PUBLICIDADE

O uso de medidas flexíveis nas crises

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Apresentei ontem os resultados de uma pesquisa que compara as soluções que Alemanha e Brasil adotam nas crises que ameaçam destruir empregos.São dois países bastante diferentes. A Alemanha produz e exporta bens de alta tecnologia. O Brasil produz e exporta (predominantemente) bens de baixo valor agregado. Na Alemanha, a força de trabalho tem, em média, 13 anos de boa escola. No Brasil, são 7 anos de má escola. A renda per capita dos alemães (medida em poder de compra) é de 29.200 anuais. A do brasileiro equivale a 7.800. Entre nós, a desigualdade é imensa. Entre os alemães, é mínima. O sistema de relações do trabalho da Alemanha se baseia na negociação, no entendimento e nas condutas construtivas. O do Brasil, em legislação, desconfiança e ações judiciais.A despeito de todas essas diferenças, a pesquisa mostrou que empregadores e empregados que usam medidas flexíveis nos momentos de crise se dão bem; os que não as usam se dão mal. Em outras palavras, o uso adequado dessas medidas preserva os talentos e mantém as pessoas trabalhando. A rejeição destrói o capital humano e põe as pessoas no desemprego (Werner Eichhorst, Paul Marx e José Pastore, O uso de medidas flexíveis para lidar com crises econômicas na Alemanha e no Brasil, São Paulo: Fecomércio, 2011).Esses foram os resultados encontrados nos dois países durante a crise de 2008-2009. A utilização do banco de horas, da redução de jornada e de salário, da suspensão temporária dos contratos de trabalho (lay off) e de outras medidas flexíveis permitiram às partes superarem as dificuldades, mantendo o mesmo capital humano e os mesmos empregos.Mas notou-se uma importante diferença. Na Alemanha, essa prática faz parte do cotidiano. Na crise de 2008-2009, foram insignificantes os casos de rejeição de medidas flexíveis. No Brasil, foi praticamente a exceção. Poucos usaram tais expedientes. Consequência: no curto período de novembro de 2008 a fevereiro de 2009, foi destruído mais de 1 milhão de postos de trabalho. Por sua vez, os que fizeram uso da (pouca) flexibilidade existente salvaram muitos empregos.Ao aprofundar o exame das diferenças entre as empresas brasileiras que usaram e as que não usaram medidas flexíveis, encontramos o seguinte quadro. Muitas empresas nem consideraram o seu uso, temendo que os acordos viessem a ser anulados pela Justiça do Trabalho, o que já aconteceu no Brasil e jamais aconteceria na Alemanha. Lá, o negociado é sagrado e respeitado. A Justiça não tem alçada para desfazer o que as partes consideram adequado. No Brasil, as leis são rígidas, inflexíveis e sujeitas a interpretações oscilantes dos magistrados, que, muitas vezes, anulam cláusulas de acordos negociados.Outras empresas tentaram usar o que dispõe a lei, mas recuaram por não contarem com o apoio dos sindicatos laborais, o que também não ocorre na Alemanha, onde na maioria das empresas há uma parceria construtiva. No Brasil, o preço da rejeição foi alto, com dispensas devastadoras. Houve empresas que despediram milhares de empregados em um só dia.A pesquisa focalizou, porém, os casos em que as partes se puseram de acordo e negociaram medidas flexíveis. Em todos eles, foi salva uma grande quantidade de postos de trabalho e preservado o mais precioso capital das empresas: seus colaboradores. Para essas empresas, tudo foi mais fácil na retomada de 2009.Apesar de resultados tão evidentes, a flexibilização no Brasil ainda gera muitas resistências. Entre nós, esse termo virou um palavrão. Na Alemanha, é medida de salvação.Espero que a atual crise da Europa não chegue ao mercado de trabalho do Brasil. Mas, se chegar, convém lembrar que o bom senso, a negociação e o entendimento podem mitigar os estragos de uma eventual recessão.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.