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'Para crescer, às vezes é necessário arriscar tudo'

Com a Satipel, nos anos 1990, Seibel deu salto de empresário de médio porte a concorrente de multinacionais

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Por Fernando Scheller
Atualização:

Na segunda metade dos anos 1990, a economia brasileira ainda era muito suscetível às crises internacionais, como a asiática e a russa. Foi neste cenário que os irmãos Salo e Hélio Seibel decidiram fazer o maior investimento de suas vidas. Empresários de "pequeno para médio porte", nas palavras de Salo, eles passaram a lidar com cifras milionárias para garantir a expansão da empresa de painéis de madeira Satipel.

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Era necessário aplicar US$ 150 milhões na ampliação da base de florestas e na construção de uma nova fábrica da empresa. A aposta ousada deu certo: cerca de uma década mais tarde, a Satipel se fundiu com a Duratex, da qual os irmãos detêm hoje 20%. Além da fatia na empresa do grupo Itaúsa, Salo e Hélio são sócios da rede de material de construção Leroy Merlin no País, da Vanguarda Agro e mantêm a empresa fundada pelo pai, a Leo Madeiras.

Salo Seibel, 66 anos, começou a carreira na área acadêmica e fez doutorado antes de partir para a vida executiva e de empresário, nos anos 1970 e 1980. As turbulências da economia sempre exigiram boa dose de sangue frio: ele comprou sua primeira empresa logo após o Plano Cruzado e conseguiu fechar uma aquisição internacional dias antes do Plano Collor.

Outra característica de Seibel é a participação em entidades que reúnem executivos e homens de negócio. "A gente tem de pensar em como influenciar o sistema político. Não acho que nos expomos suficientemente." O empresário faz parte hoje da Organização de Jovens Presidentes (YPO, na sigla em inglês), entidade com membros no mundo inteiro que se propõe a trocar experiências e conselhos de gestão.

Veja trechos da entrevista de Salo Seibel ao Estado:

Como sua passagem pela vida acadêmica ajudou em sua carreira como executivo e empresário?

Eu não acho que as duas coisas estão relacionadas. Nunca quis ser professor em dedicação exclusiva, mas esse foi o convite que eu recebi no fim de 1973, quando estava voltando do período de doutorado na França. Sempre fui uma pessoa agitada, movida por desafios imediatos.

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Na volta para o Brasil, o sr. teve vários convites de trabalho. Qual foi seu critério de escolha?

Foi basicamente por causa da pessoa com quem eu ia trabalhar. Ele tinha sido meu chefe antes, e tínhamos grande afinidade. Era um grande desafio: montar um projeto de mineração e metalurgia de níquel no meio de Goiás para o grupo Hochschild. Era preciso desenvolver toda a infraestrutura. Essa coisa geograficamente remota sempre me agradou. Isso acontece de novo agora, com a Vanguarda Agro, uma atividade que me faz ir ao Mato Grosso e ao Piauí com frequência.

O sr. e seu irmão Hélio são sócios há muitos anos. O que se pode fazer para evitar conflitos?

O meu pai fundou a Leo Madeiras como uma pequena empresa. Inicialmente, trabalhavam lá meu pai, dois carregadores, um contador que vinha duas vezes por semana e minha mãe, meio período. Hélio começou a trabalhar lá aos 16 anos, no fim dos anos 1960. Nos anos 1970, a Leo Madeiras começou a se desenvolver. Na primeira metade dos anos 1980, eu já era um dirigente de destaque e começamos a discutir a possibilidade de levar essa experiência para o negócio da família. Mas decidimos que era melhor que Hélio e eu tivéssemos duas empresas e que cada um cuidasse de uma. A ação, no dia a dia, precisa de um líder claro. Sempre trabalhamos bem assim.

Como surgiu a chance de a família ter um segundo negócio?

Trabalhava havia 12 anos no grupo Hochschild, que havia sido comprado pela Anglo American em 1984. Surgiu a possibilidade de comprarmos a Brasimet, empresa de metalurgia que não interessava à Anglo. Faturava o triplo da Léo na época, tinha várias fábricas, capital aberto e cerca de 100 engenheiros. Compramos em 1986, na euforia do Plano Cruzado. Foi a primeira vez que a família tomou dívida relevante. E percebemos rapidamente que não poderíamos seguir sozinhos e aceitamos como sócia a alemã Degussa.

O sr. também fechou aquisição dias antes do Plano Collor.

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Em 1987, a empresa americana dona da marca Fórmica vendeu todas as operações mundiais, menos no México e no Brasil. Tentamos negociar, mas encontramos muitos empecilhos. Voltamos a negociar em 1989 e conseguimos fechar dias antes do Plano Collor.

Foi na época da Satipel que o sr. decidiu fazer um investimento de US$ 100 milhões em uma fábrica, um passo e tanto em termos de porte de investimento.

Com a chegada de grupos como o Sonae, isso passou a ser necessário. Mas precisávamos de florestas, algo que leva pelo menos oito anos para se concretizar. Descobrimos que o Bradesco tinha uma floresta em Minas Gerais. Eles pediam US$ 100 milhões. Negociamos e conseguimos pagar US$ 50 milhões a prazo. Decidimos, então, fazer a fábrica em Uberaba, que fez a Satipel virar gente grande. Todo empresário de sucesso se viu obrigado a arriscar tudo em algum momento.

O sr. participa de diversas associações. Como a troca de informações ajuda um empresário?

Acho que as trocas mais interessantes de ideias e experiências ocorreram justamente dentro do YPO, formado por pessoas que chegaram a posições de liderança antes dos 30 anos. Acho que os empresários têm de pensar não só sobre seus próprios negócios. Temos de pensar em como influenciar o sistema político. Não acho que nos expomos suficientemente. Fizemos isso um pouco isso no PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais), entre 1987 e o início dos anos 1990.

O sr. também é conselheiro. Existe algo a ser melhorado na governança das empresas?

Um conselheiro precisa de independência e de uma enorme capacidade de avaliação. Os executivos que acumulam a presidência do Conselho são uma doença dentro das empresas, porque a administração corre o risco de se tornar um clube de amigos. É a mesma coisa de um presidente da República acumular a presidência do Senado.

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Como o sr.dentifica um talento em potencial?

Iniciativa de aprender é vital. Acho que as pessoas sempre têm de estar um pouco insatisfeitas com seu desenvolvimento. Quem quer liderar precisa gostar de gente, porque todo mundo - funcionário, cliente e fornecedor - é gente. Bons líderes percebem rapidamente quando um subordinado não tem a performance mínima. Acho que as empresas pecam mais pelas demissões que não fazem do que pelas que fazem.

Olhando para trás, há alguma decisão que se revelou errada?

Sim. Uma delas foi a compra da fábrica de uma fábrica na Holanda. Foi um investimento feito mais na base do entusiasmo. Exigiu muito da minha atenção. Tinha de gastar 16 horas para chegar no local, pois a fábrica ficava a duas horas de Amsterdã. Não estudei suficientemente o produto antes de comprar.

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