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O que falta explicar na reforma

Governo divulga idade mínima e transição, mas sobram dúvidas sobre o alcance do texto que será enviado ao Congresso na próxima quarta-feira

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Por Murilo Rodrigues Alves
Atualização:

Caro leitor,

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Enfim, o presidente Jair Bolsonaro bateu o martelo sobre a reforma da Previdência. Pelo que foi divulgado, o texto que o governo vai enviar este mês ao Congresso ficou no meio do caminho entre a proposta “aditivada” defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, a quem ele chama de Posto Ipiranga, e uma versão bem mais suave, que o próprio presidente queria.

O Estadão/Broadcast antecipou a proposta de Guedes – que foi confirmada por várias fontes do governo, inclusive o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho. Mesmo com os argumentos da equipe econômica, o presidente preferiu uma versão um pouco mais branda, mas com “gordura” para ser queimada no Congresso nas negociações com deputados e senadores. Ainda mais neste momento em que o governo está em meio a uma crise política.

Guedes conseguiu emplacar uma proposta com economia de R$ 1,1 trilhão em dez anos. A versão original previa uma economia maior, de R$ 1,4 trilhão. Resta saber como vai ficar depois das mudanças que serão feitas pelos parlamentares.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, deixa o Palácio da Alvorada após reunião com o presidente. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O que foi divulgado até agora?

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  1. Idade mínima: será de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.

Hoje, não há idade mínima para se aposentar no Brasil porque ainda há a possibilidade de pedir o benefício pelo tempo de contribuição. Para isso, basta ter 35 anos (no caso dos homens) e 30 anos de contribuição (mulheres).

No ano passado, quem solicitou ao INSS aposentadoria por tempo de contribuição tinha em média pouco mais de 54 anos e conseguiu um benefício de quase R$ 2 mil. Já os segurados que solicitaram o benefício por idade (pela regra atual, é necessário que o homem tenha 65 anos e a mulher, 60 anos) tinha em média 61 anos e recebeu R$ 969.

  1.   Tempo de transição: 10 anos para homens e 12 anos para mulheres.

O governo não explicou oficialmente como vai ser a transição na aposentadoria por tempo de contribuição, mas o Estadão/Broadcast apurou que o trabalhador vai poder optar por três caminhos (o que lhe for mais vantajoso):

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a) por uma regra em que a idade mínima começa 56 anos para mulheres e 60 anos para homens e sobe gradualmente até atingir 62 anos para mulheres e 65 anos para homens;

b) por um sistema de pontos (em que é preciso somar idade e tempo de contribuição);

c) ou pelas regras atuais (30 anos de contribuição para mulheres e 35 anos de contribuição para homens) nos dois primeiros anos de vigência da reforma, mas com um valor de aposentadoria menor.

E o que o governo ainda não detalhou da reforma?

  1.       Benefícios assistenciais para idosos e pessoas com deficiência vão ficar abaixo do salário mínimo?

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Esse é um dos pontos mais polêmicos. O desejo da equipe econômica é que o benefício assistencial (que é difrente de aposentadoria) comece com R$ 500 para todos que comprovarem “miserabilidade” aos 55 anos. Depois das críticas, o governo correu para dizer que a inspiração é internacional. A reportagem do Estadão apurou que Bolsonaro chancelou esse tipo de benefício, mas os valores não foram divulgados.

  1.     Como vão ficar as exigências para o trabalhador rural se aposentar?

Em meio a um embate entre os Ministérios da Economia e Agricultura por corte em subsídios do crédito rural e protecionismo para os produtos brasileiros, as exigências para os trabalhadores rurais têm potencial de dividir ainda mais o governo e serem barradas no Congresso. O desejo da equipe econômica era exigir 60 anos de homens e mulheres. O que o Bolsonaro definiu? Da última vez, ele ficou do lado da ministra Tereza Cristina, que em entrevista ao Estadão já tinha criticado essas idades.

  1.      Como a reforma atingirá os servidores públicos?

Não ficou claro se as idades mínimas também serão a regra para os servidores públicos nem qual será a transição. Os funcionários públicos que ingressaram depois de 2013 contribuem até o teto do INSS (R$ 5,8 mil atualmente). Se quiserem receber uma aposentadoria maior, precisam contribuir para um fundo de pensão. Os que ingressaram antes de 2003 têm direito a se aposentar com o último salário da carreira (a chamada integralidade) e a aos mesmos reajustes da ativa (paridade). Nove de cada dez servidores do Executivo que poderão pedir aposentadoria neste e no próximo ano têm direito a esses benefícios.

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Bolsonaro deixou no texto a proibição de que a União banque o rombo da aposentadoria dos funcionários públicos?

  1.     Qual será a regra para professores, militares, policiais federais e políticos?

Na proposta da equipe econômica todas as categorias tinham sido incluídas, sem exceção. Professores públicos se aposentariam aos 60 anos (homens e mulheres); policiais, aos 55 anos (ambos os sexos); e políticos, aos 65 anos. Para os militares das Forças Armadas, seria criada uma alíquota que não poderia ser menor que a cobrada no INSS (de 8% a 11% do salário). Hoje, eles pagam 7,5% para financiar o pagamento de pensões. Tudo isso ficou no texto ou o presidente barrou algo?

  1.      Será proibido o acúmulo de benefícios?

A equipe econômica defende que seja vedado o recebimento de mais de uma aposentadoria em um mesmo regime (INSS ou servidores), a não ser no caso de funcionários públicos que podem acumular cargos. No caso de recebimento de mais de uma pensão, ou de pensão e aposentadoria, seria assegurado recebimento do valor integral do maior benefício e uma parte dos restantes. Essa restrição ficou no texto ou o presidente a retirou?

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Como se vê, apesar do anúncio de dois pontos importantes do texto, há ainda muitas dúvidas que precisam ser esclarecidas pelo governo até a próxima quarta, dia 20, quando o texto será encaminhado ao Congresso. O endurecimento das regras é apontado por todos os especialistas como condição necessária para a sustentabilidade das contas públicas. Só no ano passado, o rombo do INSS beirou os R$ 200 bilhões.

Mas não basta a comunicação oficial propagar que é uma “Nova Previdência” para retirar o termo reforma do caminho. Ou que os ministros digam que a proposta tem um “olhar fraterno” para os pobres.

Para ter a opinião pública a favor da reforma, é preciso explicar, em detalhes, todos os pontos do texto para que fique exposta a “cota de sacrifício” de cada um.

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