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O maior perigo para o bem-estar no Brasil

O modo de aplicação da economia convencional não ajudou a resolver o dilema entre crescimento e clima

Por Vinod Thomas
Atualização:

A política econômica atual no Brasil, assim como nos EUA, considera de forma errônea as ações climáticas e a proteção ambiental como hostis ao crescimento econômico. Mas a verdade é exatamente o oposto. A destruição ecológica acelera o passo das mudanças climáticas, que representam o maior perigo para o crescimento econômico e o bem-estar social. Para protegê-los, especialmente as maiores economias do mundo, como China, EUA, Índia e Brasil, deveriam admitir essa realidade e se descarbonizar.

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Os cientistas não poderiam ser mais claros sobre a devastação das florestas tropicais, o derretimento das geleiras e o aquecimento global. Mas os sinais vitais estão indo na direção errada. O dióxido de carbono na atmosfera atingiu o perigoso nível global de 415 partes por milhão, pois os principais emissores, China, EUA, Índia e Brasil, estão aumentando suas contribuições. Este ano, setembro foi o mês mais quente registrado no mundo, e uma onda de calor afetou a maior parte do Brasil com temperaturas acima de 40ºC.

O modo de aplicação da economia convencional não ajudou a resolver o dilema entre crescimento e clima. A literatura econômica trata as emissões de dióxido de carbono pelas usinas de energia como “externalidades” ou efeitos colaterais, que por sua vez prejudicam a saúde das pessoas e agravam o aquecimento global. Mas esses efeitos não têm sido parte integral da análise do crescimento. Ao contrário, a economia do crescimento tem sido utilizada de forma incorreta para justificar a desregulamentação ambiental, que incentiva o desmatamento e as queimadas, como na Amazônia brasileira, prejudicando a saúde e reduzindo o crescimento.

Neste momento, em que é necessária maior proteção ambiental, EUA, Índia e Brasil estão na direção errada. Nos EUA, a mudança dos padrões para usinas de energia e automóveis aumentará as emissões de gases do efeito estufa. Na Índia, o enfraquecimento das políticas sociais prejudica a saúde das pessoas. E, no Brasil, a queima da maior floresta tropical do mundo é uma catástrofe ecológica, num país que possui de longe o maior capital natural e tem muito a perder com a sua destruição.

No Brasil, a atenção com o clima tem duas vertentes. Por um lado, o País está entre os mais vulneráveis aos desastres climáticos. Nesta década, houve um aumento de eventos como secas prolongadas e extremos de enchentes e desabamentos com vítimas fatais em diversas cidades. A desregulamentação ambiental e o mau uso da terra tornam o Brasil mais propenso aos crescentes desastres climáticos.

Por outro lado, como 7.º maior emissor de gases do efeito estufa, o Brasil também é parte do problema climático global. Apesar de signatário do Acordo de Paris, o governo adotou medidas que enfraquecem o marco institucional e legal e o combate ao desmatamento e a outras infrações ambientais. Mudanças recentes também reduzem a participação da sociedade civil, como os grupos de defesa do meio ambiente, na formulação de políticas e de sua fiscalização.

Levando em conta o enorme protagonismo do Brasil no perigoso direcionamento climático, o País tem todas as credenciais para liderar a ação climática global. Em seu próprio interesse, uma dupla abordagem seria mais benéfica: restabelecer a proteção ambiental e a ação climática, impedindo a desregulamentação que estimula a queima da Floresta Amazônica, e ajudar na mobilização de ações climáticas nos EUA, na China, Índia e outras nações.

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Talvez já seja tarde demais para reverter a crise climática. Mas, no mínimo, Brasil, China, Índia e EUA ainda podem participar de uma possível solução, ao invés de empurrar o mundo para o ponto de inflexão. Ideal seria o Brasil liderar a proteção ambiental e as ações climáticas necessárias ao crescimento econômico local e global.*PH.D. EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DE CHICAGO, AUTOR DE ‘O BRASIL VISTO POR DENTRO’, FOI VICE PRESIDENTE SÊNIOR DO BANCO MUNDIAL

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