PUBLICIDADE

Publicidade

PEC autoriza nova rodada de auxílio emergencial sem atrelar a medidas de cortes de gastos

Versão final do texto deve ser protocolada no Congresso ainda nesta segunda, para votação na quinta; segundo a PEC, a adoção de outras medidas com impacto fiscal, no entanto, dependeria de novo estado de calamidade

Foto do author Adriana Fernandes
Foto do author Daniel  Weterman
Foto do author Murilo Rodrigues Alves
Por Adriana Fernandes , Daniel Weterman , Idiana Tomazelli e Murilo Rodrigues Alves
Atualização:

A nova rodada do auxílio emergencial a vulneráveis deve ser autorizada pelo Congresso sem uma vinculação direta a medidas de corte em despesas para compensar o gasto adicional, como queria a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes. A adoção de outras medidas com impacto fiscal, porém, dependeria de um novo decreto de calamidade, que acionaria automaticamente gatilhos de contenção de despesas, incluindo novo congelamento de salário de servidores.

PUBLICIDADE

Esse formato consta em minuta do relatório do senador Marcio Bittar (MDB-AC), obtida pelo Estadão. O texto permite que o auxílio seja pago sem uma nova calamidade, por meio de crédito extraordinário fora do teto de gastos (regra que limita o avanço das despesas à inflação) e sem interferir no esforço que a equipe econômica precisa fazer para atingir a meta de primário, que permite rombo de até R$ 247,1 bilhões. Trata-se de uma “via rápida” para tirar o benefício do papel.

Ao mesmo tempo, a proposta cria um novo marco fiscal a ser acionado em futuros casos de calamidade nacional como o da pandemia de covid-19, com autorização para gastar de um lado, mas, de outro, responsabilidade de puxar o freio naquilo que não for considerado essencial. A calamidade precisa ser decretada pelo Congresso Nacional, e nada impede que haja uma iniciativa deste tipo ainda este ano, após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Integrantes da equipe econômica, porém, não veem essa necessidade, diante do fato de que o auxílio já terá sido destravado.

O senador Márcio Bittar (MDB-AC). Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

A minuta da PEC não detalha o valor a ser gasto na nova rodada do benefício, nem o número de parcelas, apenas abre caminho para que uma lei discipline seu pagamento fora das amarras fiscais. Uma autorização constitucional desse tipo é considerada essencial por técnicos da área econômica porque, um ano depois do início da pandemia, a despesa com o auxílio não pode mais ser considerada “imprevisível”, como requer a legislação para relaxar as restrições orçamentárias.

O governo, porém, já tem delineados os principais parâmetros da nova rodada do benefício. A equipe econômica trabalha para que o valor total não ultrapasse os R$ 40 bilhões, com quatro parcelas de R$ 250 a serem pagas nos meses de março, abril, maio e junho a até 40 milhões de brasileiros. Nem todo esse gasto virá do crédito extraordinário, uma vez que beneficiários do Bolsa Família já recebem em média R$ 190 por mês do programa. Nesses casos, o Orçamento do Bolsa banca o benefício regular, e o dinheiro do auxílio entra apenas com o complemento do que falta para atingir os R$ 250.

Fontes do governo disseram ao Estadão que até aceitam editar uma Medida Provisória (MP) com a nova rodada do auxílio logo após a PEC ser aprovada no Senado, na quinta-feira, 25, antes mesmo da votação na Câmara, desde que haja um compromisso dos deputados em aprovar a proposta logo em seguida. Os próprios técnicos da área econômica, no entanto, veem riscos jurídicos e resistem a essa solução.

Como o Estadão mostrou na semana passada, a equipe econômica entende que a economia obtida com o congelamento de salários de servidores até o fim deste ano, aprovado como contrapartida ao auxílio financeiro a Estados e municípios, já compensa uma nova rodada do auxílio. Ao todo, foram poupados R$ 138 bilhões, sendo R$ 40 bilhões apenas para a União. Além disso, o governo vê as novas regras, tanto para calamidade quanto o “protocolo” para enfrentar crises fiscais, como compensações que surtirão efeito no médio prazo.

Publicidade

Emergência fiscal x calamidade 

A PEC traz dois tipos de marcos: um para calamidades nacionais, como a da covid-19, e outro para episódios em que as despesas correntes de Estados e municípios superam 95% de suas receitas correntes (no caso da União, a proporção é despesa obrigatória superior a 94% do gasto total). Os gatilhos são semelhantes e incluem congelamento de salários e criação de novas vagas no serviço público, além proibição a novos concursos à concessão de novas renúncias tributárias.

A diferença é que, nas crises fiscais, a União, cada Estado ou município será responsável pela adoção das medidas de ajuste, de acordo com o quadro financeiro local. É possível que um município esteja em emergência fiscal, enquanto seu vizinho gaste normalmente. Já na calamidade de âmbito nacional, a União adota um “regime extraordinário fiscal” para responder à crise, enquanto todos precisarão seguir o protocolo de contenção de despesas até dois anos após o fim da calamidade.

O governo cogitou criar um Conselho Fiscal da República, integrado pelo presidente da República e pelos presidentes do Senado, da Câmara, do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União, além de um governador e um prefeito. Esse colegiado ficaria responsável por decretar o estado de calamidade pública. No entanto, a pedido do presidente do STF, Luiz Fux, essa ideia foi abandonada. Na visão de Fux, o presidente da Corte não poderia participar de um conselho tomando decisões que poderiam ser questionadas posteriormente. Técnicos legislativos também viram inconstitucionalidades no desenho. Sem o Conselho, caberá ao Congresso decretar um novo estado de calamidade, quando necessário.

PUBLICIDADE

Regime extraordinário

A minuta da PEC prevê a adoção, durante o estado de calamidade, de um regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender a urgência das medidas de combate à pandemia da covid-19. É uma nova versão da PEC de guerra que vigorou em 2020, no primeiro ano da pandemia, e permitiu os gastos bilionários para o enfrentamento do impacto da doença na saúde e na economia.

Nesse regime extraordinário, o governo federal poderá adotar processos simplificados de contratação de pessoal, em caráter temporário e emergencial, para obras, serviços e compras. Esse processo simplificado não pode, no entanto, gerar despesa obrigatória de caráter continuado.

Publicidade

Um item da PEC diz que as propostas do Congresso e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas ficam dispensados das limitações legais para ampliação de despesas ou de incentivo ou benefício de tributária que tenha renúncia de receita.

Nesse ponto, a PEC fala de forma geral, sem especificar, por exemplo, a desoneração do diesel e do gás de cozinha que o presidente Jair Bolsonaro anunciou na semana passada que começa a valer a partir de primeiro de março. A minuta diz que para ficar fora das restrições a renúncia precisa ser feita para enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas. Um conceito bem abrangente.

A PEC suspende a proibição que existe para que as empresas com débito na Previdência Social recebam incentivos fiscais ou de crédito. A PEC abre a brecha para que uma lei complementar possa definir outras suspensões e dispensas que poderão ser aplicadas durante a vigência de calamidade pública.

Renúncias

A minuta da PEC que autoriza a concessão do auxílio emergencial dá um prazo de seis meses para o presidente Jair Bolsonaro encaminhar ao Congresso um plano de redução gradual e linear de incentivos e benefícios tributários. O plano terá que estar acompanhado das propostas legislativas de mudanças com impacto orçamentário.

O plano deve garantir a redução de 10% desses incentivos. No prazo de até 8 anos, os benefícios e isenções não poderão ultrapassar 2% do Produto Interno Bruto (PIB). A lista de exceção, porém, é grande.

A PEC deixa de fora da meta os incentivos para o Simples das micro e pequenas empresas, as entidades de assistência social, partidos políticos (inclusive suas fundações), entidades sindicais dos trabalhadores, instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, programas de financiamento das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, produtos da cesta básica, além da Zona Franca de Manaus. Esse tipo de medida já foi tentada, sem sucesso em outras ocasiões.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.