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O dinheiro para a agricultura sumiu

Se há um setor da economia nacional que ainda consegue se manter competitivo é o agronegócio. No entanto, de fiador o segmento pode passar a devedor, o que seria um retrocesso e golpe duríssimo para toda a sociedade brasileira.

Por Cesário Ramalho da Silva
Atualização:

Inegavelmente responsável por segurar as contas do Brasil em tempos não tão mais recentes de bonança, o agronegócio se torna ainda mais imprescindível na hora da crise. Se não fosse, por exemplo, o caixa gerado pelas exportações de produtos agropecuários, que permite ao Banco Central fazer certa arbitragem no câmbio, a queda do real ante o dólar seria maior, agravando ainda mais o cenário econômico.

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O dólar apreciado é positivo para o agronegócio no tocante às exportações, mas a valorização da moeda norte-americana tem efeito dúbio para o setor. No momento do plantio da grande safra de grãos, ou seja, agora, ela encarece os insumos usados nos preparativos da lavoura - que, ao contrário de anos anteriores, não foram adquiridos com a antecedência que é recomendada, justamente pela recessão que se instaurou no País. Com isso, operações de troca da produção por defensivos e fertilizantes se intensificaram, resgatando práticas do passado.

O desequilíbrio cambial é, porém, parte de um problema maior, este, sim, estrutural, que é a necessidade urgente de um novo modelo de crédito rural. O período de boom no preço das commodities, associado à robusta demanda chinesa - para sintetizar o raciocínio em megafatores -, fez irrigar recursos para a atividade agropecuária, mascarando as deficiências de um sistema de financiamento defasado.

Só que o fim deste ciclo, combinado com a grave crise por que passa o País, secou a fonte, escancarando a necessidade de o Brasil encontrar novas formas de atração de capital para o agronegócio como um todo, não apenas para o segmento primário, sob o risco de o setor definhar, o que deterioraria nossa mais eficiente alternativa de geração de divisas.

O fato é que a maioria dos R$ 187 bilhões anunciados no Plano Safra 2015/2016 não está chegando ao produtor rural, ressuscitando um problema do passado. A agropecuária, ainda (equivocadamente) dependente em demasia do recurso oficial, está enfrentando sérias dificuldades de financiamento.

Com o recuo dos depósitos compulsórios, somado ao aumento dos saques da poupança, o dinheiro que é reservado para o crédito rural sumiu na prática. O que é liberado sai a conta-gotas e somente após um feroz escrutínio das instituições financeiras operadoras do crédito rural oficial, que, ao exigirem garantias reais do produtor para autorizar o empréstimo, inviabilizam a operação. O que o produtor tem a oferecer é o que ele vai colher, mas, se ele não plantar, o nó está feito.

O rebaixamento da nota de grau de investimento do Brasil - restrito, ainda, a uma agência de risco - e a escalada dos juros domésticos só pioraram o quadro, já que provocaram a saída de recursos do País e encareceram o custo do capital que ainda sobrou, oferecido a taxas livres. Os cortes orçamentários do ajuste em curso também atingiram verbas que eram destinadas aos programas de garantia de preços mínimos, apertando ainda mais o torniquete creditício em torno do produtor.

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Cada vez mais profissional, dinâmico, moderno, internacional e necessário à Nação, a realidade é que o agronegócio - e seu elo mais importante, o produtor rural - não pode mais depender do escasso e antiquado crédito oficial. Este, quando falha - e a tendência é de que falhe mais e mais -, põe em risco o setor e o País.

Até mais do que uma lei agrícola ao estilo Farm Bill, dos Estados Unidos, que contemple cinco, dez anos, o que o agronegócio brasileiro precisa mesmo é de mecanismos seguros e previsíveis que destravem a injeção de recursos privados, algo que o governo foi incapaz de fazer nos últimos 12 anos. Seguradoras e fundos de investimentos estrangeiros interessados em negócios no setor certamente não faltariam.

Cesário Ramalho da Silva é produtor rural. Foi presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB)

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