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O papel de Levy

Por MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE
Atualização:

É com algum espanto que tenho visto comentários críticos sobre os desafios e as medidas propostas pelo novo ministro da Fazenda. Não se trata de crítica daqueles que, contrariados com o abandono da "nova matriz econômica", se sentem traídos pela presidente da República. Trata-se, ao contrário, de gente que, ao longo dos últimos quatro anos, apontou os erros em série que a equipe anterior cometia levando o Brasil à atual situação desastrosa. Qual a razão para tanto mal-estar, para tanto pessimismo? Confesso ignorância. Afinal, Joaquim Levy e sua equipe podem não ser santos milagrosos - são pessoas -, mas são os profissionais mais qualificados e competentes a formar o time que cuida da economia em muito tempo. Fala-se da dificuldade em levar a cabo o ajuste fiscal prometido, a obtenção do superávit primário de 1,2% do PIB. Não há dúvida de que o desafio é grande: a economia brasileira está estagnada, há muitos riscos em qualquer direção que se olhe. Há razões de sobra para que se tema os efeitos do racionamento tácito de água e energia que está sendo feito em partes importantes do País. Parece evidente que, se as chuvas não vierem, se os governos - a União e os Estados - não anunciarem plano para lidar com a falta d'água, a atividade econômica será duramente afetada. Em tempo: falta d'água não é um problema exclusivamente brasileiro. Como deixou claro o relatório sobre os riscos que cercam a economia mundial preparado pelo World Economic Forum, "water shortages" mundo afora, ela figura entre os principais problemas globais a serem enfrentados em 2015. Se o PIB enfermiço do Brasil for abalado pelos racionamentos, será difícil de gerar a receita que se espera das medidas anunciadas para cumprir a meta de superávit primário. Mas vale avaliar onde estávamos há pouco mais de três meses e onde estamos agora. Há pouco mais de três meses não se sabia quem ocuparia o Ministério da Fazenda nem havia indício de que o governo se dera conta dos brutais desequilíbrios da nossa economia. Há três meses ainda ouvíamos o discurso embolorado da campanha, o "não se preocupem que está tudo bem". De lá para cá, soubemos que não é bem assim que o governo pensa - e não há nada de extraordinariamente mesquinho nisso. Confesso que jamais vi um chefe de governo em campanha para se reeleger afirmar que fizera errado durante os anos em que governara. Portanto, a reviravolta de Dilma é só fato político corriqueiro, nada que deva ser levado tão a sério pelos analistas sérios - os não sérios são outra história, história bastante desinteressante, aliás. Como temos visto nos jornais e nos discursos do ministro, Levy não é só o homem encarregado de entregar ajuste fiscal ambicioso. Não é só o responsável por transformar o déficit de 0,3% do PIB de 2014 em superávit, feito que será louvado mesmo que não consiga alcançar o 1,2% do PIB. Levy é o superministro de Dilma, aquele que, além de consertar os desmandos fiscais, deverá ajudar a sanar as contas da Petrobrás para que a companhia não perca o grau de investimento - arrastando consigo os ativos brasileiros e o parco apetite do investidor internacional -, além de delinear, com sua equipe, como o Brasil fará para crescer. É por isso que Levy tem destacado os problemas da produtividade da nossa economia, fazendo coro com seu par no Planejamento - a fala de Joaquim sobre o câmbio, incorretamente interpretada pelo mercado, foi recado para quem ainda acredita que o câmbio é o nosso principal problema. Câmbio é preço; como preço, sintoma. É por isso, também, que Levy tem falado sobre abertura comercial, sobre acordos bilaterais, sobre aproximação com os EUA, na mesma linha de Armando Monteiro, ministro da Indústria e do Comércio. Os ministros de Dilma estão cantando em sintonia como há muito não se via. Talvez isso ainda não seja o suficiente para afastar os temores que rondam o País. Mas está na hora de sair da picuinha, de parar de dar corda aos "traídos". Está na hora de compreender o verdadeiro papel de Levy.*Monica Baumgarten de Bolle é economista, sócia-diretora da Galando MBB Consultoria e Global Fellow, Brazil Institute| Wilson Center

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