ainda tem muita estrada pela frente. 

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