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O paradoxo da escolha

Para consumidores, a moderna indústria do entretenimento é um nirvana; para operadoras de TV dos EUA, nem tanto

Por The Economist
Atualização:

Para quem passa o dia inteiro grudado na TV, vive com os olhos pregados em livros, adora pegar um cineminha ou passa o dia inteiro curtindo um som, esta é uma idade de ouro. A internet oferece um cardápio quase inesgotável de opções para atender aos gostos quase infinitamente idiossincráticos da humanidade. Os smartphones puseram todo tipo de entretenimento, de clássicos do rock e programas de TV de alta qualidade a bobagens postadas no YouTube, na ponta dos dedos de bilhões de pessoas.

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A questão é que essas tecnologias têm um efeito paradoxal: embora ampliem a gama de escolhas dos usuários, concentram sua atenção nas criações mais populares e nas maiores plataformas. Seja porque o entretenimento é uma atividade social, ou porque as pessoas não sabem o que fazer diante da profusão de opções que têm à disposição, o fato é que acabam recorrendo aos rankings e aos algoritmos de recomendações de plataformas como Netflix, YouTube e Spotify para se orientar e decidir qual será a próxima dose de conteúdo a ser consumida. Por causa disso, são justamente os títulos mais conhecidos que se destacam e acabam atraindo novos usuários.

Em outras palavras, as grandes marcas continuam a prosperar. Dos milhares de filmes lançados mundialmente no ano passado, as cinco maiores bilheterias foram de produções da Disney. Na outra ponta do espectro, a “cauda longa” das criações voltadas para pequenos nichos de consumo revela-se extremamente rarefeita. No ano passado, segundo a empresa de pesquisas de mercado Nielsen, os americanos adquiriram cópias digitais de 8,7 milhões de músicas, quase 5 milhões a mais do que em 2007. Mas o número de faixas cujas vendas superaram as cem cópias manteve-se inalterado: 350 mil. E o número de músicas que tiveram uma única venda aumentou de 1 milhão para 3,5 milhões. Os artistas desconhecidos continuam penando para chegar às paradas de sucesso.

Quem ganha e quem perde com isso? Os consumidores são os maiores beneficiários. A cauda longa está aí para atender aos indivíduos de gostos mais ecléticos. Também não faltam conteúdos gratuitos, de vídeos no YouTube a alguns serviços de música por streaming. E a disputa acirrada pela atenção dos consumidores, que na indústria do entretenimento é o recurso mais escasso, levou os serviços pagos a oferecer experiências de melhor qualidade. Em nenhuma outra área esse fenômeno é tão nítido quanto na televisão. Em 2016, foram exibidos na TV americana mais de 450 programas originais, mais que o dobro dos que foram ao ar em 2010. Amazon e Netflix investem bilhões de dólares em novas produções. Para reagir a isso, as operadoras de TV a cabo, que até pouco tempo viviam confortavelmente no bem-bom de seus planos de assinatura, também estão tendo de investir.

Do lado da produção, sairão ganhando as empresas que tiverem fôlego para continuar despejando recursos em produções “premium” – o domínio da Disney nas bilheterias, por exemplo, foi garantido com a compra da Marvel, da Lucasfilm e da Pixar –, ou que tenham plataformas com grande número de usuários, como Facebook e YouTube, ou, ainda, que sejam capazes de se encarregar tanto da distribuição, quanto da criação de conteúdo, como Amazon e Netflix pretendem fazer. Essa é a lógica por trás da oferta de US$ 109 bilhões que a AT&T fez pela Time Warner em outubro do ano passado, unindo a maior operadora de TV paga dos EUA a um de seus maiores estúdios de cinema e televisão.

O princípio remoto. Por outro lado, as perspectivas não parecem animadoras para as operadoras de TV a cabo, que são o modelo de negócio mais lucrativo da história do entretenimento nos EUA. A fórmula de seu sucesso, que consistia em acrescentar cada vez mais canais aos pacotes oferecidos aos consumidores, e, assim, elevar os preços das assinaturas, já não rende frutos. Atraídos por serviços mais baratos e flexíveis, oferecidos pela internet, os americanos começaram a cortar o cabo da TV a uma taxa superior a 1 milhão de domicílios por ano (os eventos esportivos com transmissão ao vivo são um dos últimos pilares que mantêm o sistema em pé). 

O declínio da TV paga é um bom exemplo do paradoxo da escolha. É possível que as pessoas nunca tenham tido tantas coisas para assistir e escutar, mas há um limite para a quantidade de conteúdo que elas conseguem consumir. E as escolhas que os consumidores fazem acabarão por concentrar o poder nas mãos de gigantes como Disney, Netflix e Facebook. Em vez de democratizar o entretenimento, a internet deve fortalecer uma oligarquia.

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