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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|O Copom não abre nem fecha portas

A principal questão à espera de resposta é se certo afrouxamento dos juros estaria em condições de injetar combustível no mercado

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Atualização:

Não teria de ser apenas porque o Banco Central está de presidente novo, o economista Roberto Campos Neto, que a primeira reunião do Copom tivesse de apresentar novidades na política monetária (política de juros).

Os juros básicos (Selic) ficaram onde estavam, nos 6,5% ao ano, como esperado, e não se viu nenhuma notável mudança de tom no comunicado divulgado logo após a reunião.

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Já se vê em segmentos da comunidade econômica certa impaciência com a fragilidade da recuperação econômica, de resto admitida pelo Copom. A indústria não reage, o desemprego continua muito alto, o aumento da renda é vacilante e, com isso, o consumo, tímido demais. Com base nesse panorama, esses observadores argumentam que a inflação não tem como acelerar e, portanto, os juros podem ficar mais baixos, para empurrar o crédito e, em seguida, a atividade econômica. Ou seja, para esses analistas, o Banco Central não só está atrasado, mas vem jogando contra a retomada da economia.

A decisão do Copom foi a de não mudar a marcha, pelo menos por enquanto. O comunicado manteve o tom das análises anteriores sobre os fundamentos. A economia mundial, embora desafiadora, não deverá exportar inflação para o Brasil. Mas há o risco de contaminação da economia brasileira pela deterioração da economia dos países emergentes. As principais incertezas internas envolvem a tramitação do projeto de reforma da Constituição. Todo sucesso aí ou qualquer derrapada “afeta as expectativas”. É o que recomenda cautela e, portanto, tal manutenção dos juros – como diz o comunicado.

Mas a principal questão à espera de resposta é se certo afrouxamento dos juros estaria em condições de injetar combustível no mercado.

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Nas economias de alta renda crescem as dúvidas de que os bancos centrais sejam capazes de produzir tração do sistema produtivo. A propósito, a Coluna do último domingo (Fim do ciclo?) tratou do debate entre especialistas sobre a atual incapacidade dos bancos centrais de atuarem como fomentadores da atividade econômica.

Não é esta a principal restrição da política de juros no Brasil. O Banco Central tem por objetivo empurrar a inflação para a meta e não a de estimular a economia. O que se pode dizer é que a baixa atividade econômica contém a inflação e, portanto, pode estar deixando espaço para nova baixa de juros. Em todo o caso, a principal questão está em saber até que ponto um pontinho e qualquer coisa a mais nos juros seria capaz de estimular o crédito e a produção.

Provavelmente não seria. Não dá para dizer que falte crédito no Brasil. O principal obstáculo não são os juros altos. Em outros tempos, mesmo com o preço do dinheiro substancialmente mais alto do que o de hoje, a economia conseguia deslanchar. São dois os principais obstáculos. O primeiro é a falta de vontade das empresas de investir. Elas parecem prostradas, pela falta de confiança, à espera de que a política econômica comece a funcionar, especialmente à espera de que a política fiscal entre nos eixos. A outra restrição não é a baixa oferta de crédito, mas a incapacidade de endividamento. O consumidor ainda está sobrecarregado com compromissos junto com os bancos, agravado pela quebra de renda e pelo desemprego. Por isso, segue devagar com as compras e com a tomada de novos financiamentos.

Nos últimos meses, ficou reforçada a impressão de que a reforma da Previdência seria a senha para o início da transformação. Não é bem assim. A aprovação da reforma por si só, desde que robusta, seria um passo necessário para arrumar a economia. Sem ela, o rombo tenderia a alastrar-se e, com ele, a desconfiança. Mas a aprovação não seria condição suficiente para a decolagem. Dependeria de mais coisas, como de retomada da confiança, encaminhamento de novas reformas, disposição de investir, novos leilões de concessão de serviços públicos, saúde das exportações, etc.

A decisão desta quarta-feira não fecha portas, mas também não as abre.

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Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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