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O TCU e os atrasos do setor elétrico

Por CLAUDIO J. D. SALES E RICHARD LEE HOCHSTETLER
Atualização:

A Aneel, agência reguladora do setor elétrico, acaba de adiar um importante leilão de linha de transmissão em razão de questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU). Embora esteja exercendo seu importante papel fiscalizador, neste caso o TCU promoveu uma intervenção desconectada da realidade. O questionamento do TCU surge do fato de que o preço-teto admitido no leilão para a construção e a operação da nova linha de transmissão é superior ao da outra linha licitada no início do ano passado para escoar a energia da Hidrelétrica Belo Monte. Há várias razões para essa diferença de custos. A linha a ser licitada agora terá 2.518 km, 426 km a mais do que a linha anterior, em área próxima aos grandes centros, onde a faixa de servidão pública tende a ser mais cara. O contexto econômico também explica a alteração de custos. A licitação da outra linha ocorreu em fevereiro de 2014. Desde então, a taxa de câmbio desvalorizou-se em mais de 30%, elevando o custo, em reais, tanto dos componentes importados quanto dos que são balizados pelo preço de commodities internacionais. Além disso, a redução de financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de 75% para 50% dos investimentos, forçará os empreendedores a recorrer a financiamentos mais caros. Finalmente, há o aumento do custo do capital próprio considerado pela Aneel. Essa alteração decorre principalmente de alteração metodológica para melhor refletir o risco enfrentado na fase de construção das instalações de transmissão. Nesta fase pré-operacional, o risco se assemelha ao de empresas do ramo de construção pesada, razão por que se optou por utilizar o beta (variável que reflete o risco da atividade) de empresas desse ramo no modelo Capital Asset Pricing Model. Todas essas revisões foram efetuadas pela Aneel após minuciosa análise, documentada em notas técnicas, num processo aberto e transparente que incluiu duas audiências públicas: uma para discutir alterações metodológicas (AP 008/2015) e outra para discutir a minuta de edital deste leilão (AP 016/2015). Por que o TCU não pode fazer a sua análise junto com todos os outros agentes durante o processo de audiências públicas? Essa intervenção intempestiva do tribunal posterga o leilão, agravando os atrasos. O irônico é que o TCU sabe quanto esses atrasos custam ao País: no ano passado, o mesmo TCU estimou o prejuízo devido a atrasos de empreendimentos elétricos em R$ 83 bilhões. Além de solicitar informações já publicamente disponíveis, o TCU recomenda que o custo das estações conversoras (um dos principais componentes das instalações a serem construídas) seja baseado no menor preço da pesquisa de mercado. Isso não é apropriado, pois há diferenças na especificação, na qualidade, nas condições de compra e na logística que não são captadas nas pesquisas de mercado. É por isso que o critério adotado pela Aneel, baseado nos custos médios, é o mais adequado. Isso tudo é só para definir o preço-teto no leilão, do qual sairá como vencedor o proponente que oferecer a menor Receita Anual Permitida (RAP). Portanto, havendo confiança no marco legal e regulatório, a competição disciplinará os preços. É por isso que é importante que o preço-teto atraia agentes suficientes para assegurar a concorrência no leilão. O governo vem tendo dificuldades para licitar novas linhas de transmissão: em 2012 houve 3 lotes sem interessados; em 2013 foram 10 lotes; e em 2014 foram 12 lotes. O problema, hoje, não é o retorno elevado. Pelo contrário, é a falta de atratividade dos empreendimentos. O TCU deveria ter um olhar crítico sobre a sua própria atuação e avaliar as consequências de suas intervenções. O foco desmesurado no preço-teto e suas atuações intempestivas agravam os atrasos, comprometem a confiabilidade e elevam o custo de suprimento futuro de energia elétrica no País.* São, respectivamente, presidente e economista do Instituto Acende Brasil. Site: www.acendebrasil.com.br

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