BRASÍLIA - Repasses do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) vinculados ao pagamento de benefícios previdenciários são a origem dos R$ 4 bilhões encontrados pelo Banco Central numa subconta de um grande banco privado. A revelação foi feita pelo BC em resposta ao requerimento de informações solicitado pela Câmara dos Deputados ao ministro da Fazenda, Guido Mantega. O dinheiro foi contabilizado como um crédito da União e ajudou a melhorar o resultado fiscal das contas do setor público em maio.
Assinado pelos diretores do BC Carlos Hamilton (Política Econômica) e Anthero Meirelles (Fiscalização), o ofício enviado por Mantega, ao qual o Estado teve acesso, comunica o valor exato do registro contábil: R$ 4.376.757.504,36. Mas o BC não informou o nome do banco e nem deu outros detalhes sobre a investigação aberta por sua área de fiscalização.
O Estado revelou, em 11 de julho, a descoberta desses R$ 4 bilhões em uma conta até então não identificada, relacionada a pagamentos da Previdência Social. Para o autor do requerimento, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), a descoberta do dinheiro deve estar relacionada às “pedaladas” fiscais.
A expressão foi cunhada pelos especialistas para explicar a prática do Tesouro Nacional de adiar, de um mês para o outro, o repasse de pagamentos aos bancos (públicos e privados) dos recursos usados para o pagamento de programas sociais, como o Bolsa Família e abono salarial, e previdenciários, como aposentadorias e pensões.
Essas “pedaladas” permitiram aumentar temporariamente o superávit primário das contas do governo para melhorar as expectativas em torno da capacidade do governo de cumprir a meta fiscal. Após a reportagem, uma série de “pedaladas” fiscais vieram a público, envolvendo principalmente a Caixa Econômica Federal. Desde agosto, os atrasos começaram a ser normalizados, o que contribuiu para piorar as contas públicas até o registro de um déficit em setembro. Mantega tem negado a existência das “pedaladas”.
Insatisfeito. Faria de Sá afirmou estar insatisfeito com as explicações do governo e vai pedir informações complementares ao ministro. “A nota usa termos técnicos para não explicar o que aconteceu”, disse. E criticou o fato de o Ministério da Fazenda não ter dado explicações, limitando-se a enviar apenas as respostas do BC.
No texto, o BC diz que o INSS contrata instituições financeiras para realizar o pagamento de benefícios previdenciários, o que envolve a representação contábil de créditos e débitos entre as partes. Os diretores rejeitam o uso de “contabilidade criativa” com os recursos da Previdência. Segundo o BC, o crédito do Tesouro estava numa subconta de passivo do banco privado, que usualmente não é abrangida pela coleta automatizada de dados de apuração do resultado fiscal. Isso porque houve uma mudança dos procedimentos de registros contábeis dessa instituição.
A ocorrência, diz o BC, não alterou as estatísticas fiscais, já que a conta foi identificada e incorporada ao resultados. “Em virtude da ação tempestiva do BCB, não houve divulgação de estatísticas fiscais indevidamente impactadas pela ocorrência descrita”, diz o ofício.
No texto, o BC diz que a mudança feita pela instituição financeira nos registros não provocou distorção na avaliação de sua situação. Também não houve diferença nos montantes repassados aos beneficiários da Previdência. “É incorreta qualquer referência a resultados parciais, preliminares ou provisórios supostamente apurados pelo BCB, havendo apenas um único resultado efetivamente apurado e divulgado ao final de todo o processo.” Procurado, o BC não quis comentar o ofício.
Para lembrar. Quando faltavam poucos dias para o anúncio das contas do setor público de maio, a área técnica do Banco Central percebeu que havia uma diferença entre o resultado do governo federal apurado pelo Tesouro e o registrado pelo Departamento Econômico do BC (Depec). Os dois usam metodologias distintas de cálculo, mas o dado do BC é o usado como referência para o cumprimento da meta fiscal.
O BC percebeu a discrepância e foi investigar a razão. Foi identificado, então, um crédito em favor do Tesouro no valor de R$ 4 bilhões numa subconta de um banco privado, que não estava no radar do sistema automático de apuração do resultado pelo BC. Com o crédito dessa conta, o déficit de R$ 15 bilhões, que seria inicialmente divulgado, caiu para R$ 11,07 bilhões na divulgação oficial.