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Paulson marca pontos no Tesouro

Por Neil Irwin
Atualização:

Quando Henry Paulson assumiu o Departamento do Tesouro, há 16 meses, ele falou em termos grandiosos sobre moldar o destino competitivo dos Estados Unidos. Em sua audiência de confirmação, nenhuma pergunta focou o mercado imobiliário ou o setor de hipotecas. Entretanto, um pouco abaixo da superfície uma crise de crédito estava prestes a estourar. Agora que as crises dos mercados financeiro e hipotecário reforçam temores de uma recessão, ele foi forçado a agir para tentar evitar o pior. Usando as habilidades que desenvolveu em três décadas no Goldman Sachs, ele persuadiu executivos de bancos a criarem um fundo privado para comprar veículos de investimento para que seu colapso não infecte a economia em geral. Sua equipe está desenvolvendo políticas para conter a inundação de execuções hipotecárias antecipadas nos próximos meses. Seu legado como secretário do Tesouro provavelmente será o de gestor de uma crise. Com 61 anos, Paulson ganhou elogios no Congresso por ser flexível e criativo na resposta aos problemas. Também arrancou críticas: da esquerda, por não agir num desastre imobiliário que afetou milhões de americanos até ameaçar grandes bancos; da direita, por concordar, com muita presteza, com novos regulamentos para o sistema financeiro. "Acho que estamos desenredando isso", disse Paulson, no mês passado. "Mas reconheço também que vai levar mais tempo para esses mercados operarem da maneira que deveriam e, até que operem, há um certo grau de" - fez uma pausa, como que procurando palavras que não provocariam pânico - "fragilidade do sistema." Numa crise financeira, há limites para os poderes de um secretário do Tesouro. Ele não pode obrigar os mercados a se acalmarem e não pode cortar taxas de juros, que é uma prerrogativa do Federal Reserve (o Fed, banco central dos EUA). "Não há uma porção de botões mágicos", disse Robert Nichols, presidente do Financial Services Forum e ex-funcionário do Tesouro. Assim, quando os mercados de um amplo leque de produtos da dívida desandaram no fim de julho, Paulson tomou poucas atitudes visíveis. Publicamente, disse que os danos no setor hipotecário pareciam, "em grande parte, contidos". Privadamente, buscava furiosamente informações, sobretudo com telefonemas frenéticos. "Acho que qualquer um que tenha lidado com Hank (Paulson) viveu situações em que recebeu ligações dele às 16h30 e lhe disseram que a pessoa estava no banheiro", disse Joshua Bolten, o chefe de gabinete da Casa Branca. "E torna a ligar às 16h33 e quer saber se a pessoa ainda estava no banheiro." Paulson se aproveitou de 30 anos de contatos de alto nível. Ele ligou para James Dimon, presidente-executivo do J. P. Morgan Chase, para se informar sobre o mercado de hipotecas, um ramo que não era de grande interesse do Goldman Sachs. "Ele não conhece o negócio como nós", disse Dimon. Ele ligou para o presidente do American Express, Kenneth Chenault, para saber se empresas e consumidores estão reduzindo gastos. (Não estavam, àquela altura). Ligou para James Owens, presidente da empresa de equipamentos de construção Caterpillar, para perguntar como os problemas estavam afetando as indústrias. Em agosto, quando os investidores perderam a fé em diversos produtos da dívida e se recusavam a comprá-los a qualquer preço, Paulson continuou reunindo informações e sua equipe começou a idealizar políticas que pudessem atenuar os milhões de execuções que os analistas havia começado a prever. Depois de suas 12 horas no prédio do Tesouro, ele passava noites fazendo mais telefonemas de sua casa em Washington. Os funcionários dizem que a atmosfera, em particular no auge da crise, era espantosamente informal. Paulson surgia regularmente no escritório do subsecretário do Tesouro, Robert Steel, um ex-colega no Goldman Sachs, ou do secretário-adjunto para mercados financeiros, Anthony Ryan, para compartilhar alguma informação preciosa que acabara de descobrir ou especular sobre alguma idéia. Em setembro, quando os danos cresceram, ele convidou altos executivos do Citigroup, J. P. Morgan Chase e uma dúzia de outros grandes bancos para uma série de reuniões no Tesouro para discutir uma espécie de salvamento próprio. Alguns desses bancos enfrentavam problemas sérios com o que hoje se conhece como veículos de investimento estruturado. Esses fundos, que não são contabilizados em balanços, haviam investido pesado no mercado de hipotecas subprime. Se esses fundos desabassem, grandes bancos poderiam ter de cortar drasticamente os empréstimos para assegurar caixa. Os bancos acordaram a criação de um fundo de U$ 75 bilhões, que ficaria disponível para comprar ou emprestar contra títulos desses veículos de investimento estruturado. Paulson descreveu o papel de sua equipe no Tesouro como o de fazer companhias privadas chegarem a um acordo de interesse mútuo e observou que nenhum dinheiro do contribuinte iria para o fundo. Mas, ao usar a sua influência para fazer executivos conversarem, ele pode ter criado um precedente para a intervenção do governo no salvamento de instituições financeiras, o que poderia animar financistas a assumir mais riscos. Barney Frank, democrata de Massachusetts, presidente da Comissão de Serviços Financeiros da Câmara, disse que apoiava a iniciativa de Paulson, chamando-a de uma forma de "regulamentação branda". Mas alguns conservadores não concordaram. "Eles estão tentando evitar uma liquidação por motivo de incêndio desses ativos", disse Kevin Hassett, bolsista do American Enterprise Institute. "Mas, às vezes, você precisa fazer uma liquidação quando há um incêndio." Em outubro, Paulson pediu a modernização do sistema bizantino de regulamentação de bancos. Também indicou abertura para padrões nacionais de corretores hipotecários e outras medidas regulatórias que tradicionalmente eram mais populares para administrações democratas. "Acredito em mercados, não em mercados desregulamentados", disse Paulson. "Vi o que acontece se a regulamentação não corresponde ao crescimento do mercado." Os democratas ainda reclamam de que não está sendo feito o bastante para os donos de casas ameaçados de execução da hipoteca. O senador democrata de Nova York Charles Schumer, presidente da Comissão Econômica Conjunta do Congresso, disse: "A sensação é de que Paulson faria uma parte disso por conta própria, mas está sendo um bom soldado da administração." Paulson relutou em assumir o cargo no Tesouro. As experiências de seus antecessores não eram animadoras. O primeiro secretário do Tesouro do presidente George W. Bush, Paul O? Neill, foi afastado de decisões importantes e depois destituído. O segundo, John Snow, era amplamente visto mais como porta-voz da administração do que como um poderoso tomador de decisões. Bush convenceu Paulson, cujos 32 anos no Goldman Sachs incluíram sete como chairman e presidente-executivo, de que ele jogaria um papel vital na formulação política. Em particular, esperava-se que Paulson administrasse as relações econômicas com a China, uma nação que havia visitado dezenas de vezes em sua carreira. Ao aceitar a nomeação, Paulson descreveu a sua missão em palavras altissonantes, referindo-se ao "zelo competitivo do povo americano", sustentando um amplo papel de supervisionar relações globais e tentar assegurar o lugar dos EUA na economia do século 21. Mas entre as primeiras ações estiveram medidas para preparar o ministério para uma crise financeira. Snow havia fechado uma "sala de monitoramento de mercados" para economizar dinheiro. Paulson reabriu o espaço, onde cinco membros da equipe agora analisam continuamente os dados dos mercados de ações, bônus e moedas e notificam altos funcionários do Tesouro quando os mercados se comportam de maneira estranha. O Grupo de Trabalho sobre Mercados Financeiros do presidente, criado após o crash do mercado acionário de 1987 para coordenar a reposta a uma crise financeira, raramente se reuniu. Alguns de seus principais integrantes de diferentes agências nem sequer tinham os números dos celulares dos outros membros. Paulson programou reuniões trimestrais de seus principais membros, incluindo ele próprio e os diretores do Fed, da Securities and Exchange Comission (SEC, equivalente à CVM brasileira) e da Comissão de Comércio de Commodities Futuras (CFTC, na sigla em inglês). Ele também orientou as diversas agências para desenvolverem planos de contingência para uma crise, segundo pessoas que estiveram nas reuniões. O grupo fez "exercícios de mesa" que eram essencialmente jogos de guerra financeiros, passando por mecanismos de como cada agência poderia agir na eventualidade de, por exemplo, uma queda de 1.000 pontos em um dia do índice Dow Jones. Os participantes da equipe trocaram números de celulares e traçaram árvores de telefones. Criaram linhas para videoconferências e imaginaram como levar anúncios à mídia. O sistema teve seu primeiro teste em 27 de fevereiro, depois que o mercado acionário chinês despencou e o Dow Jones parecia cair 546 pontos. Usando o novo sistema de comunicações, as agências envolvidas rapidamente descobriram que parte da queda fora provocada por uma falha de computador, de modo que os danos não eram tão graves como pareciam. O pânico foi evitado. O sistema testado nesse dia tem estado em uso constante nos últimos quatro meses, mantendo os principais tomadores de decisões em contato durante a montanha-russa dos mercados financeiros. Enquanto isso, Paulson, um neófito na política de Washington, cultivava relações no Congresso. Quando Frank mencionou para ele que um eleitor seu fora detido na China por um problema de passaporte, Paulson perguntou a uma alta autoridade chinesa sobre o caso em sua visita seguinte ao país. O eleitor, disse Frank, pôde voltar para casa. Frank chama Paulson de "razoável e flexível". COLABOROU RICHARD DREZEN *Neil Irwin escreve para o ?The Washington Post?

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