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O destino dos entregadores de pizza

Quem responde por esses profissionais quando o trabalho é prestado em diferentes localidades e para várias plataformas?

Por José Pastore
Atualização:

Os recentes protestos dos entregadores que trabalham ligados a plataformas digitais sensibilizaram a Nação. A maioria trabalha com pouca proteção.

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O Congresso Nacional está atento. Mas a maioria dos projetos de lei busca estender as proteções da CLT aos que trabalham em plataformas. Isso é muito difícil porque as proteções aos empregados decorrem do vínculo empregatício (art. 3.º da CLT) e se referem a quem trabalha continuamente em local fixo, com pessoalidade e subordinado a um empregador.

Bem diferente é o mundo dos que trabalham em plataformas. A atividade é irregular. Não tem lugar fixo. Trabalham em situações variadas – na rua, nas empresas, residências, escolas, hospitais, pessoas físicas, etc. Muitos trabalham para várias plataformas. Há os que combinam o trabalho em plataformas com o de empregados convencionais em empresas. Como autônomos, eles definem as horas de trabalho e os momentos de repouso.

A maioria dos entregadores de aplicativos trabalham com pouca ou nenhuma proteção. Foto: Alex Silva/Estadão

Isso ocorre não apenas com os entregadores, mas com a grande maioria dos que trabalham em plataformas com diferentes finalidades, por exemplo, Google (busca e publicidade); Google Scholar (pesquisa); Ticketmaster (eventos); Loggi (entregas); Airbnb (alojamento); Freelancer (consultores); Ebay (mercado de produtos); PayPal (pagamentos); Quinto Andar (locação); Rappi, iFood, Uber Eats (restaurantes); LinkedIn, Facebook, Twitter, Instagram (relacionamento social); Apple, Amazon, Alibaba, (compras); Uber, Cabify, 99 (transporte de pessoas); WhatsApp, Skype, Zoom, Teams (interação); Spotify, Netflix, YouTube, iTunes (entretenimento), COJ-3C, SAJ-ADV, lawyer-eleven (trabalhos jurídicos) e inúmeras outras plataformas de empresas, bancos, hospitais, educação a distância, etc.

Para aplicar as regras da CLT a estes casos a dificuldade é insuperável: quem são os empregadores quando os profissionais trabalham para várias plataformas? Como calcular benefícios trabalhistas e previdenciários para trabalhos realizados em frações de hora, dias, semanas e de forma irregular? Quem responde pela proteção quando o trabalho é prestado em diferentes localidades e tomadores?

Se, de um lado, as regras da CLT não se aplicam a realidades tão movediças, de outro, os profissionais autônomos que trabalham em plataformas precisam de proteções. Como protegê-los?

O desafio é grande. Mas, felizmente, o Brasil não está a zero neste campo. Já existe um início de regramento que, com os devidos ajustes, pode proteger os autônomos. Lembro aqui o Programa do Microempreendedor Individual (MEI), que oferece as proteções de aposentadoria, auxílio-doença, licença-maternidade, pensão por morte e auxílio-reclusão. Lembro também que os profissionais que recebem honorários mediante apresentação de Recibo de Profissional Autônomo (RPA) dispõem de uma ampla cobertura: aposentadoria, auxílio-doença, salário-maternidade, auxílio-reclusão e pensão por morte. Além disso, o INSS permite que os autônomos sejam contribuintes individuais, o que, igualmente, garante várias proteções previdenciárias.

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É claro, todas essas regras precisam de adaptações para atender às peculiaridades do trabalho em plataformas digitais. Mas elas são um importante ponto de partida. Além disso, pode-se ampliar a proteção dos autônomos por meio de modalidades de seguros como, por exemplo, o de acidentes que pague despesas médicas e alguma renda durante a recuperação. O campo dos seguros sociais está aberto para as seguradoras e bancos oferecerem esta e outras proteções. Para completar, convém apoiar as associações para facilitar a negociação.

*PROFESSOR DA FEA-USP, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS, É PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA FECOMERCIO-SP

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