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O câmbio fora do Banco Central?

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Por Redação
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A decisão do governo brasileiro de criar um fundo soberano de riqueza (Sovereign Wealth Fund) enfrenta um punhado de dificuldades e pode tirar do Banco Central o exercício da política cambial. Estes fundos estão sendo formados por países com forte sobra de dólares, ou porque são grandes exportadores de petróleo ou porque vêm tendo grandes superávits no comércio exterior. Sábado e domingo, esta coluna falou sobre a natureza e o impacto geopolítico desses fundos, cujo patrimônio ultrapassa hoje os US$ 2,2 trilhões e cresce à velocidade de US$ 1,2 trilhão por ano. No último fim de semana, os ministros de Finanças e os presidentes dos bancos centrais dos sete países mais ricos reunidos em Washington no Grupo dos Sete pediram ao Fundo Monetário Internacional um projeto de monitoramento desses fundos. Querem determinar o que eles podem ou não comprar. O governo alemão, por exemplo, teme que o fundo do governo russo compre o controle de vastas redes de petróleo e gás na Europa. Voltemos agora ao fundo soberano brasileiro. O primeiro grande problema para a constituição desse fundo é determinar a origem dos recursos que comprarão moeda estrangeira. Para ter um fundo desses não basta ter sobra de moeda estrangeira. No Brasil, esses recursos são do setor privado, já que pertencem ao exportador ou ao investidor estrangeiro. Ou seja, é preciso que o governo central disponha de recursos orçamentários para comprar os dólares. Mas este é um assunto muito importante que fica para uma próxima coluna. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, já advertiu que o fundo não pode ser constituído com reservas. Estas têm de ter aplicações conservadoras e sua destinação está prevista por lei. A idéia é a de que os recursos do fundo soberano sejam usados para comprar títulos de empresas de primeira linha ou para ajudar empresas brasileiras a expandir seus negócios no exterior. Por aí já se vê que terá funções de fomento, incompatíveis com as funções do Banco Central. Terá de ser administrado ou pelo Ministério do Desenvolvimento ou pelo Ministério da Fazenda. Como o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, está fora das discussões, pelo menos em seu atual estágio, o Ministério da Fazenda, provavelmente por meio do Tesouro, deverá vir a ser o administrador desse fundo. Será um mecanismo destinado a permitir que o governo brasileiro siga comprando moeda estrangeira e, portanto, interferindo nas cotações do câmbio, mesmo após as reservas atingirem níveis satisfatórios. O projeto inicial prevê que o Tesouro seja um dos principais compradores (talvez o único) de moeda estrangeira para o fundo. Isso sugere que o Banco Central, que não vai mais empilhar reservas, pode perder as condições de exercer a política cambial - como é nos Estados Unidos. Ora, a cotação do dólar tem forte impacto sobre a política monetária (política de juros), prerrogativa do Banco Central. É a cotação do dólar que determina os preços em reais dos produtos importados e, por tabela, boa parte dos preços internos (inflação), que é o critério de calibragem dos juros básicos (Selic). Dá para imaginar o braço-de-ferro que a criação do fundo soberano deve aprontar na administração federal.

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