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Planalto liga fracasso de leilão a risco jurídico

Governo ficou perplexo com falta de interesse pela BR-262, considerado o 'filé' do pacote

Por Lu Aiko Otta e BRASÍLIA
Atualização:

A presidente Dilma Rousseff foi informada na noite de sexta-feira que o risco jurídico relacionado aos contratos e a possíveis questionamentos sobre os preços dos pedágios afastou as empresas potencialmente interessadas na concessão da BR-262. O trecho da rodovia entre o Espírito Santo e Minas Gerais foi oferecido à exploração pela iniciativa privada na sexta-feira, mas não recebeu propostas. O fracasso de um negócio que era considerado um "filé" causou perplexidade no governo. O resultado inesperado comprometeu o que era para ser uma estreia forte da sequência de leilões em infraestrutura que o governo preparou para este ano. A ideia era que os leilões de rodovia "bombassem", criando um clima positivo para as demais licitações, que movimentarão investimentos próximos a meio trilhão de reais e são a principal aposta do Planalto para puxar o crescimento nos próximos anos.O governo esperava ter motivos para comemorar com as concessões. No entanto, os principais interlocutores de Dilma tiveram de correr para buscar respostas para um resultado tão distante do antecipado. Embora a BR 050, ofertada no mesmo dia, tenha recebido oito propostas, dentro do roteiro construído pelo governo federal, o "vazio" no leilão da BR-262 deixou um gosto de frustração.Mesmo assim, o governo não reduziu suas expectativas em relação ao potencial do ciclo de concessões iniciado na sexta-feira. "Nada muda", afirmou ao Estado o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Ele ressaltou que há outros negócios importantes sendo oferecidos às empresas. Na próxima quarta-feira, há dois eventos importantes. Primeiro, acabará o prazo para manifestação de interesse na exploração do campo de Libra, no pré-sal, cuja outorga foi fixada num valor mínimo de R$ 15 bilhões. No mesmo dia também será conhecido o resultado do leilão da BR 050, com expectativa de um deságio importante. "Vamos tocando", disse o ministro.Intimidação. Guido Mantega considera que a ausência de propostas para a BR-262 foi um evento isolado e provocado por razões que não são econômicas, e sim políticas. A mesma leitura foi feita pelo ministro dos Transportes, César Borges, que conversou com Dilma na noite de sexta-feira. "A concessão virou bandeira de luta política que alguns pré-candidatos ao governo podem ter levantado", disse Borges ao Estado. "As empresas sofreram intimidação. Quem vai entrar, sabendo que por razões políticas vão judicializar a questão?", questionou.O ministro não citou nomes, mas ao citar pré-candidatos ele estava fazendo uma referência ao senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que deve concorrer ao governo de seu Estado. Ele liderou uma movimentação da bancada de seu Estado para modificar as regras da concessão da BR-262 no trecho capixaba, como mostrou reportagem publicada pelo Estado no dia 23 de agosto.Lá, o trecho a ser concedido terá duas praças de pedágio, com tarifas de R$ 9,00 e R$ 9,70, mesmo levando em conta que boa parte da duplicação será feita com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O argumento contrário ao valor sugerido é de que, no Espírito Santo, a BR-262 é usada por pequenos produtores rurais, que não teriam como arcar com a tarifa.A proposta de Ferraço era que o governo duplicasse todo o trecho e depois fizesse a concessão apenas para manutenção e conservação da via, o que resultaria em tarifas mais baixas.Borges e a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, receberam os capixabas. Eles não aceitaram a proposta dos parlamentares, mas prometeram que a concessionária duplicaria 10% do trecho no Estado antes de começar a recolher pedágio da população. Pela regra do edital, essa duplicação poderia ser feita na seção mineira da rodovia e a cobrança poderia começar para toda a extensão concedida."Eu não tenho a menor ideia do que aconteceu com a BR-262", disse o senador Ferraço. "Mas o governo transferir essa barbeiragem para nós é uma coisa covarde." Desistência. Diante do risco de a discussão sobre os contratos irem parar na Justiça após o processo de licitação, é pouco provável que a BR-262 volte a ser oferecida em leilão, informou o ministro dos Transportes. A hipótese de uma nova concorrência havia sido aventada na sexta-feira, porque o governo tinha todas as indicações que haveria interessados no negócio. Mantega disse ter ouvido de oito a dez concessionários que o trecho é interessante do ponto de vista econômico. "Não dá para entender", comentou. Borges tinha a mesma informação. "Até quinta-feira à noite, estava tudo certo, tudo redondo."

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