BRASÍLIA - Na tentativa de destravar a oferta ao crédito e acelerar o crescimento da economia em ano de eleições, o governo Bolsonaro lançou um novo pacote de medidas para renovar em R$ 87 bilhões as linhas de empréstimos para Microempreendedores Individuais (MEIs), micro, pequenas e médias empresas, além de habitação popular.
O pacote, que foi batizado de “Crédito Brasil Empreendedor”, saiu abaixo dos R$ 100 bilhões previstos inicialmente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, mas a equipe econômica diz que o segundo semestre será de crescimento mais robusto do que o esperado pelos analistas do mercado financeiro no rastro das novas medidas.
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A expectativa do Ministério da Economia é que em 45 dias a 60 dias as linhas já poderão ser oferecidas pelos bancos. É justamente quando a campanha eleitoral já deverá estar em ritmo mais forte com as definições das candidaturas. O pacote renova as linhas de crédito lançadas durante os dois anos da pandemia da covid-19 (2020 e 2021) sem a cobrança do Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF).
Uma medida provisória (MP) do crédito foi editada nesta segunda-feira, 25, mas o governo ainda espera uma última votação no Senado de projeto que estende a vigência do Pronampe (linha para micro e pequenas empresas), carro-chefe do pacote com potencial de gerar R$ 50 bilhões em novos créditos.
A taxa média de juros esperada das linhas é entre 1,5% e 1,75% ao mês e máxima de 2,8%. A maior parte do dinheiro a ser movimentado por todas essas medidas será dos bancos. Hoje, a principal dificuldade dos empreendedores para terem acesso ao crédito é a falta de garantias. O governo federal bancará essas garantias como forma de destravar a oferta pelos bancos. O prazo de carência vai variar entre seis meses e um ano, e prazo de pagamento entre 12 e 60 meses.
Novas medidas
Com o argumento de que as medidas podem dar um salto no crédito, o governo conta outros 14 novos instrumentos financeiros criados recentemente para dar fôlego às empresas e permitir um aumento do volume de financiamentos e dos investimentos.
O Estadão apurou que as novas medidas já começarão a ser estudadas também para ampliar os instrumentos financeiros. Uma delas é criar um mercado de recebíveis para os precatórios (dívidas que precisam ser pagas depois de determinações judiciais).
Hoje, esse mercado é restrito às negociações entre pessoas físicas, que detém o crédito do precatório e os compradores interessados em adquiri-lo com deságio, além de fundos que compram essas dívidas do governo. O governo também quer estimular ainda mais a modalidade de saque-aniversário do FGTS, que já conta com R$ 25 bilhões em crédito concedidos.
Os 14 instrumentos são os seguintes:
- FI-AGRO Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), que facilita que investidores invistam recursos no setor agro.
- CPR-Verde Título que viabiliza ao produtor rural uma fonte adicional de renda pela prestação de serviços ambientais de conservação da vegetação nativa.
- CPR-Digital Título que permite ao agricultor antecipar o crédito necessário para desenvolver a sua produção.
- CRA dólar O Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) passou a poder ser emitido com cláusula de correção pela variação cambial, podendo ser acessado também por investidores que residem no Brasil.
- Nota comercial Medida que simplifica as emissões de notas comerciais por sociedades anônimas, limitadas e corporativas.
- Fundo Solidário Rural Permite o uso de fundos garantidores solidários em operações financeiras vinculadas à atividade rural, fornecendo garantia complementar em operações de crédito agrícola.
- Certificado de Recebíveis Novo modelo de certificado de recebíveis, que atende qualquer tipo de empresa (antes limitando setores do agronegócio e imobiliário).
- LRS Letra de Risco de Seguro (LRS), que visa permitir a captação de recursos no mercado de capitais para financiar riscos de operações de seguro.
- Antecipação Saque Aniversário FGTS Permite ao trabalhador o acesso ao crédito com base na antecipação dos valores a receber do saque aniversário do FGTS, tendo por garantia a alienação e cessão fiduciária desses recebíveis. Esse crédito tem taxas de juros similares ao consignado de trabalhadores do setor público. Os pagamentos são anuais e realizados diretamente da conta FGTS do trabalhador para as instituições credoras.
- Antecipação do Frete Disponibiliza recursos diretamente na conta de transportadores autônomos com até 120 dias de antecedência.
- Voto plural Permite que as ações de companhias abertas ou fechadas sejam segmentadas por classes, em que as ações de cada classe poderão conceder, a seus titulares, o direito de ter um ou mais votos por cada ação.
- Competição de bancos no Plano Safra Plano Safra 2021/22 permite que mais instituições financeiras operem recursos, com cinco novos bancos credenciados.
- Instituições Gestoras de Garantias MP que permite pessoas jurídicas de direito privado autorizadas a realizar o serviço de gestão especializada de garantias pelo Banco Central. Enquanto as IGGs passam a cuidar da administração das garantias, os bancos podem se dedicar à parte financeira: ganhando eficiência na oferta de empréstimos e financiamentos.
- Recebível de Reciclagem de Catadores Benefício social concedido a catadores, que vão emitir nota fiscal e vender às empresas que precisam atingir metas de reciclagem.
Foco nos pequenos negócios
A MP editada nesta segunda-feira altera a legislação para permitir as novas garantias. Para o chefe da assessoria especial de Assuntos Estratégicos do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, o pacote tem potencial de trazer dinamismo para o compromisso de campanha do presidente Bolsonaro de “foco no pequeno”.
Na mesma linha, a secretária especial de Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia, Daniella Marques, disse que as medidas desconcentram a política de crédito do governo para melhorar o ambiente de negócios. Ela destacou que são recursos que estão “parados” nos bancos.
“O Tesouro não terá desembolso", afirmou a secretária. Ela previu que ainda essa semana o Senado conclui a votação do projeto do Pronampe. Pela proposta, os recursos do Pronampe poderão ser reutilizados para novos empréstimos até dezembro de 2024. “São condições bastante vantajosas para micro e pequenas empresas e MEIs que não tiveram acesso nas últimas rodadas”, disse Daniella.
O projeto dispensa todos os agentes financeiros do programa da exigência de certidões de regularidade fiscal, FGTS, Relação Anual de Informações Sociais (Rais) e outras que restringem o acesso ao PEAC-FGI e ao PEC. Fica mantida apenas a obrigatoriedade de regularidade previdenciária da empresa tomadora do crédito.
O Programa de Estímulo ao Crédito (PEC) também será reeditado até 31 de dezembro de 2022 e tem potencial de R$ 14 bilhões de novos empréstimos.
Além de ampliar as linhas, a MP incluiu no Programa Emergencial de Acesso a Crédito (Peac) os MEIs e estendeu a vigência do programa até 31 de dezembro de 2023. O Peac já oferecia garantias para empréstimos contratados por pequenas e médias empresas, associações e fundações de direito privado e cooperativas.
Para a Confederação das Associações Comerciais do Brasil (CACB), o volume previsto no pacote foi insuficiente para assegurar a plena retomada do segmento. “Acreditamos que os micro e pequenos empreendedores mereciam mais atenção, especialmente num momento em que começam a se recuperar dos desastrosos impactos gerados pela pandemia”, disse Alfredo Cotait, presidente da CACB. Ele considerou positiva a valorização dos MEIs. “Mas o volume de recursos aquém do esperado causou certa frustração”, criticou.
PACOTE DE CRÉDITO
Nova rodada das linhas de crédito emergenciais da pandemia para acelerar o crescimento recebeu o nome de Crédito Brasil Empreendedor
PEAC - Programa Emergencial de Acesso a Crédito
Público: pequenas e médias empresas com faturamento até R$ 300 milhões
Potencial: R$ 21 bilhões
FGHab – Fundo Garantidor da Habitação Popular
Público: Mutuários dos Programas de Habitação Popular , incluindo Casa Verde Amarela
Potencial: R$ 2 bilhões
PEC – Programa de Estímulo ao Crédito
Público: Microempreendedores Individuais (MEIs), micro e pequenas empresas, cooperativas e associações de pesca e de marisqueiros com faturamento anual até R$ 4,8 milhões; médias empresas no máximo 30%.
Potencial: R$ 14 bilhões
Pronampe - Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
Público: Microempresas e pequenas empresas com faturamento até R$ 4,8 milhões
Potencial: R$ 50 bilhões (depende de aprovação final de projeto no Senado)
Total de novos créditos esperados: R$ 87 bilhões
Taxa média de juros esperada: 1,5% a 1,75% ao mês
Taxa máxima de juros: 2,8% ao mês.
IOF: não haverá cobrança. Isenção custará R$ 789 milhões (2022) e R$ 726 milhões (2023)