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Suspensão de negócio da Amil não tem prazo para acabar, diz presidente da ANS

Paulo Rebello diz que interrupção de operação aconteceu porque a operadora não passou as informações necessárias à reguladora

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Por Julia Affonso
Atualização:

BRASÍLIA - O diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, disse ao Estadão nesta quarta-feira, 9, que a operação de mudança do controle da operadora APS (Assistência Personalizada à Saúde) precisa de mais explicações. O processo foi paralisado após decisão do órgão regulador e, segundo o dirigente, a suspensão vai durar até que a suposta aquisição do controle societário da APS, que controla quase 340 mil planos de saúde individuais da Amil, seja esclarecida.

Até nova decisão da ANS, a APS continua sendo uma operadora do Grupo Amil. Em reunião na noite desta terça-feira, 8, a agência barrou o negócio de R$ 3 bilhões da APS para a Fiord Capital, empresa de reestruturação financeira. Controlada pela americana UnitedHealth, a Amil pagou R$ 3 bilhões para a Fiord, do empresário sérvio Nikola Lukic, ficar com a carteira de clientes do Paraná, Rio e São Paulo.

O diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado - 6/10/2021

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O que levou a agência a barrar a venda da ANS para suspender a operação societária da operadora APS?

Faltou informação por parte da operadora (APS e Amil) com o regulador. A gente teve reuniões com eles previamente, solicitaram a transferência de carteira. A transferência de carteira, eles cumpriram a resolução 112 que nós temos e foi caminhando de forma normal. Obviamente, a gente tem um monitoramento mais preciso tanto da fiscalização quanto da diretoria assistencial, sobretudo em razão do tamanho da transferência, foram 330 mil vidas. A gente fez esse acompanhamento e eles também fizeram algumas reuniões com a área técnica. A área técnica deles com a nossa área técnica, tanto da parte assistencial quanto da parte econômica-financeira. Ao longo de 2021, eles estavam já fazendo alguns movimentos da rede e após essa transferência de carteira não houve mais qualquer nenhuma alteração, mas obviamente aquelas pessoas que já estavam naquele plano e que usufruiam de determinadas redes acabaram sentindo e foi isso que a gente ficou preocupado. 

E o que a ANS fez quando percebeu esses problemas?

Em razão desses problemas que estavam surgindo, o que eu fiz? Eu soltei um ofício pela Diretoria de Normas e Habilitação da Operadora, com relação ao econômico-financeiro e também pela Presidência. Pela Presidência eu soltei um ofício também pedindo esclarecimentos para eles em razão das matérias que estavam sendo veiculadas. Você faz um movimento desses de transferência de carteira, depois aparece um comunicado, uma informação que a UHG vai sair do Brasil. Então, precisava entender melhor o que estava acontecendo e depois apareceu essa história desses investidores. Quando não há alteração de controle societário, o controlador permanece o mesmo, pode entrar alguns outros sócios sem que a gente (ANS) tenha necessidade de previamente autorizar. Esses novos sócios que iriam entrar, a gente precisaria ver de fato quem são as pessoas, dar uma analisada quem são os sérvios, se tem capacidade econômica de assumir, se é um grupo econômico, quem vai ser o controlador. Não estou dizendo que a gente aprovaria previamente, mas a gente precisava ter conhecimento. Tivemos a reunião ontem lá no Rio, presencial, conversamos com ele e as informações continuaram a não chegar para a gente. Eu disse: não tem como, a matéria-prima da agência, da regulação, é a informação, são os dados. Se eu não posso trabalhar em tese nem vocês podem. Sob alegação de sigilo da informação, estar dizendo que não vão informar ao regulador. Vamos colocar um ponto aqui, vamos só esclarecer uma questão. Eles tinham dito que tinham feito acordo, assinado um acordo com essas pessoas, essas duas empresas e uma pessoa física, estariam registrando.

Foi por isso que a ANS decidiu barrar a operação?

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Terminando aquela reunião, eu marquei uma extraordinária. Dessa reunião extraordinária, eu fiz o voto condutor da indisponibilidade da transferência das cotas e que eles nos apresentem toda a documentação para que a gente possa avaliar se vai poder prosseguir com essa transação ou não. Foi isso que a gente fez. A gente está dando um freio de arrumação nesse processo. O que deveria ter sido feito desde o começo: apresentado essa documentação, a gente ter analisado e se der tudo ok à luz do aspecto econômico-financeiro, a solvência, capacidade de arcar, de custear, a gente envolve questão de lavagem de dinheiro. A gente precisa saber dentro dessas empresas quem são os sócios, os acionistas. Tudo isso é analisado na agência, tudo isso a gente tem que fazer essa análise prévia. Isso não foi feito, não foi submetido, então, em razão disso, vamos parar. Já oficiamos a Junta Comercial de São Paulo, suspendendo, caso tenha (sido) feito algum registro lá, que o desfaça, aguardando autorização da agência para que possa prosseguir nessa transação. Agora, vamos aguardar. Eles disseram que vão submeter o quanto antes essa documentação da reunião de ontem. A agência está diligente, está preocupada sempre com o beneficiário. A gente fez, a palavra é, freio de arrumação. Vamos ter calma, o que a gente está fazendo é preservando os beneficiários. Eles precisam apresentar as condições para que a gente possa avaliar se essa operação pode acontecer. Caso contrário, a gente vai ter que reorganizar ou indeferir se for o caso. Sequer a documentação a gente recebeu.

Paulo Rebello, diretor-presidente da ANS Foto: Adriano Machado/Reuters - 6/10/2021

Qual é a preocupação da ANS?

Obviamente a preocupação maior nossa é com o beneficiário. Essa questão, embora tenha uma relação comercial que deve acontecer, está acontecendo e que a agência, em tese, não tem nenhuma preocupação com relação a essa relação prévia, do acordo que é feito entre eles, o beneficiário na ponta é o nosso foco sempre. É a qualidade assistencial, os beneficiários sendo atendidos e foi isso que acabou acontecendo na reunião de ontem. Vamos aguardar essa documentação chegar para que a gente possa avaliar e tocar o processo.

Neste momento, as carteiras estão apenas com apenas com a APS, sem a Fiord?

Continua com o mesmo grupo econômico que estava, com a APS que vai gerir essa carteira.

O empresário sérvio Nikola Lukic participou da reunião de ontem? Algum representante da Fiord?

Não. Ontem só quem esteve foi o pessoal da Amil, Renato Casarotti, vice-presidente institucional, e o José Carlos Magalhães e o Edvaldo Vieira (diretores da Amil).

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A Fiord vai apresentar a documentação para a ANS?

A Amil vai ter que apresentar junto à APS para apresentar toda essa documentação, esse contrato que foi feito entre eles, quem são os sócios. Tem uma documentação que as resoluções normativas 270 e 85 estabelecem que são os critérios e documentos (que precisam ser apresentados). Vai balizar tudo aquilo que a gente precisa, organograma da sociedade, quem são, são vários itens que a gente cobra que seja apresentado para que a gente possa entender como vai se dar a estrutura toda, o quadro social.

A Amil pagou os R$ 3 bilhões?

Essa informação nós não temos. Questionamos ontem, eles não tinham a informação. Acho que quem está tratando isso é a UHG. Algumas informações que nós pedimos na reunião eles não tinham em mãos. A exemplo essa questão do quadro societário, de quem eram os sócios dessas empresas (investidoras), se eles estavam sabendo se houve esse pagamento ou não, se é um contrato oneroso, ou seja, se no caso a Amil iria receber esse valor que e tinha sido mencionado, R$ 2 bilhões e alguma coisa, perto de R$ 3 (bilhões). Pela forma do documento que eles queriam apresentar para a gente na hora, que eles estavam lendo na hora dava a entender isso. Eles (Amil) disseram: "não, a gente vai fazer o seguinte, a gente vai segurar. À luz do que tem a regulação de vocês, a gente vai apresentar esse material completo para que possa ser submetido a vocês para que possa avançar no processo". 

Se não estiver tudo ok, a ANS não aprova?

Não aprova. Continua ela (APS) gerindo a carteira. Eu preciso entender como foi feito esse acordo. Eu não tenho nem esse acordo desse valor, desse repasse que estaria nesse contrato, eu não tive acesso ainda. Estou na especulação. Foi o que eu falei para eles: "eu estou numa situação que eu estou sabendo, como regulador, estou enxergando e vendo as coisas através da imprensa". O fato é que a primeira pessoa que deveria saber não está sabendo. Formalmente, a gente não recebeu nenhuma informação nesse sentido.

O que deveria ter acontecido? A Amil, a APS ou a UHG tinham que ter informado sobre a negociação com os fundos para a ANS?

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Isso. Previamente, a relação comercial entre eles, contratual, têm que existir para que possa chegar a esse ponto de submeter à agência. A transação é feita, faz esse contrato. Obviamente, a gente não vai saber previamente o que ele tratou, quais são as cláusulas, os termos, as obrigações, os deveres de cada um. Isso é previamente entre eles. Agora, só vai surtir efeito no mundo real, para a agência, para os beneficiários, após a nossa aprovação. A gente é que permite autorização, fusão, cisão, transferência societária, tudo depende da agência. Para que isso efetivamente aconteça, para que esse contrato passe a ser executado, a gente precisa autorizar e isso não foi feito. Por isso, a gente fez essa parada, esse "break". Podendo, inclusive, ser aberto um processo sancionador contra eles, se tramitou esse contrato junto à Junta Comercial à revelia da agência. A gente vai avaliar, precisa ver a documentação. Preciso ver o que de fato aconteceu, se de fato ele já juntou na Junta Comercial, se não foi feito, o que eles fizeram até agora. Isso só baseado nas informações que eles nos prestarem e os documentos que apresentarem é que a gente vai poder chegar a uma conclusão.

Esse "break" pode durar quanto tempo?

A gente tem um fluxo de análise normal. O fato é que hoje está parado e eles precisam submeter isso para a gente. Se passar um ano para apresentar essa documentação, vai estar um ano parado esperando que eles apresentem. Como eles disseram que vão apresentar logo, o que acontece? Tem três possibilidades. A primeira é uma vez eles cumprindo todas as exigências que têm na norma, a gente aprova a transação. (A segunda é que) a gente pode indeferir a transação em razão de situações, como incapacidade econômica financeira, outras exigências que solicitamos e eles não apresentem. Ou a gente pode sobrestar o processo para que eles completem a documentação que é exigida nesta norma. São esses três caminhos. Não tem um prazo específico.  Costumo dizer que é rápido, a gente faz essa análise de forma rápida, não é uma análise demorada. São várias diretorias. Tem que passar pela diretoria assistencial, a econômica-financeira, vai para outras áreas, contadores, assessoria normativa para ver se cumpriu as exigências da parte documental. Tem uma análise ampla. Tramitação rápida no sentido de poder ser um mês, dois meses três meses. Relativamente rápida.

Houve conflito de interesse pelo fato de o diretor de Desenvolvimento Setorial substituto na ANS, Cesar Serra, ser casado com a advogada Virgínia Rodarte, que atuou para a Amil e o grupo UnitedHealth?

Ela falava pela APS, ela estava representada pela APS e participou dessa questão da transferência de carteira. Ela fez esse movimento, mas ele é impedido nesse processo. Nem na reunião de ontem ele participou. Eu o convidei, ele não sabia qual era o tema (da reunião). Eu falei, ele disse que não queria participar. Ele poderia muito bem como diretor participar, mas não proferir voto. Ele disse que preferiria nem da reunião participar. A reunião aconteceu sem que ele estivesse presente.

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