
02 de setembro de 2020 | 04h00
A queda de 9,7% do PIB no segundo trimestre, na margem, revela o impacto inicial da pandemia que chegou ao Brasil em meados de março. Foi a queda mais intensa em apenas um trimestre, o que fez o País retornar ao nível de atividades do pós-crise 2008/2009.
Comparativamente, o impacto foi similar ao sofrido por EUA e Alemanha; mais intenso do que na Ásia (China, Coreia e Japão); e menos profundo do que na Europa e no México.
A parada súbita na produção ocorreu pela necessidade de se implementar rápido distanciamento social, sendo mais sentida na indústria (-12,3%). O setor de serviços, usualmente amortecedor de choques, desta vez, foi igualmente abatido (-9,7%), pois nenhuma outra crise havia fechado escolas, clínicas, shoppings, restaurantes, hotéis, aeroportos.
A queda na produção afetou empregos e a renda e, mais enfaticamente, o setor informal. A contração da absorção doméstica foi de 12,5%, com quedas no consumo das famílias e dos governos (-12,5% e -8,8%) e postergação de investimentos (-15,4%).
O tombo teria sido maior (-11,4%), não fosse o crescimento das exportações (+1,8%) e a intensa queda de importações (-13,2%). As exportações, em particular, foram favorecidas pela safra recorde e pelo câmbio depreciado. Seria ainda razoável supor que o tombo da demanda doméstica teria sido bem maior não fosse a injeção de R$ 211 bilhões em transferências públicas, o que corresponde a 15% da massa salarial no segundo trimestre.
Os dados do PIB também trazem sinais importantes sobre os próximos trimestres. Parte dos serviços prestados a famílias deve ser gradualmente restabelecido na medida em que as curvas de contágio cederem, o que é um cenário plausível para o quarto trimestre. Até lá, a recuperação será mais presente na indústria e no comércio, com intensificação do uso de canais eletrônicos, e ainda dependente dos estímulos governamentais para sustentar o consumo. Com isso, com a mobilidade sendo restabelecida, a economia conviverá com menor grau de estímulos.
Os impactos mais severos da pandemia ficaram para trás, embora ainda seja esperada alguma retração adicional nos investimentos, o que é compatível com uma contração do PIB de -6,4% no ano, segundo nossas projeções. Seus efeitos de longo prazo somente serão claramente perceptíveis a partir de 2021, quando antevemos uma recuperação gradual, em função de uma esperada reabertura mais ampla, mas ainda dependente das escolhas da política econômica, em particular a manutenção do atual regime (e processo de consolidação) fiscal.
*ECONOMISTA-CHEFE DO SANTANDER BRASIL
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