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'PIB reflete ressaca do consumo e Lava Jato'

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Por Fernando Dantas
Atualização:

Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, acha que os maus resultados do PIB do segundo trimestre - e as perspectivas ruins à frente - são explicados pela "ressaca" do modelo baseado no consumo, somada aos fortes efeitos da Operação Lava Jato na economia e na política. A seguir, os principais trechos da entrevista.Quais as suas impressões sobre o PIB do segundo trimestre? Mostra que a desaceleração se aprofundou, como esperado. A queda de 1,9%, na comparação dessazonalizada com o primeiro trimestre, foi superior à nossa previsão de 1,5%.O que explica isso? O erro da nossa projeção na indústria foi muito explicado pelo péssimo desempenho da construção civil. Embora já estivéssemos esperando um resultado muito ruim, com queda de 5%, o recuo na verdade foi de 8,4%. E me parece que uma das explicações naturais, além da retração do setor de construção habitacional, é a questão da infraestrutura, com claros efeitos extras econômicos da Lava Jato.O investimento também parece ter sido afetado. A formação bruta de capital fixo veio em linha com nossa projeção, com uma queda muito dramática de 8,1%. Temos motivos para acreditar que o investimento esteja caindo quase generalizadamente, mas, dentro desse número, parece ter contribuição importante da Lava Jato, por meio do recuo da construção.Como o sr. viu a queda nos serviços e na renda das famílias? Chama atenção que pelo segundo trimestre consecutivo temos queda de serviços, mostrando que o carro-chefe da economia nos últimos anos já não contribui para o crescimento do PIB. E, dentro dos serviços, o que se destaca é a queda forte do comércio, que há dois trimestres recua na ordem de 3%. O que percebemos é que houve um padrão de crescimento muito calcado na inclusão social, na melhora do mercado de trabalho. Isso foi um processo virtuoso até um determinado momento - 2010, 2011 -, mas que bateu no limite dado pelo desajuste macroeconômico, queda do PIB potencial, perda de competitividade, câmbio sobrevalorizado, etc. Agora começamos a pagar o preço, via um ajuste mais dramático da economia.Há chances de alguma surpresa positiva que melhore esse cenário em 2015 e 2016? Talvez do lado do setor externo, que foi o único dado positivo, com alta da exportação e forte queda da importação. Houve forte contribuição do setor externo em atenuar a queda do PIB. Pode ser que venha alguma surpresa daí. Mas na questão central do crescimento, a parte de consumo, há todos esses indicadores antecedentes mostrando confiança estacionada em níveis baixíssimos. A confiança da indústria também está em recorde de baixa, e há a indefinição em relação aos resultados fiscais - até segunda-feira vamos ver a questão da CPMF, quais a chances de fazer mais uma pernada de ajuste com aumento de carga tributária, que naturalmente não é a melhor maneira de induzir confiança.E quando haverá recuperação econômica de fato? Bem, só em 2017. O que precisa ser dito é que esse ajuste é diferente de outros que eu assisti, e não é só por causa dos aspectos estruturais de controle de gastos. Agora é mais grave porque a carga tributária já é muito alta. Mas tem um outro fator que torna tudo isso muito mais complicado, que é a Lava Jato, tanto na dimensão econômica, com a paulada no PIB - tem gente que fala de perda de até dois pontos do PIB. Se for correto, sem ela poderíamos falar de um PIB caindo de zero a -1%, que era o que tínhamos no final do ano passado. Essa paulada pelo lado econômico é muito forte e dificulta fazer o ajuste fiscal pelo lado da receita. Além disso, a Lava Jato é uma bomba também na política, levando a um quadro tumultuado, beligerante, de fratura na base governista.Qual o impacto do 2º trimestre nas suas projeções para a economia daqui em diante? Esperamos a divulgação para fazer nossa revisão da projeção para este ano, que passa de queda de 2,2% para queda de 2,7%. No terceiro trimestre, revisamos de -0,5% para -0,6%, e, para o quarto, de -0,4% para -0,3%. O cenário, portanto, é de quatro trimestres negativos este ano. Hoje, as previsões mais sombrias de queda de 3% do PIB em 2015 já não são algo que possamos descartar.  

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