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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|O dólar e a indústria

Apenas em 2018, o câmbio interno viu a moeda norte-americana saltar 15,9%

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Atualização:

Ano após ano, dirigentes da área empresarial e economistas protecionistas martelavam que, além dos juros altos, a principal causa dos males da indústria brasileira era o “câmbio fora de lugar”.

Queriam dizer com isso que o real excessivamente valorizado em moeda estrangeira tirava competitividade do setor produtivo, pois barateava em moeda nacional o importado e encarecia em dólares o produto de exportação.

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Apenas em 2018, o dólar saltou 15,9% em reais e, no entanto, agora, a indústria se queixa de que a desvalorização do real, que se pressupunha bem-vinda, encareceu insumos, máquinas e peças importadas, aumentou a dívida externa em reais e, assim, passou a tirar competitividade da indústria nacional. Ou seja, na crescente e inevitável integração global, o castigo é com o câmbio valorizado ou com ele desvalorizado.

O problema de fundo não está nem no câmbio nem nos juros. O verdadeiro problema tem nome: baixa competitividade da indústria brasileira. Atinge a todas, tanto as de capital nacional como as de capital estrangeiro. O automóvel brasileiro, por exemplo, que é produzido por empresas de capital estrangeiro, dotadas de tecnologia avançada, não tem competitividade externa.

Imaginava-se que a deficiência de competitividade pudesse ser compensada com tarifas aduaneiras altas e com câmbio desvalorizado. É o baixinho querendo altura com sapatos de salto alto.

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Não dá para ignorar o que explica boa parte dessa baixa competitividade. É a alta carga tributária; a infraestrutura precária, cara ou inexistente; a baixa qualificação da mão de obra; os juros altos; e a instabilidade das regras de jogo.

Mas isso não é tudo. Ainda que enfrente alguns dos mesmos problemas da indústria, o agronegócio dá show. Por que a Embraer é um sucesso e tantas indústrias, até mesmo as modernas, não são?

Uma resposta para essas perguntas está nos vícios que impregnam a administração de negócios no Brasil. É a notória tendência às soluções de curto prazo, o apego ao jogo protecionista, às reservas de mercado, às subvenções, desonerações, redução de impostos e as pressões intermináveis para o próximo Refis (perdão de impostos).

Os programas provisórios de favorecimento adotados pelo governo se perpetuam. A indústria de veículos tem mais de 70 anos no Brasil e sempre espera novo pacote de bondades. A Zona Franca de Manaus, instalada em 1957, daria viabilidade a empresas nascentes, mas depois de 60 anos não consegue deixar de engatinhar ou livrar-se do andador.

Políticas de favorecimento produzem enormes distorções. Quando o governo elege setores ou supostos futuros campeões nacionais para receber tratamento diferenciado, impõe condições concorrenciais desiguais que, depois, criam novos pretextos para distribuição de compensações que, em geral, não passam de novos “puxadinhos”.

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Essas são algumas das razões pelas quais a indústria do Brasil está sempre cambaleante. Qualquer alteração mais relevante dos juros e do câmbio, como agora, é nova rasteira. As mudanças no setor produtivo global, que vêm aí com a tecnologia da indústria 4.0, trazem graves impactos à indústria que não souber andar com as próprias pernas.

CONFIRA

» É o risco Brasil

No gráfico acima, você tem o comportamento do principal indicador de risco do Brasil percebido lá fora pelos investidores em títulos do Tesouro do Brasil. Trata-se do Credit Default Swap (CDS), para títulos de 5 anos. Ele mostra quanto o investidor está pedindo em pontos (cada 100 pontos equivale a 1%) acima dos juros para ficar com o título. Essa curva mostra que a percepção de risco continua alta, embora já não tão alta quanto há um mês, quando o nível de incerteza parecia razoavelmente maior.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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