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''''PAC é um pequeno alívio temporário''''

Juan José Daboub: Diretor-gerente do Banco Mundial[br]Diretor-gerente do Bird afirma que o Brasil precisa vencer desafios para conseguir crescer como a Índia e a China

Por Lu Aiko Otta e BRASÍLIA
Atualização:

O Brasil ainda tem desafios a superar antes de atingir taxas de crescimento semelhantes às de seus concorrentes mais diretos, como China e Índia. Garantias quanto ao suprimento de energia elétrica, melhoria nos marcos regulatórios e um melhor monitoramento sobre os efeitos dos gastos públicos estão entre elas, segundo avaliou ao Estado o número dois do Banco Mundial (Bird), o diretor-gerente Juan José Daboub, responsável pelo relacionamento do organismo com o grupo chamado Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). Ele reconhece que os países de renda média como o Brasil têm acesso ao mercado financeiro global e por isso não precisam de dinheiro - que foi o eixo do relacionamento do País com o organismo multilateral até há poucos anos. O que o Banco Mundial tem a oferecer para o Brasil, mais do que empréstimos, é o conhecimento acumulado por seu corpo técnico a partir da experiência de outros países. A instituição quer estimular o Brasil a compartilhar o conhecimento de ponta que tem em áreas como agricultura e biocombustíveis. A seguir, os principais trechos da entrevista. Os Brics continuarão sendo o motor para o crescimento mundial em 2008? As expectativas continuam positivas. Muitos dos países de renda média conseguiram fortalecer seus sistemas financeiros e fiscais, de tal forma que se, por exemplo, a situação dos Estados Unidos colocar alguma dificuldade, seu efeito agora será menor do que há dez anos. Isso se aplica a muitos países do mundo. Nesse sentido, as projeções que o banco fez se mantêm. A China segue crescendo entre 10% e 11%, a Índia cresce a 8%, o México cresce mais ou menos no mesmo nível do Brasil, um pouco mais alto. Por que o Brasil é o que cresce menos entre os Brics? É preciso ver como essas economias estão crescendo e fazer o que for apropriado para melhorar o crescimento do Brasil. Há um plano de governo, o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que pretende caminhar nessa direção. Na medida em que nos solicitem, estaremos à disposição para colaborar. Mas o PAC é suficiente para colocar o Brasil no mesmo nível dos demais Brics? É difícil fazer algo que resolva tudo de uma vez e de forma sustentável. O PAC é um pequeno alívio temporário, mas é preciso pensar no futuro. O Brasil tem conseguido trabalhar muito bem em seu desenvolvimento econômico e social em harmonia com o meio ambiente. Há desafios importantes a serem solucionados para que o crescimento seja sustentável e cada vez mais alto. Estamos lutando muito para que Doha chegue a um final feliz, que cremos que beneficiará muitos países em vias de desenvolvimento, como é o caso do Brasil. Quais são os principais desafios, na sua avaliação? Estamos discutindo com o governo brasileiro um programa para os próximos quatro anos que leva em conta justamente o fortalecimento institucional, o fortalecimento de entes reguladores, a eliminação de obstáculos para que possa haver mais e melhores investimentos do setor privado para que eles gerem empregos. Os empregos são a solução da pobreza. O que impede um crescimento mais forte dos investimentos privados no Brasil? O tempo que se leva para abrir uma empresa e para solucionar disputas em contratos tem de ser um pouco mais ágil. O planejamento para suprir as necessidades de energia para os próximos dez anos tem de ser claro e conhecido, para que os investidores digam: "vou investir". E, o que é importante, o Brasil tem desenvolvido muito conhecimento em áreas como agricultura, biocombustíveis, algumas áreas tecnológicas. Queremos convidar o Brasil para que as compartilhe com outros países no Oriente Médio, África, Ásia. O Brasil é um líder em respeito ao meio ambiente e está muito consciente dos fatores que provocam a mudança climática. Na próxima semana, em Bali, estaremos promovendo dois instrumentos financeiros que ajudam a compensar os serviços sociais que o Brasil presta ao mundo. Que mecanismos? Mecanismos de mercado. São fundos, é dinheiro disponível para que governos e setor privado possam trocar oxigênio por carbono. Já existe um mercado de créditos de carbono. É algo diferente? Procuramos criar novos mecanismos que sejam mais acessíveis e mais profundos, e tenham mais recursos disponíveis. Há alguma estimativa de recursos? Já há três países colocando recursos, mas isso vamos saber na próxima semana. O Brasil vai estar presente nesse evento e é uma voz muito forte e positiva sobre esse assunto. Essa tecnologia agrícola que o País será estimulado a compartilhar com a África e Oriente Médio é relativa a biocombustíveis? Não unicamente, mas também sobre como usar mais eficientemente a terra, como produzir com maior valor agregado com a agroindústria, como integrar as cadeias de produção com as de comercialização e venda e como sua pesquisa e desenvolvimento. Eu gostaria de uma avaliação sua sobre o ímpeto reformador do governo brasileiro. Até o momento, não foi encaminhada uma proposta de reforma trabalhista, tampouco a previdenciária. O quão ruim é isso? O Brasil fez algumas coisas bem e reconhece que ainda tem objetivos a perseguir. Esses objetivos passam por manter a estabilidade macroeconômica do País e continuar melhorando o ambiente para o investimento estrangeiro, que no ano passado foi recorde, US$ 35 bilhões. Ao mesmo tempo, é preciso melhorar os processos burocráticos, monitorar melhor o impacto da utilização dos recursos públicos e fazer mais eficiente o uso do orçamento - isso é algo com o que estamos colaborando. O Banco Mundial quer mudar seu relacionamento com os países de renda média. Como isso será feito? Como será a parceria com o Brasil? Trabalhar com países de ingresso médio é uma situação em que o país ganha e o banco ganha, porque podemos levar as experiências desses países a países que estejam mais atrasados. Há mais ou menos 30 dias, o banco baixou suas taxas de juros basicamente ao nível da Libor. Para dar uma resposta mais rápida aos clientes, o banco conseguiu reduzir o prazo de aprovação dos investimentos adicionais a projetos em andamento de 18 meses para oito meses e o custo de preparação de uma operação de quase US$ 450 mil a menos de US$ 50 mil. Isso libera recursos de tempo, pessoas e dinheiro para dedicar aos países. Além disso, os países de renda média assim o são porque trabalharam nos últimos 20, 25 anos de maneira muito consistente em um programa de reformas. Por isso, têm acesso aos mercados. Então, o que o banco pode oferecer, mais do que dinheiro, é conhecimento e experiências de outros países. Como entra o PAC nessa estratégia? Estamos nesse momento em diálogo com o governo que nos permitirá desenvolver o que nós, internamente, chamamos de estratégia de país, para os próximos quatro anos: 2008 a 2011. O PAC ocupa um lugar muito especial nessa estratégia. O banco está na melhor disposição de caminhar junto do governo para ajudar que a ambição se faça realidade com uma implementação oportuna e eficiente, que se traduza em melhores serviços para as pessoas e melhor ambiente para que o setor privado seja competitivo. Nesse esforço, o banco quer ajudar no que nos for solicitado. O Banco Mundial vê o Banco do Sul como possível concorrente? São duas coisas diferentes. O Banco do Sul fica no sul. O Banco Mundial é mundial, vê os temas globais. Por seu conceito global, o Banco Mundial pode tratar de temas como a mudança climática, Aids, gripe aviária, e isso é uma vantagem comparativa que o diferencia dos bancos regionais. O que podemos dizer é que, para que um banco regional seja exitoso, a utilização de seus recursos deve ser muito transparente. Esperamos que os países que tenham decidido embarcar nesse projeto tirem o proveito adequado. Não seria possível uma cooperação com o Banco Mundial? Estamos trabalhando muito próximos aos bancos regionais que já existem, o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Banco Centroamericano de Integração Econômica, o Banco de Desenvolvimento da África, o Banco de Desenvolvimento da Ásia. Assim fazemos porque há interesse comum de capitalizar, multiplicar os recursos disponíveis para países. Se, quando o Banco do Sul estiver funcionando, houver interesse em criar um tipo de relação como a que já existe com outros, vamos discutir. Quem é: Juan José Daboub É diretor-gerente do Banco Mundial, sendo responsável pelo relacionamento da instituição com 74 países. Antes de ingressar no banco, em junho de 2006, foi ministro das Finanças e chefe da Casa Civil de El Salvador. Engenheiro industrial, tem mestrado e doutorado pela Universidade Estadual de Carolina do Norte (EUA).

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