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Países promovem ''guerra de moedas''

Governos desvalorizam câmbio para proteger indústria e garantir exportação

Por Jamil Chade
Atualização:

Dois anos após a quebra do banco Lehman Brothers, economistas, a ONU e até governos dizem que o mundo dá sinais de ir na mesma direção da "guerra das moedas" iniciada em 1931, após a quebra da Bolsa de Nova York. Naquele ano, o banco central inglês desvalorizou a libra esterlina em 24%, medida seguida por vários países. Os Estados Unidos acabariam tomando o mesmo caminho em 1933. Ao desvalorizar suas moedas - ou pelo menos impedir sua valorização -, governos tentam proteger suas indústrias nacionais e garantir renda com as exportações. Na prática, exportam suas crises a seus vizinhos.Um relatório da ONU constatou, porém, que o mais preocupante é que não existe nenhuma lei ou mecanismo nos organismos internacionais que impeçam países de usar a moeda para uma "desvalorização competitiva". Para tornar a situação mais complexa, países que raramente intervêm no cambio e defendem a flutuação de moedas mudaram radicalmente a postura. O primeiro país industrializado foi a Suíça. Em 2009, US$ 37 bilhões das reservas do país foram gastos para segurar a valorização da moeda. Em 2010, já foram mais US$ 14 bilhões.Nesta semana, o Japão anunciou medidas para manipular o iene e tentar garantir a retomada das exportações. A moeda havia atingido a maior alta em relação ao dólar em 15 anos. O primeiro-ministro Naoto Kan defendeu a medida, dizendo que o iene havia chegado a níveis "que não poderiam mais ser permitidos".Na Europa e EUA, a medida foi recebida com surpresa e preocupação. Para Jean-Claude Juncker, presidente da zona do euro, "ações unilaterais não são a maneira apropriada de lidar com desequilíbrios globais". Já o presidente do Comitê de Finanças do Congresso americano, Sander Levin, classificou de "preocupante" a ação do Japão, porque enfraquece o poder dos EUA de convencer a China a não mais manipular sua moeda. Yuan. Na prática, as medidas na Suíça e Japão impedem que a China seja acusada de ser a única a manipular sua moeda. O Congresso americano calcula que o yuan esteja 40% abaixo do nível considerado mais realista. Várias queixas foram iniciadas na Organização Mundial do Comercio (OMC) pelos americanos contra a China, para pressionar Pequim a rever sua moeda.Na Alemanha, o euro desvalorizado também favoreceu as exportações da maior economia da Europa. Nos primeiros seis meses de 2010, as exportações alemãs aumentaram 17%, enquanto o mercado doméstico se mantém estagnado. Na prática, portanto, o país exportou sua crise. Para o Brasil, a alta nas vendas foi de 61,4%. Para a China, 55%. Mas o uso das moedas para acertar as contas nacionais também passou a ser usado por países em desenvolvimento. No Brasil, o Banco Central se mobiliza para defender o real valorizado. No início do ano, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, desvalorizou o bolívar em até 50% para aumentar renda de exportações de petróleo e contrabalançar a inflação de 25%. Na Colômbia, o novo governo de Juan Manuel Santos também embarcou em um esforço para impedir a valorização da moeda. O país já gastou US$ 20 milhões por dia de suas reservas entre março e junho para evitar a valorização do peso colombiano, que já chegou a 13% em 2010. Em agosto, Viena também atuou para desvalorizar sua moeda em 2,1% para conter um déficit que já chega a US$ 7,2 bilhões no ano, o dobro de 2009. Na África do Sul, um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicou que o rand estaria 15% acima de um nível considerado adequado para as exportações e recomendava o governo a atuar para desvalorizar a moeda. A Rússia já promoveu sua principal desvalorização entre 2008 e 2009, vendendo 25% de reservas e ouro. Mas nem assim conseguiu conter a queda nas exportações. Ucrânia, Casaquistão, Bielo-Rússia e Letônia vivem um dilema entre desvalorizar a moeda para exportar mais para a Rússia ou mantê-la forte para poder pagar os juros das dívidas externas. A Bielo-Rússia já optou pela desvalorização da moeda em 20%. Na Ucrânia, a queda foi de 40%.

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