Publicidade

Para analistas, opção é baixar a Selic

Com arrecadação menor, governo pode recorrer ao corte da taxa básica de juros para enfrentar os efeitos da crise

Por Leandro Mode e Sergio Gobetti
Atualização:

Mesmo com a queda da arrecadação, economistas avaliam que existem outros instrumentos que o governo pode usar para enfrentar a crise sem colocar em risco o equilíbrio fiscal. O caminho sugerido passa pela queda da taxa básica de juros (Selic), hoje em 12,75% ao ano. O professor José Luis Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB) defende, além de cortes da Selic, uma diminuição do superávit primário, a economia que o governo faz para pagar os juros das dívida. Desse modo, argumenta, o governo poderia gastar mais, mas o endividamento ficaria estabilizado. "O setor público tem poder de fogo de sobra para realizar uma forte política anticíclica (de estímulo à economia), desde que o BC faça a sua parte e reduza a taxa de juros para 9,75% até o fim do primeiro semestre", diz Oreiro. Segundo ele, a lógica é simples: se a taxa de juros cair, o custo do endividamento também será reduzido, e o governo não precisará economizar tanto dinheiro para evitar o crescimento da dívida pública. Uma queda de quatro pontos porcentuais da taxa de juros (a Selic encerrou 2008 em 13,75% ao ano), segundo cálculos de Oreiro, liberaria cerca de R$ 34 bilhões para o governo investir. Embora também defendam o corte da taxa básica, Fernando Montero, da Corretora Convenção, e Sergio Vale, da MB Associados, acreditam que o impacto de uma Selic mais baixa no custo da dívida pública é bem menor do que o estimado por Oreiro. O cálculo parte do princípio de que a Selic média em 2009 será de 11% (número extraído do último relatório Focus do Banco Central), ante 12,5% em 2008. Em dinheiro, essa diferença de 1,5 ponto porcentual implica economia para os cofres públicos em torno de R$ 11 bilhões. No entanto, somente as isenções fiscais anunciadas até agora envolvem uma renúncia de receitas da ordem de R$ 18 bilhões. Ou seja, só aí já existe um buraco de R$ 7 bilhões. Deve-se acrescentar, ainda, as despesas adicionais "contratadas" pelo governo na época da bonança da economia, quando a arrecadação crescia fortemente. Tanto Vale quanto Montero são favoráveis à redução da Selic porque entendem que o impacto de um juro menor sobre a economia é mais homogêneo - além, é claro, de diminuir os custos da rolagem da dívida. "Estamos diante de uma janela de oportunidade para que o BC seja mais ousado na redução do juro, mas uma política fiscal muito expansionista limita esse espaço", diz Vale. "Os juros reais no Brasil ainda são os mais altos do mundo. Portanto, uma redução da Selic para estimular a economia é sempre preferível", diz Montero. No Banco Central, a avaliação é diferente: não é necessário mexer na Selic para permitir que o governo aumente seus investimentos. O lucro de R$ 181 bilhões obtido pelo BC no último ano, principalmente com operações cambiais, reduziu a dívida pública e abriu espaço para aumentar os gastos. Na visão do BC, o corte da Selic nem traria o efeito que muitos esperam porque apenas um terço da dívida é atrelada à taxa. O resto é prefixado ou segue a variação da inflação medida pelo IPCA. E apesar de já ter iniciado um ciclo de corte na Selic, o BC continuará dando prioridade ao controle da inflação. META EM RISCO Nos bastidores, os técnicos da equipe econômica admitem que o governo terá dificuldades de cumprir a meta de superávit primário de 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB), mesmo com os artifícios contábeis à sua disposição. Hoje, por exemplo, nem os gastos do Projeto Piloto de Investimentos (PPI) nem os eventuais gastos financiados com recursos do Fundo Soberano, que somam, juntos, cerca de R$ 30 bilhões, ou 1% do PIB, contam no resultado fiscal. Ou seja, em tese, o governo tem aval legal para fazer um superávit de 2,8% do PIB (3,8% menos 1%) e oficialmente comprovar o cumprimento da meta fiscal, mas já há quem defenda uma queda mais acentuada em 2009. "A meta de primário caminha para um segundo plano, junto com os conceitos do que se entende por tal", diz Montero, referindo-se ao critério para calcular o superávit, excluindo as receitas e despesas do Fundo Soberano. É importante salientar que nenhum analista, até mesmo os ortodoxos, vê hoje um problema de solvência para o País, como existia na crise de 2002, que antecedeu a eleição de Lula. Mas eles chamam a atenção para os riscos na expansão de gastos. "No Brasil, as despesas transitórias acabam se tornando permanentes, o que é muito ruim quando se pensa a longo prazo", alerta Montero. Fernanda Feil, analista da consultoria Rosenberg & Associados, lembra que a situação fiscal relativamente confortável do Brasil é uma das razões que explicam a maior resistência do País à crise global, na comparação com outros emergentes. "É um fator que dá confiança ao investidor, que faz com que não tenhamos uma fuga de capitais", argumenta. Para John Welch, economista global do Banco Itaú, o BC terá mais espaço para derrubar a Selic se o governo "não exagerar" na política fiscal. Ele prevê que a Selic estará em 9,75% em julho e aí ficará até dezembro. "Mas pode chegar a 9,5%."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.