12 de abril de 2022 | 15h15
RIO - Além da eleição do novo presidente da Petrobras e da renovação do conselho de administração, a assembleia de acionistas da estatal vota na quarta-feira, 13, outras questões que podem ajudar a blindar a empresa do uso político. O edital da assembleia prevê mudanças no estatuto social que reforçam a governança da companhia petrolífera, uma maneira de tornar mais difícil a interferência do controlador, que é a União. Outra estratégia virá da iniciativa dos acionistas minoritários, que, mais uma vez, tentam ampliar o número de representantes no conselho, reduzindo assim o espaço do governo.
Entre os pontos que serão levados à votação para o novo estatuto está a blindagem do diretor de Governança e Conformidade, que só poderá ser admitido ou despedido por meio de quórum qualificado, ou seja, em vez da maioria simples (50% mais um), será necessário pelo menos dois terços de aprovação do conselho.
A atuação de comitês também será mais intensa, com os comitês de Pessoas e de Minoritários atuando sempre que houver propostas de mudanças no estatuto sobre critério para indicação de membros do conselho de administração e da diretoria. Os comitês de Investimentos e de Minoritários deverão passar a assessorar o conselho de administração na avaliação da carteira e execução de projetos de investimentos, o que é feito anualmente.
Um dos pontos mais importantes nesses tempos de disparada do preço dos combustíveis em ano eleitoral é a proposta de estender o poder do conselho de administração para a definição de políticas globais de responsabilidade social da Petrobras. Hoje, os poderes do conselho se concentram no plano estratégico da companhia, na eleição da diretoria, e na fiscalização das contas da empresa.
“Com essas mudanças vai ficar mais difícil a interferência do controlador (a União). Está havendo uma tentativa de aperfeiçoamento dos mecanismos de governança”, afirma o advogado Guilherme Amorim, sócio de Rubens Naves Santos Jr. Advogados.
Ele explica que, como sociedade de economia mista e na posição de empresa estatal, a Petrobras tem realmente uma função social, mas que precisa ser controlada. A última mudança do estatuto da companhia foi em 2020, seguindo outra feita em 2017 justamente para garantir que crimes cometidos em gestões passadas não se repitam e para impor limites ao controlador. Agora, essas regras ganham reforço e devem ser aprovadas sem problemas, segundo Amorim.
“Tem uma pressão muito forte por esses atos de gestão da Petrobras, principalmente pelo relacionamento com a política social e o mercado, porque repercute na credibilidade da empresa. É muito importante deixar claro como o governo vai se posicionar. Desta maneira o conselho, que monitora as atividades da companhia, vai ter objetividade para ver o quanto custa à companhia atender o interesse social”, diz o advogado, lembrando que essa atuação social pode inclusive interessar a alguns investidores.
De acordo com a diretora-geral da Kroll para a América Latina, Fernanda Barroso, empresa especializada em compliance (que avalia a conformidade da empresa às leis e normas de órgãos regulamentadores), os acionistas minoritários da Petrobras devem conseguir aprovar o voto múltiplo e aumentar a presença no conselho de administração, emplacando mais um representante, diante da pressão cada vez maior do uso da Petrobras pelo acionista controlador.
Recentemente, a petroleira anunciou um programa de R$ 300 milhões para subsidiar gás de cozinha para famílias em situação de vulnerabilidade, e frequentemente o presidente Jair Bolsonaro reclama de não poder interferir na estatal.
“Por mais que a União seja obrigada a compensar a companhia quando protege o interesse do consumidor em detrimento da livre concorrência, isso afeta o valor da empresa no longo prazo, por isso acho que, dessa vez, os minoritários podem ser bem sucedidos”, diz a executiva.
Em condições normais, a chapa de oito nomes indicados para o conselho pela União seria votada em bloco. Com o uso do voto múltiplo, já requerido pelos acionistas, os votos passam a ser individuais e podem se concentrar em um único nome. No caso dos minoritários, os votos serão concentrados em José João Abdalla Filho, conhecido como Juca Abdalla, presidente do banco Clássico e maior acionista individual da Petrobras, e no advogado Marcelo Gasparino, candidato à reeleição pela segunda vez.
Somados aos indicados por voto em separado pelos acionistas minoritários de ações ordinárias e preferenciais, a União passaria a ter seis cadeiras no conselho, os minoritários quatro, e os empregados uma, a já reeleita Rosangela Torres.
Fernanda Barroso, da Kroll, chama a atenção também para a rapidez da apreciação dos nomes que serão levados à assembleia para os cargos no conselho. Ela aponta, por exemplo, o fato de o indicado à presidência da companhia, José Mauro Coelho, não ter 10 anos de liderança ou negócio em área correlata, o que poderá ser questionado pelos acionistas.
“Como os nomes chegaram muito em cima da hora e a assembleia é amanhã, e geralmente se espera uma antecedência para fazer uma avaliação de ambos os lados, pode ser que, mesmo aprovados esses nomes (pelo Comitê de Pessoas da Petrobras), eles não possam por algum motivo ocupar o cargo”, alerta a especialista. Ela lembra que no curto espaço de tempo que o comitê teve, seria impossível a verificação de todos os pontos necessários de uma diligência.
A experiência mostra, porém, que o antecessor de Coelho, general Joaquim Silva e Luna, foi aceito mesmo sem cumprir o requisito dos 10 anos no setor de petróleo, e vai deixar a empresa após quase um ano de gestão bem avaliado pelo setor e pelo mercado financeiro como gestor da estatal.
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