PUBLICIDADE

O poço sem fundo

Vale salientar que a melhora dos atuais indicadores econômicos são apostas de curto prazo, que têm que ver com a mudança de governo, sobretudo com a confiança e a credibilidade da nova equipe econômica

Por Nathan Blanche
Atualização:

Têm crescido as pressões para o Banco Central (BC) afrouxar a política monetária no curto prazo, ou seja, baixar juros. Isso faz lembrar a parte inicial do segundo mandato Dilma, quando, mesmo com pressões inflacionárias ainda elevadas e em meio a sinais claros de deterioração fiscal, o Copom baixou os juros até 7,25%. Para manter os preços sob controle, a partir de meados de 2013 teve início a venda de swaps cambiais diários, que continuou até recentemente. Essa medida, entre outras que deterioraram as contas públicas e a competitividade, fez parte do conjunto de equívocos econômicos que levou à grave situação atual. Em termos fiscais, o resultado e o preço dessa heterodoxia são o fato de o superávit primário ter saído de 1,7% do PIB em 2013 para um déficit de 2,7% do PIB em 2016. Completando a deterioração gerada pela nova matriz econômica, o PIB deve acumular perdas de 7% no biênio 2015/2016. No pior dos mundos, entramos num processo de recessão forte, inflação alta e explosão do endividamento e do déficit público.

PUBLICIDADE

As pressões para repetir este populismo monetário não fazem sentido, pois isso ameaçaria colocar por água abaixo os sinais incipientes de recuperação da confiança dos agentes de mercado em relação à retomada da responsabilidade econômica. De quebra, reduziria as chances de reversão da gravíssima crise em que estamos mergulhados.

Vale salientar que a melhora dos atuais indicadores econômicos são apostas de curto prazo, que têm que ver com a mudança de governo, sobretudo com a confiança e a credibilidade da nova equipe econômica. Essas expectativas são facilmente reversíveis, se as mudanças necessárias na economia não forem implementadas no curto e médio prazos. Isso inclui a confirmação do impeachment, o encaminhamento da reforma da Previdência e de alterações nas leis trabalhistas, a aprovação do limite para o aumento das despesas públicas nas três esferas do governo e a integração do Brasil na economia globalizada, pela abertura comercial e mudanças na relação com o capital e o investidor estrangeiros. O mundo globalizado tornou-se uma montadora de produtividade e eficiência, e hoje o Brasil está fora deste jogo.

Um aspecto pouco considerado nas análises recentes foi o ganho obtido pelo governo em seu custo de financiamento, decorrente de sinais do retorno de uma política econômica responsável, a partir da perspectiva de mudança de governo - posteriormente confirmada com a escolha de equipe econômica de qualidade inquestionável.

A curva de juros, que determina em grande medida o custo de financiamento no País, cedeu bastante desde março, quando a possibilidade de troca de governo tornou-se real. Até então, a curva mostrava-se pressionada pela situação fiscal crítica e pela avaliação de que o governo Dilma não reverteria o quadro. O movimento representou uma diferença de quase 400 pontos-base nos vencimentos longos, mais sensíveis ao risco fiscal. Isso se deve não só à montagem da nova equipe econômica, mas, principalmente, aos sinais dos novos condutores de instituições, incluindo o BC, que adotou uma postura firme na defesa do cumprimento da meta de inflação. Ou seja, transmitir uma mensagem de leniência com a inflação neste momento ameaçaria esse ganho de credibilidade.

É preciso cautela com o otimismo. A trajetória crescente dos rombos fiscais levou à explosão da dívida bruta do setor público, que passou de 51,3% do PIB em 2011 para 73,7% projetados para 2016. Pior que isso, a dinâmica esperada para os próximos anos segue adversa, com expectativa de que a relação dívida bruta/PIB alcance 85% até o final da década. Vale dizer que contribuem para essa expectativa as “safenadas fiscais”, aprovadas pelo atual governo, que flexibilizam a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Portanto, sem mudanças no quadro trágico das contas públicas, cedo ou tarde, aumentará o número de avaliações de que caminhamos rumo à insolvência fiscal e consequente falência do Estado nacional. Ademais, sem essa correção de rota, será preciso esquecer a volta do crescimento sustentável por ao menos mais uma década.

Publicidade

*É SÓCIO-DIRETOR DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA INTEGRADA  

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.