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'O dinheiro está se adequando a uma nova economia', diz Marina Grossi

Presidente de conselho voltado ao desenvolvimento sustentável tem conversado com várias lideranças em Brasília para apresentar pautas socioambientais de 72 empresas

Por Fernanda Nunes
Atualização:

RIO - À frente de um movimento de 72 empresas, a presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), Marina Grossi, tem percorrido os três Poderes em Brasília para apresentar a pauta socioambiental e de governança de grandes corporações.

O que inicialmente era um comunicado ganhou adeptos e se transformou num movimento dos setores produtivo e financeiro. A última adesão foi da Alpargatas. No fim do mês passado, cinco fundos de investimento já haviam aderido - Mauá Capital, Fama Investimentos, JGP, Fram Capital e SulAmérica Investimentos. "O dinheiro está se adequando", diz Grossi, na entrevista abaixo:

Marina Grossi esta à frente de um movimento formado por 72 grandes empresas. Foto: Fiesp/Divulgação

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Qual o diferencial desse movimento de 72 empresas e fundos de investimento?

A grande diferença do nosso movimento é que insere presidentes de empresas, e não apenas associações, mostrando que a questão ambiental não é uma preocupação exclusivamente de ambientalistas, mas das companhias e pode ser uma vantagem competitiva para o Brasil. O nosso movimento é nacional. São empresas que operam no País, sobretudo na Amazônia, que nas suas gestões já utilizam critérios (ESG) e, ainda assim, são prejudicadas.

O que atraiu os fundos de investimento?

É natural que investidores nacionais tenham buscado assinar a carta. Essa palavra em moda, que nunca ouvi tanto, a ESG (ambiental, social e governança, em inglês), antes ligada à responsabilidade corporativa, significa hoje ter gestão de ativos pautada em critérios ambientais, sociais e de governança. O Larry Fink (presidente da gestora global BlackRock) falou em Davos (em janeiro deste ano) que as empresas não podem mais olhar apenas para o lucro. Elas têm de ter visão de longo prazo, que é a incorporação de aspectos sociais e ambientais, e de uma governança clara. A visão de curto prazo é só financeira. Por isso não foi uma surpresa quando os investidores nos buscaram. A gente não foi atrás deles. Eles que quiseram participar.

Novos investidores estão aderindo?

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A adesão deles aconteceu espontaneamente. A gente está criando critérios e os que atenderem a esses critérios e quiserem entrar serão bem vindos. Mas não estamos indo atrás de nada.

Critérios para quê?

A gente não pode aceitar qualquer empresa. Ela tem de estar comprometida com o que está colocado ali (no comunicado), tem de ser apartidária, por exemplo. Viramos um movimento e a gente não quer que a mensagem passada pelos primeiros signatários seja desvirtuada. Estamos criando uma governança interna para ter esse controle.

Como a participação dos fundos fortalece o movimento?

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Numa economia de baixo carbono resiliente e sustentável, onde está o dinheiro é peça fundamental. Quando os investidores sinalizam com critérios, movimentam toda a roda. Não tenho dúvida de que, com a presença deles, será possível acelerar o cumprimento das metas do Acordo de Paris, porque o dinheiro está se adequando a uma nova economia.

Imagino que a equipe econômica do governo esteja atenta às reivindicações empresariais.

Claro. Os signatários da carta são agentes com grande capacidade de mobilização de recursos. A pandemia vinculou o desequilíbrio na biodiversidade ao que está acontecendo. Não há condição de mobilizar esse tipo de recurso a cada vez que surgir uma pandemia. E vão surgir outras. Se a sociedade não pensar na biodiversidade, numa economia circular, se não tiver visão de longo prazo, não vai conseguir se precaver diante dos novos desafios. Entre as grandes empresas e investidores, não há quem diga que não sejam severos os efeitos da mudança do clima. A gente tem de preparar a economia e a sociedade para fazer frente a esses desafios.

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O ministro da Economia, Paulo Guedes, sinalizou interesse em recebê-los?

A gente vai solicitar para falar com ele em breve sobre a precificação de carbono, e não sobre o comunicado. Já estamos conversando com o time técnico da área econômica. O Cebds tem assento no Projeto PMR Brasil (do Ministério da Economia) para discutir cenários de precificação de carbono. Voltando ao comunicado, estamos marcando com o Dias Toffoli (presidente do Supremo Tribunal Federal), com Augusto Aras (procurador-geral da República) e Davi Alcolumbre (presidente do Senado). E vamos falar também ao consórcio de governadores. Com cada um deles estamos tratando da pauta específica que toca aquela instância.

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O movimento ganhou força nesse período de pandemia?

Estivemos com o Rodrigo Maia (presidente da Câmara) e uma das coisas que a gente falou foi que tem de ser aproveitado o momento de reformas para não fazer mais do mesmo. A gente tem de sair dessa pandemia com uma economia mais estável. E isso não vai acontecer se for feito mais do mesmo. Isso a gente vê na Europa, com o Green Deal (Acordo Verde). A abertura está sendo organizada incorporando os princípios de uma economia circular, de baixo carbono. Isso nos interessa também. Cada vez mais o capital tem de estar de acordo com essas normas. Essa é uma tendência que, com a pandemia, se acelerou.

O Cebds tem entre seus associados empresas do setor de petróleo, que também assinaram o comunicado entregue ao governo. Não é uma incoerência, já que os combustíveis fósseis são uma peça fundamental da velha economia?

Algo que está escrito no comunicado é a precificação de ativos. Existem lacunas de mercado porque externalidades (efeitos colaterais da produção) não são precificadas. Então, não há preço para a poluição e emissões. A conta não fecha. Precificação de carbono é uma bandeira, por exemplo, da Shell. É uma forma dela se transformar de petrolífera em uma empresa de energia cada vez mais renovável. Uma forma também de alcançar as metas do Acordo de Paris. Sem isso, petrolíferas podem optar por não investir em renováveis.

As signatárias definiram um prazo para que o movimento gere resultados práticos?

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O que a gente espera está colocado no comunicado. Mas é preciso que se tenha metas. O setor privado atua com metas. Enquanto isso não acontecer, temos de continuar conversando até chegar a soluções práticas e colaborativas. O movimento não está só cobrando, se dispõe também a auxiliar.

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