PUBLICIDADE

O novo Comef

Por Jairo Saddi
Atualização:

Reveste-se da maior importância a criação do Comitê de Estabilidade Financeira (Comef), no âmbito do Banco Central (BC). Anunciado como parte de um processo mais amplo de reestruturação das diretorias do BC, o novo órgão é complementar ao Comitê de Política Monetária (Copom), mas terá também funções específicas em fóruns nacionais e internacionais relacionados à regulação e fiscalização do sistema financeiro no mercado de capitais. Suas atribuições incluem, ainda, definir as estratégias e as diretrizes do BC para a condução dos processos relacionados à estabilidade financeira, além de atuar de forma integrada e coordenada nos mecanismos de ameaças à estabilidade financeira, por meio da prevenção do risco sistêmico.De forma simbólica, as diretorias do BC foram renomeadas e passam agora a representar a função que lhes cabe. Assim, a Diretoria de Normas recebeu o nome de Diretoria de Regulação do Sistema Financeiro e a Diretoria da Área Externa, de Diretoria de Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos. Finalmente, a antiga Diretoria de Liquidações passou a ser Diretoria da Organização do Sistema Financeiro e Controle das Operações de Crédito Rural, absorvendo os processos de aprovação de instituição financeira que antes estavam na Diretoria de Normas.As mudanças poderiam ter sido mais ousadas, desvinculando os temas de política monetária do Copom (leia-se definição da taxa de juros) e vinculando-os às diretorias da autarquia, já que hoje todos votam em matéria monetária. O mesmo se repete agora, com o Comef, e mais uma vez se perde a chance de haver um conselho de administração para o Banco Central e um comitê próprio e exclusivo para assuntos de política monetária. Perde-se também a chance das Comissões Consultivas, existentes no nascedouro do BC e que faziam ecoar maior representatividade da sociedade em matéria monetária e creditícia.Ainda assim, e mesmo com o apreço da cultura latina pelos comitês e conselhos, a ideia do Comef deve ser bem recebida. A estabilidade do sistema financeiro é um dos mandatos mais importantes do BC, e é o que assegura o valor da moeda entre nós. Ou seja, mesmo que para coordenar melhor a sua missão institucional um comitê deva ser criado, o assunto é importante e merece atenção.O difícil, como se sabe, são os detalhes, não a estrutura. Decidir a composição, a periodicidade das reuniões, etc., é sempre assunto mais trivial do que, no momento da crise, fazer valer as suas recomendações e estabelecer a sua régua de poder. Segundo o diretor de Fiscalização do Banco Central, Anthero Meirelles, ao justificar a criação do Comef, as razões para um órgão complementar são evidentes: "Já temos o Copom, agora teremos mecanismos para estabilidade do sistema", referindo-se à dupla missão institucional da estabilidade da moeda e do sistema financeiro, mesmo que suas conclusões e recomendações não sejam impositivas ao órgão. "O Comef poderá dar diretrizes para sermos mais proativos", reservando à diretoria a palavra final. Como a diretoria compõe o Comef e o Copom, temos uma situação meio hamletiana de processo decisório, em que todos decidem tudo e palpitam nas áreas alheias.Comitês facilitam o processo de discussão de qualquer tema - como se sabe, a decisão do grupo quase sempre é melhor do que a decisão individual. Portanto, destacar instâncias a temas específicos é sempre louvável. O problema é o "assembleísmo", a ideia de que estar em reunião é o primeiro passo para o sucesso de uma proposição. Como afirmei, melhor seria um conselho de administração (com a devida e majoritária participação do governo) e um comitê específico de política monetária em que as diretorias mais afeitas ao assunto estariam representadas, com o apoio das Comissões Consultivas. Como o modelo não é esse, resta torcer para que o novo Comef funcione e tenha apoio e instrumentos para desempenhar o seu mandato.PÓS-DOUTOR PELA UNIVERSIDADE DE OXFORD, DOUTOR EM DIREITO ECONÔMICO (USP), É PROFESSOR DE DIREITO DO INSPER (EX-IBMEC SÃO PAULO)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.