A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse que o Brasil “tem tecnologia” para contornar possíveis atrasos no plantio da safra 2019/20, se houver. Regiões produtoras de soja, cujo plantio se inicia nesta época do ano, têm se ressentido do regime irregular de chuvas e com isso o plantio está aquém do verificado na safra passada e na média dos últimos cinco anos. O Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea-MT) divulgou hoje, por exemplo, que o plantio de soja em Mato Grosso - o principal produtor da oleaginosa - evoluiu 1,41 ponto porcentual na última semana, para 1,69% da área prevista pelo instituto no Estado, de 9,722 milhões de hectares. Assim como na semana anterior, os trabalhos estão atrasados ante igual período do ano passado (4,32%) e na média dos últimos cinco anos (2,69%).
Para a ministra da Agricultura, que participou de evento dos 100 anos da Sociedade Rural Brasileira (SRB), no Jockey Club, em São Paulo, o País tem tecnologia para contornar eventuais atrasos. “Isso (eventuais atrasos no período de plantio) acontece todo ano; temos tecnologia pra isso e vai dar tudo certo”, garantiu Tereza Cristina. Antes do discurso na solenidade, a ministra esclareceu que suas declarações sobre agricultura orgânica brasileira, dadas em entrevista à Emirates News Agency (WAM), nos Emirados Árabes na semana passada, “foram mal interpretadas”. Segundo a WAM, a ministra teria afirmado que, por causa do “clima desfavorável” no Brasil, os produtos orgânicos seriam “entre 15% e 20% mais caros” do que produtos não orgânicos, sendo privilégio apenas de classes mais abastadas. “O que eu falei foi (dado) uma interpretação errada. Eu disse que os orgânicos estão crescendo, e muito, no Brasil. Disse que um país tropical como o nosso não pode produzir orgânicos na mesma quantidade que a gente produz a agricultura comercial”, esclareceu Tereza Cristina, que continuou: “Disse também que no Brasil (a agricultura orgânica) vem crescendo muito e é uma tendência mundial e nós acompanhamos (o setor). O Ministério da Agricultura cuida dos orgânicos”, disse, e completou: “Houve um mal entendido, talvez pela língua”. Em seu discurso, em homenagem aos 100 anos da SRB, Tereza Cristina elogiou o centenário da entidade. “Isso mostra por que a agricultura está na vanguarda e puxando a economia”, disse. “É porque ela se organizou e os 100 anos da SRB são prova disso.” Tereza Cristina ressaltou, ainda, que mesmo pujante, a agropecuária brasileira “tem de trabalhar e ousar mais”. “Tenho andado em vários países e vendo o que nós precisamos fazer, vendendo os produtos brasileiros. Mas podemos fazer muito mais. Fizemos pouco diante das oportunidades que eu enxergo para este setor aqui no Brasil e no mundo”, continuou. “Recebi há poucos dias ministros do Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul) e eles ficaram encantados com o que viram.” Segundo a ministra, os ministros da Agricultura do Brics, reunidos na semana passada em Bonito (MS), “viram o que o agro realmente é”. “Temos o agro mais sustentável do mundo, mas tem uma pecha de que não fazemos da maneira como fazemos. Isso vai passar, aliás, já está passando. O Brasil precisa se mostrar da maneira que ele realmente é. Temos problemas, mas também temos muitas coisas boas para mostrar ao mundo.”
Custo Brasil
O presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Marcelo Vieira, disse que o Brasil, entre os países produtores de alimentos, tem a legislação ambiental mais exigente e a legislação trabalhista mais completa do mundo. Isso torna a produção nacional uma das mais sustentáveis do mercado mundial, na sua avaliação.
Vieira discursou agora à noite, durante o evento de comemoração dos 100 anos da SRB, no Jockey Club, em São Paulo, que contou com a presença de várias lideranças do setor agropecuário brasileiro, além de políticos, ex-ministros e da ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Vieira afirmou ainda que, apesar de o País ter os custos mais competitivos, "o Custo Brasil, advindo da regulamentação excessiva, agrega custos desnecessários". Isso, na opinião dele, "envolve desde a logística até a burocracia", disse. "No entanto, temos agora grandes oportunidades de reformas reduzindo essas limitações." Presente ao evento da SRB, o governador do Estado de São Paulo, João Doria (PSDB), disse que o Estado de São Paulo “representa 22% do agronegócio brasileiro, ou quase um quarto da produção agrícola brasileira”. Em recentes viagens internacionais que ele fez para vender o agronegócio brasileiro e paulista, Doria disse que alcançou resultados extraordinários. “Estivemos no Japão e na China. A partir do ano que vem 10% dos 250 milhões de novos veículos da China serão aditivados com etanol do Brasil, produzido em São Paulo”, afirmou. Ele citou ainda que, para o suco de laranja – cuja maior produção também está em São Paulo –, foram abertos novos mercados nos dois países. “Nessas ações, nós defendemos o Brasil, não apenas São Paulo.” Doria defendeu ainda os produtores rurais que, segundo o governador, “sabem conviver e respeitar as regras do meio ambiente até porque precisam disso para perenizar as suas produções”.
Dívida
O deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), disse que a questão da dívida do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (o Funrural, usado para custear a aposentadoria do trabalhador rural) "está encaminhada" junto ao governo federal.
"Mas, por enquanto, em virtude da aprovação da reforma da Previdência e também em virtude do aperto fiscal, há restrição de verbas. Nós precisamos de um recurso de aproximadamente R$ 11 bilhões (para sanar a dívida)", disse Moreira. "Esses R$ 11 bilhões terão de ser fracionados, em 10, 12, 15 anos”, disse Moreira, referindo-se a um possível parcelamento da dívida. "Temos de achar uma solução", continuou. "A proposta do (ministro da Economia) Paulo Guedes é que, até o fim do ano a gente consiga fazer um Refis, para que aqueles que não aderiram possam aderir e pagar a dívida, para ficar todo mundo igual", disse. "Logo depois, teremos um processo de remissão total ou parcial (da dívida) para o Orçamento de 2020", descreveu, assinalando, porém, que ainda se trata de uma proposta. "Não temos essa garantia (de que a proposta será efetivada)." Moreira disse ainda que, em recente reunião com o presidente Jair Bolsonaro, ele orientou o parlamentar a "buscar uma solução". "Ele (Bolsonaro) quer que a gente encontre uma solução, desde que isso não incida em irresponsabilidade fiscal." O perdão da dívida bilionária que deixou de ser paga pelos agricultores era promessa do presidente Jair Bolsonaro. Essa contribuição foi considerada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017 e a Receita quer cobrar a dívida retroativa. O governo lançou mão de um Refis para que os produtores pagassem os débitos, mas boa parte dos produtores não aderiu ao parcelamento contando com a promessa de campanha do presidente.
Guerra comercial
Mesmo que a guerra comercial entre Estados Unidos e China se encerre no curto prazo, “o Brasil só tem a ganhar”, disse o vice-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Francisco Matturro, presente ao evento de comemoração de 100 anos da Sociedade Rural Brasileira. As rusgas entre EUA e China têm “afetado positivamente” o Brasil, que vem conseguindo, desde que a “guerra” começou, exportar mais commodities agrícolas para o gigante asiático. Para Matturro, entretanto, mesmo se os EUA se acertarem com a China “o Brasil não deve ser afetado.” “Matturro disse que o Brasil vai continuar vendendo proteína animal para a China, lembrando que o país asiático enfrenta um sério problema, a peste suína africana, que obrigou ao abate de milhões de suínos nos criatórios chineses. “A carne suína é uma tradição milenar ali e o mundo não tem proteína animal suficiente para oferecer aos chineses”, continuou. “Então, eles estão indo para outros tipos de carne, como carne de frango e bovina, que o Brasil pode oferecer, além da suína.”
Matturro disse acreditar, ainda, que a “guerra” entre China e EUA “é comercial”. “E, alguma hora, toda guerra acaba".