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Os portos e a confusão de objetivos

Por Benedicto Fonseca Moreira
Atualização:

É conhecida a nossa capacidade de perder tempo, energia e recursos com discussões em que o acessório prevalece sobre o principal. No passado, enquanto se discutia o aumento da tripulação nos navios mercantes brasileiros, no exterior se promovia a sua redução pela introdução de novas tecnologias e se ampliavam as frotas, tendo como resultado o crescimento da marinha mercante mundial, gerando mais empregos. A brasileira encolheu e foi sucateada, com perda de empregos, e a cabotagem irá pelo mesmo caminho se o governo não entender que merece tratamento particularizado, por sua importância no comércio e no abastecimento inter-regional e pela base de sustentação para o retorno à navegação de longo curso. Os portos seguem a mesma rota ou talvez pior. Na navegação, os exportadores ainda têm a opção de utilizar navios de bandeira estrangeira, embora em proporção superior à que o bom senso indicaria, pois 96% do valor das nossas vendas externas sai por via marítima. A busca por vantagens competitivas no comércio mundial, em todos os países, estimula pesados investimentos na modernização dos portos e adoção de formas de administração voltadas para a eficiência e a eficácia, necessárias à maior produtividade e redução nos custos. Por outro lado, a evolução dos preços do petróleo tornou obrigatória nova equação para a relação porto-navio. A alternativa tem sido construir navios com maior capacidade de carga por viagem (meganavios), com tecnologia que aumente a segurança e a velocidade e com menor número de tripulantes. Quanto mais rápida a viagem, menores os custos, maior a competitividade das mercadorias e, portanto, o domínio de mercado. Em vez de buscar a eficiência portuária, no Brasil perdeu-se dez anos discutindo uma Lei dos Portos, quando deveria ter sido aprovada uma "Lei do Comércio Exterior", em que porto e navegação entrariam como parte da ação estratégica externa. A Lei dos Portos não é má em si, mas cedeu à tradição do excesso de definições, autorizações prévias e outros cacoetes nacionais. Seguiu-se, por óbvio, a criação de agência para regular a atividade aquaviária (Antaq), que passou a conflitar com o Ministério dos Transportes, antigo "dono" do pedaço. Descobriu-se, em seguida, que os portos brasileiros eram deficientes e não atendiam às necessidades de competição externa. A "nova" solução foi criar a Secretaria Especial de Portos com status de Ministério. A criação de órgão gera também a necessidade de "mostrar" serviço, redundando em mais regulamentação. Por outro lado, determinou compatibilizar o Ministério dos Transportes, que ficou com o transporte fluvial, a Antaq, com a regulação e fiscalização do transporte marítimo e da infra-estrutura portuária, e a Secretaria de Portos, com a "política" portuária e de navegação. Por fim, foi baixado aparatoso decreto sobre dragagem para completar o imbróglio. Recentemente foi publicado decreto para tentar "regulamentar" o que, em realidade, é uma briga empresarial entre os que querem investir para ampliar e modernizar portos e os que querem manter limites operacionais conquistados. O governo está no meio do tiroteio, sem saber de onde vem a bala perdida. O curioso é que o porto está se consolidando como um fim em si mesmo. Um acessório maior que o principal: o comércio exterior. Ninguém perguntou para que serve o porto, o navio e qual o objetivo estratégico do País. Política portuária é de interesse prioritário dos usuários - produtores, importadores, exportadores e transportadores - responsáveis pelo abastecimento do País, base da política de combate à inflação, e pela exportação, que garante tranqüilidade nas contas externas. O Brasil está, outra vez, na contramão na competitividade mundial, que deverá ser acirrada nesse quadro de crise mundial, que também aqui aportou. Cabe ao governo atentar para a necessidade de preservação do desenvolvimento econômico e social, para o que baixar custos internos e ampliar exportações são medidas determinantes. Os portos brasileiros estão inadequados e superados, caros e deficientes; os investimentos são insuficientes e morosos; o sistema de administração estatal é inoportuno e ineficaz; e a "regulamentação", um emaranhado jurídico, burocrático, cartorial e político. Não vai dar certo para o País, apenas para alguns privilegiados. *Benedicto Fonseca Moreira é presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB)

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