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Os centavos que faltam para a educação

Por Claudio Bernardes
Atualização:

O tempo passou, mas as vozes que dominaram as ruas do País em junho continuam ecoando em nossos ouvidos e, principalmente, em nossa consciência.O governo tenta responder ao clamor popular anunciando medidas como a realização de um plebiscito para promover a esperada reforma política, iniciativa que não teve apoio da população e menos ainda dos parlamentares. Nada surpreendente. Tal reforma, há anos pleiteada para conferir novos rumos ao País e fortalecer a democracia, é fundamental, mas o calor das eleições não oferece as melhores condições para discutirmos, com a necessária serenidade, matéria tão relevante.Quanto à corrupção, outra questão levantada nas ruas, discute-se a eficiência de propostas como tipificá-la como crime hediondo. Sem dúvida, se não for esta, alguma ação contundente deve ser adotada. Mas o mais importante é que esses movimentos tenham o condão de promover em todos nós as transformações interiores que nos farão mudar de comportamento em relação à coisa pública, aos padrões de ética e moral e ao cumprimento estrito das regras que organizam a sociedade.No que diz respeito à saúde, a proposta governamental de importar médicos ou adicionar dois anos (dedicados ao SUS) aos cursos de Medicina destoa de uma realidade em que há hospitais e postos de saúde sem a mínima infraestrutura para funcionar. Por outro lado, talvez seja uma ideia positiva tomar como norma que todos os que estudam em universidades públicas (não só estudantes de Medicina) devolvam à sociedade, em trabalho para a comunidade, o benefício recebido.Evidencia-se que respostas satisfatórias ao clamor das ruas ainda são aguardadas. Dentre elas, talvez a de maior valor para o nosso desenvolvimento esteja relacionada à estruturação do modelo educacional no País.O Brasil se destaca mundialmente em razão de seu déficit educacional. Segundo ranking elaborado em 2011 pela Unesco, organismo da ONU dedicado à cultura e à educação, ocupamos o 88.º lugar no rol de 127 países. Estamos atrás de Equador, Bolívia e El Salvador, por exemplo.É claro que houve melhorias. O Relatório de Monitoramento Global mostra como exemplar nosso programa de combate ao analfabetismo. Embora ainda haja cerca de 14 milhões de pessoas que não sabem ler e escrever, o Brasil foi um dos países que mais aumentaram seus investimentos em educação. Outro exemplo: entre as melhores universidades do mundo com menos de 50 anos, o País aparece em 28.º lugar com a Unicamp, segundo levantamento divulgado este ano pela publicação inglesa Times Higher Education.Mas o que dizer do ensino fundamental? Recentemente, em visita à Coreia do Sul, foi possível avaliar o quanto estamos distantes de uma política de educação eficaz. Para começar, lá o professor é bem remunerado, capacitado e respeitado. O governo local investe maciçamente no ensino (5% do PIB, ou US$ 47 bilhões, conforme dados do Banco Mundial de 2009), especialmente na formação dos mestres e na melhoria da estrutura das escolas. Todos os alunos, sem exceção, estudam em período integral, de 8 horas, e não raro têm ações educativas complementares depois das aulas, o que estende o processo de aprendizagem. Lá se privilegiou a educação primária, e só quando esta se tornou universal o governo passou a destinar recursos ao segundo e ao terceiro graus. A opção pela educação garantiu formação cultural e competitividade. Hoje, o país, que até 1960 era um dos mais pobres do planeta, figura como a 15.ª economia mundial, exportadora de tecnologia de ponta.Quando é que o Brasil vai de fato cuidar do ensino? Há dois anos tramita no Congresso a proposta de aumentar o valor destinado à área, uma das metas do Plano Nacional da Educação. Mais recentemente, foi aprovado o direcionamento de recursos dos royalties do petróleo. Mas até quando a sociedade ficará esperando os centavos que faltam para a educação?*Claudio Bernardes é presidente do Secovi-SP, o sindicato da habitação, e reitor da Universidade Secovi.

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