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O triunfo da Opep

Por Robert J. Samuelson
Atualização:

Durante boa parte de seus 47 anos de existência, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) foi um cartel só de nome. Ela não podia controlar os preços do petróleo porque muitos de seus membros quebravam regularmente as cotas de produção que visavam a regular o mercado. Assim, a Opep acompanhou as altas e baixas dos preços do petróleo na esteira das mudanças da oferta e da procura. Agora, porém, a Opep pode ser a coisa de verdade: um cartel que funciona. Se isso acontecer, será uma má notícia para o resto do mundo. Basta observar a reunião da Opep na semana passada, em Viena. Os ministros do petróleo se recusaram a aumentar a produção, apesar das razões consideráveis para isso. Não só os preços do petróleo estavam oscilando acima de US$ 100 o barril como os Estados Unidos ou já estão nela ou estão perto de uma recessão. Ao mesmo tempo, boa parte do resto do mundo enfrenta uma desaceleração econômica. O errado é que uma queda nos preços do petróleo é um dos mecanismos capazes de permitir a autocorreção de uma recessão ou desaquecimento econômico. Preços mais baixos de gasolina, óleo para aquecimento e diesel melhoram o poder de compra do consumidor. Eles seguram a inflação e aumentam a confiança. Nesse sentido, são um importante "estabilizador automático" para uma economia em dificuldade. Os produtores de petróleo não ligam muito para isso. Os preços altos têm sido bons para eles. De 1999 para cá, a receita anual de petróleo de países da Opep mais que quadruplicou, para estimados US$ 670 bilhões em 2007, segundo o economista de energia Philip Verleger Jr. O que está menos claro é se a Opep meramente se beneficiou dos mercados apertados de petróleo ou se agiu com um verdadeiro cartel, restringindo a produção e elevando os preços. A resposta é: ambas as coisas. Dos mercados apertados, não há muita dúvida. Dois erros de cálculo pesados em petróleo ajudaram a Opep. O primeiro foi a subestimação generalizada da demanda mundial, especialmente a da China. Desde 1999, o consumo de petróleo pela China quase dobrou, chegando a 7,5 milhões de barris por dia em 2007. O consumo mundial no mesmo ano foi de 86 milhões de barris por dia, 13% acima do de 1999. O consumo americano de petróleo foi de 20,8 milhões de barris por dia, aumento de 7%. O segundo erro foi uma superestimação da oferta. Guerras, disputas civis e nacionalizações reduziram a produção em países como Iraque, Nigéria, Irã, Venezuela e outros. A capacidade global total poderia ser de 4,5 milhões de barris por dia superior sem esses percalços, segundo a Energy Policy Research Foundation. Mas isso é apenas metade da história. No fim de 2006, os preços do petróleo bruto tinham caído de cerca de US$ 70 o barril, em agosto, para US$ 50. Um verdadeiro cartel teria cortado a produção para segurar os preços. Foi isso que a Opep fez. Em duas etapas, ela reduziu a produção de petróleo em cerca de 800 mil barris por dia, conforme observa o economista Larry Goldstein, da fundação. "Em julho, 125 milhões de barris tinham desaparecido dos estoques de petróleo", diz ele. No fim de 2006, os estoques (medidos em dias de suprimento) estavam em seu ponto mais baixo em três anos. Os preços subiram. O poder de mercado presente da Opep remonta ao início de 1999, diz Verleger. Os preços do óleo estavam então em cerca de US$ 10 por barril. A crise financeira asiática de 1997-98 havia derrubado a demanda; a oferta era fundamentalmente desregulada. A Arábia Saudita entabulou negociações frenéticas com outros grandes produtores, incluindo Irã, Kuwait, Venezuela e países não integrantes da Opep, como Rússia, Noruega e México. O resultado foi um acordo para reduzir fortemente a produção. A obediência às cotas de produção foi surpreendentemente boa; países ficaram apavorados com o colapso de sua receita de petróleo. Hoje estamos pagando por nossa miopia passada. A dependência de importações de petróleo, agora em quase 60% do abastecimento americano, é inevitável. Mas poderíamos limitar o poder de mercado da Opep diminuindo nossa demanda e aumentando nossa oferta. Com o aumento da diferença mundial entre oferta e demanda, é mais difícil os produtores controlarem o mercado. Quanto mais capacidade ociosa eles tiverem, mais ficam tentados a elevar a produção para aumentar a receita, em especial a Arábia Saudita, que pode ajustar a produção para influenciar os preços. Os americanos vociferam contra produtores estrangeiros na tola presunção de que eles deveriam subordinar seus interesses aos nossos. Mas nós nos recusamos a fazer muito do que realmente limitaria a liberdade de ação deles. Foi somente no ano passado que o Congresso elevou as normas sobre consumo de combustível de carros e caminhões leves novos. Também rejeitamos firmemente impostos mais altos sobre a gasolina para diminuir o uso desnecessário de veículos e fortalecer a demanda por veículos com eficiência de combustível (melhor taxar a nós mesmos que deixar que estrangeiros nos taxem com preços mais altos). E reduzimos consistentemente a exploração de petróleo no Alasca e alhures. Fazendo tão pouco para conter a sua sede por importações, os Estados Unidos contribuíram para o atual triunfo da Opep. A extensão desse triunfo será testada neste ano e no próximo. Os fornecimentos de petróleo de países não integrantes da Opep - Brasil, Canadá e Casaquistão, entre outros - aumentarão. Até mesmo a Opep poderá ser incapaz de sustentar os preços nos altos níveis vigentes. Aconteça o que acontecer, a ameaça de longo prazo de um cartel mundial do petróleo persistirá. Precisamos dar os difíceis passos capazes de limitar seu poder. Considerando nossa complacência passada, provavelmente não o faremos. *Robert J. Samuelson escreve para ?The Washington Post?

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