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Para especialista, falta debater política externa

Por Agencia Estado
Atualização:

A política externa ficou em segundo plano nas eleições e isso pode ter conseqüências desastrosas no próximo governo. A opinião é do advogado Luiz Olavo Baptista, primeiro brasileiro a atuar como juiz no órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio (OMC). "Nenhum dos candidatos estudou com profundidade as questões cruciais do comércio internacional", diz Baptista. "Meu medo é que o próximo presidente se precipite e acabe tomando decisões erradas, como fizeram Fernando Collor e Ciro Gomes, ao derrubarem as tarifas de importações sem negociarem contrapartidas." Para Baptista, o próximo presidente precisará enfrentar grandes desafios no comércio internacional, começando pelo cenário de recessão global. Ele ressalta que o novo governo deve ficar atento às conseqüências de movimentações internacionais, como o acordo de livre comércio entre China e Japão. "Vários produtos que exportamos para a Ásia, como borracha e arroz, podem começar a ser supridos localmente; o Japão pode começar a fabricar aviões na China, por exemplo." O especialista acredita que o debate atual entre os candidatos é dominado por chavões e desconhecimento. Todos estão pregando medidas para incentivar as exportações e a substituição de importações, mas se esquecem de que o Acordo sobre Medidas de Investimentos Relacionadas ao Comércio (Trims, na sigla em inglês), limita muito essas iniciativas. "A maior parte das medidas, como a exigência de utilização de matéria-prima produzida localmente pelas multinacionais e exportação de parte da produção, é proibida pelo Trims", esclarece Baptista. Índia e Brasil estão pressionando por uma flexibilização do Trims, para que haja mais espaço de manobra na política industrial dos países. Mas os EUA, a União Européia e o Japão opõem-se fortemente e as negociações para flexibilizar o tratado ainda devem levar algum tempo. Mesmo assim, segundo o advogado, há vários países explorando ao extremo as lacunas do Trims, entre eles os EUA. "Além disso, há espaços a serem preenchidos. O Brasil poderia fomentar o comércio de serviços. Incentivar o turismo é permitido pelo Trims", diz Baptista. Ele duvida que o próximo governo se embrenhe em uma escalada protecionista, quem quer que seja o próximo presidente. "O Brasil só poderá aumentar seu protecionismo até os limites dos acordos internacionais, senão terá de renunciar a esses acordos e ficará solto no mundo, sem poder reclamar nos foros multilaterais", alerta o advogado. "Não adianta querer ser nudista no Clube Pinheiros. Temos de seguir as regras. Até a China entrou na OMC para se proteger." Em vez de ficar reclamando, acredita o advogado, o Brasil deveria "devolver na mesma moeda", isto é , denunciando outros países nos foros multilaterais. Para isso, seria necessário aperfeiçoar os mecanismos de investigação no Brasil e começar a denunciar todas as práticas desleais de comércio. Baptista ataca o que chama de "noções errôneas" a respeito da Alca. "Não somos obrigados a assinar nada, mas não negociar é uma estupidez", diz. Ele afirma que não é necessário envolver todos os produtos num possível acordo, pode haver um escalonamento. O advogado não considera agressiva a afirmação do Representante de Comércio dos EUA, Robert Zoellick. Este deu a entender que os países que não entrarem na Alca terão de vender seus produtos na Antártida. "Mas temos de entender a frase no contexto. Os americanos não são sutis como os latinos." Outro ponto que deve preocupar o próximo governante será o comércio intra-empresas, que corresponde à maior parte do comércio mundial. Segundo ele, é necessário encontrar maneiras que não desrespeitem o Trims, mas que permitam oferecer incentivos para essas empresas manterem suas exportações no País. "Imagine se a Fiat, que está despedindo milhares de pessoas na Itália, decidir exportar sua crise para o Brasil, transferindo as exportações de Betim para Turim?"

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