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Patrimônio de afetação também tem riscos

Um dos pontos polêmicos da MP que estabelece regras para o mercado imobiliário diz respeito ao regime de afetação. Embora represente maior segurança para o comprador, estes ainda precisam cobrir algumas despesas. E é difícil fiscalizar a obra.

Por Agencia Estado
Atualização:

A Medida Provisória (MP) nº 2.221, que traz novas regras para o mercado imobiliário, continua causando polêmica. Um dos pontos em discussão é o que estabelece a opção de regime de patrimônio de afetação para as incorporações imobiliárias. O objetivo da regra é dar maior segurança aos consumidores que compram imóveis na planta, porque, em caso de falência da construtora ou incorporadora, os empreendimentos feitos neste regime têm seu patrimônio isolado dos demais empreendimentos e do próprio patrimônio da empresa falida. O que é patrimônio de afetação O regime de patrimônio de afetação obriga a empresa construtora ou incorporadora a isolar os recursos do empreendimento em questão do patrimônio da construtora ou incorporadora em conta corrente própria. Ou seja, as parcelas pagas pelo mutuário destinam-se à obra contratada por ele, ao invés de integrar o patrimônio da empresa. Anteriormente à MP, não havia esta opção. Os recursos captados eram repartidos de acordo com deliberação da construtora ou incorporadora, o que gerava muitas vezes uma ´corrente da felicidade´, segundo definição do advogado Márcio Bueno, especializado em direito imobiliário. Bueno cita um dos maiores exemplos da tal ´corrente da felicidade´: o caso Encol. "Vários empreendimentos foram lançados ao mesmo tempo e os recursos, pulverizados." Sem recurso suficiente para finalizar todos os lançamentos imobiliários, a falência da empresa resultou em obras incompletas e prejudicou milhares de mutuários. Como o dinheiro fazia parte de um caixa comum, os mutuários entraram na disputa judicial junto com os demais credores para receber as sobras da falência. Uma das críticas levantadas por Bueno é a não obrigatoriedade do regime de afetação. O artigo 30-A da MP deixa claro que esta escolha fica a critério do incorporador. Quando a empresa não optar pelo regime de afetação, portanto, o comprador não terá qualquer segurança sobre o destino de suas prestações. Por isso, apenas a pressão dos mercados e do mutuário podem obrigar as incorporadoras ou construtoras a implantar o regime antes de fechar o contrato. "Aconselho aqueles que estão para comprar imóvel na planta a só fechar negócio se ficar estabelecido o patrimônio de afetação." Novo regime mantém risco de pagar parte dos custos Embora os recursos de cada empreendimento fiquem isolados do patrimônio global da incorporadora ou construtora, em caso de falência, a obra responde solidariamente com a empresa por algumas dívidas desde que vinculadas ao patrimônio de afetação. Ou seja, vinculadas diretamente às despesas do empreendimento contratado. São obrigações tributárias, previdenciárias e trabalhistas que precisam ser quitadas antes de dar continuação à obra após a decretação de falência da incorporadora ou construtora. Neste caso, a Comissão de Representantes - responsável pela fiscalização da obra - da qual fazem parte os próprios compradores finais do imóvel, além de representantes do incorporador e do agente financiador, se houver, tem 60 dias para realizar o levantamento destas dívidas referentes ao empreendimento e, depois de pagá-las ou renegociá-las, assumir a conclusão das obras. O dinheiro para o pagamento das dívidas poderá sair da própria conta referente à obra mas, se os valores depositados forem insuficientes, há o risco dos condôminos ratearem a diferença para assim finalizar o empreendimento. E, para dar prosseguimento à obra, deverão destituir a incorporadora e contratar uma outra empresa. Segundo Bueno, o patrimônio de afetação traz uma segurança maior, embora os riscos persistam. "Há riscos de novos desembolsos, mas com este regime ficam restritos à obra contratada." Ele ainda explica que o pagamento das dívidas previdenciárias, tributárias e trabalhistas é obrigatório para que o imóvel receba o "habite-se" - autorização para habitação do imóvel - e a diferença quando existe patrimônio de afetação está na restrição do montante devido, o que limita a responsabilidade do comprador. Os riscos são os mesmos, embora minimizados pela separação de contas, destaca Bueno. "Antes, para obter a certidão negativa de débito no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e na Receita Federal, levava-se em conta o total da dívida da incorporadora." Por exemplo, se a empresa tivesse um débito de R$ 100 milhões com o INSS e um empreendimento respondesse por apenas R$ 10 milhões, não era possível quitar apenas este valor e assumir a finalização da obra. Hoje, isto é possível se houver regime de afetação. É importante reconhecer, como lembra o advogado Maucir Fregonesi, do escritório Castro, Barros, Sobral, Vidigal, Gomes Advogados, a dificuldade de acompanhamento da obra na prática por parte dos condôminos. "É preciso fazer um controle, o que engloba a contabilidade do empreendimento. Para isso, os futuros compradores precisam de tempo e disponibilidade para que sua atuação seja efetiva. Na prática, isto costuma não acontecer." Risco é maior sem patrimônio de afetação Apesar de também ter riscos, a nova regra traz uma evolução em relação ao modelo sem patrimônio de afetação. Sem esta separação de patrimônios, todos os empreendimentos de uma construtora ou incorporadora em falência eram colocados numa conta comum. Os compradores dos imóveis de uma empresa nessa situação entravam na fila de todos os demais credores da massa falida para receberem seus direitos, ou o que sobrar deles. Portanto, o regime de afetação representa maior segurança. MP também facilita arrecadação fiscal A MP veio facilitar a arrecadação fiscal, de acordo com Fregonesi. "A responsabilidade pelo montante das obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias referentes à obra ficam por conta dos condôminos. É necessário pagá-las para darem continuidade à construção, em caso de falência da incorporadora." Anteriormente, como as dívidas não eram separadas por empreendimento, entravam na massa falida da empresa que, muitas vezes, não chegava a pagá-las na íntegra. Por isso, ele reconhece que a pulverização do débito facilitou a arrecadação fiscal.

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