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Para Cepal, FMI errou ao isolar a Argentina

Por Agencia Estado
Atualização:

A tese de que a Argentina não geraria contágio na América Latina, que levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a adotar uma linha dura antes de liberar qualquer socorro financeiro para o governo do então presidente Fernando de la Rúa e, agora, para a administração Eduardo Duhalde foi por água abaixo. De acordo com a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), o tempo mostrou que política de isolamento adotado pelo FMI em relação à Argentina foi inútil. "A percepção equivocada do Fundo está demonstrando que existem outros mecanismos de contágio, que não são apenas aqueles citados geralmente por analistas e economistas de instituições financeiras e de classificação de risco", disse à Agência Estado Alfredo Calcagno, responsável pelo Centro de Projeções Econômicas da Cepal. Entre esses mecanismos de contágio, Calcagno cita a deterioração do comércio exterior, a queda do volume de remessas de cidadãos morando em outros países e a capacidade de pagamento dos governos sem recorrer aos mercados financeiros internacionais. Na semana passada, a direção da Cepal lembrou que, a cada dia que passa sem uma solução para a crise argentina, a situação na América Latina fica pior. "O contágio, agora evidente, é o principal fator que desestimula o investimento na região", alertou no seu último informe econômico a Cepal. A entrada líquida de recursos na região, por exemplo, caiu de US$ 105 bilhões, em 1999, para US$ 80 bilhões em 2001. Ou seja, foram US$ 25 bilhões a menos de investimento estrangeiro direto (IED) em apenas dois anos. As perspectivas de ingresso de capital estrangeiro para este ano são ainda piores. O IED em 2002 deve cair para US$ 56 bilhões, de acordo com a Cepal. Por isso, acrescenta a Cepal em seu informe, a situação econômica, política e social na região está cada vez mais difícil, razão pela qual a tese de que "se salvam todos ou afundam todos" parece cada vez mais evidente. Isso deve levar a América Latina a bater nas portas do Fundo em bloco, e solicitar ajuda financeira. Paraguai, Equador e Venezuela já pediram socorro. Peru obteve um crédito de quase US$ 300 milhões em fevereiro, porém, condicionado a um plano de privatizações que a população não quer e que já ameaçou derrubar o governo do presidente Alejandro Toledo. O Chile viu nos últimos cinco meses e meio sua moeda se desvalorizar 5,35% e sua economia patinar nos 3% de crescimento, nos últimos três anos. O Uruguai, que praticamente foi obrigado a mudar sua política cambial, na semana passada, pediu uma ajuda adicional de US$ 1,5 bilhão do Fundo e o mesmo montante de outros organismos multilaterais de financiamento. O Brasil, que negociou US$ 17 bilhões em setembro do ano passado, poderá recorrer a US$ 10 bilhões que ainda não havia sacado. A Argentina, por sua vez, precisa urgentemente de US$ 1,75 bilhão para pagar ao Fundo e ao BID no dia 15 de julho, e mais US$ 4 bilhões até setembro, para honrar outros compromissos externos. Esse quadro se completa ainda com a instabilidade política e social, que, dependendo de cada caso, já começa a desencadear turbulências cambiais e financeiras no Brasil e em outros países da região. Isso, por sua vez, provoca desconfiança dos investidores e retirada de capital estrangeiro dos mercados de capitais e de títulos da dívida dos países latino-americanos. Diante do contágio, os países do Mercosul, principalmente, podem decidir, na reunião de cúpula de Buenos Aires, nos dias 4 e 5 de julho, se vão ou não em bloco pedir socorro ao Fundo. O presidente do México, Vicente Fox, que deve participar desse encontro, pode servir de porta-voz para alertar ao Fundo e aos Estados Unidos de que "se um afundar, afundarão todos". A Cepal, de acordo com Calcagno, não prevê um crescimento rápido para a América Latina. Para 2003, explicou o economista, a situação ainda não é clara e dependerá do comportamento da economia da região no segundo semestre deste ano. A estimativa de crescimento para a América Latina neste ano, por sua vez, é de uma retração de 0,5%. Excluindo a Argentina, a economia deve crescer apenas entre 1% e 1,5%. "Não há como dizer que esse ou aquele país irá crescer mais", disse Calcagno, por telefone de Santiago, sede da Cepal. De acordo com ele, o Chile e o México, que pareciam estar descolados da turbulência depois das reformas implementadas, começam a mostrar a sua vulnerabilidade. Os dois países, como grande parte da América Latina, dependem dos preços do mercado internacional e do comportamento da economia norte-americana. No ano passado, a América Latina cresceu apenas 0,3%, dez vezes menos do que se estimava não final de 2000, quando a Cepal, antes de fazer suas revisões, havia estimado uma expansão de 3,5%. Vale lembrar que o Brasil tem um peso de 40% nas estimativas do organismo.

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