Política ambiental de Bolsonaro deve dificultar relação comercial de Brasil e EUA

Ainda na campanha, novo presidente dos EUA ameaçou Brasil por falta de medidas contra desmatamento na Amazônia; especialistas veem riscos para exportações aos EUA – 3º parceiro comercial do País, atrás de China e União Europeia

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Por Luciana Dyniewicz
3 min de leitura

Após quatro anos de incerteza no comércio internacional causada pela tensão entre China e Estados Unidos, os exportadores brasileiros passam a ter outro motivo de apreensão a partir de hoje, com a chegada de Joe Biden à Casa Branca. A preocupação começa a ser, agora, com a política ambiental do governo Jair Bolsonaro, que já vem estremecendo as relações com a União Europeia

Antes mesmo de ser eleito, o então candidato democrata ameaçou o Brasil por causa da falta de medidas para frear o desmatamento da Amazônia. “Se não parar (o desmatamento), vai enfrentar consequências econômicas significativas”, disse.

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Agentes de segurança patrulham Casa Branca onde Biden tomará posse hoje. Foto: Andrew Kelly/Reuters

Biden não especificou se poderia haver sanções comerciais, mas, segundo Matias Spektor, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), é possível vislumbrar um cenário negativo para os exportadores brasileiros. “A péssima reputação do governo Bolsonaro no quesito ambiental já abriu espaço para que protecionistas no exterior fechem seus mercados para produtos brasileiros. O acordo de livre-comércio com a União Europeia está congelado. Houve países como Irlanda que ameaçaram punir as exportações brasileiras. Não é inconcebível que interesses protecionistas nos EUA aproveitem a reputação do Brasil nesse quesito, durante o governo Biden, para tentar bloquear o acesso brasileiro ao mercado americano.”

Spektor destaca que possíveis bloqueios dependerão também da situação dos EUA e poderão mudar de segmento para segmento. Restrições à importação de laranja, por exemplo, costumam ser improváveis quando ocorrem geadas na Flórida, prejudicando a produção local. 

O advogado Welber Barral, secretário de Comércio Exterior entre 2007 e 2011, destaca que as relações comerciais foram estáveis nos últimos anos e vê na política ambiental brasileira o único ponto com potencial para alterar essa tendência. “Nos últimos dez anos, não houve grande alteração no fluxo entre os países, que diminui quando tem crise, mas depois melhora. O que pode mudar isso é alguma orientação de Biden em relação às exigências ambientais.” Segundo ele, a administração Biden poderia seguir o exemplo da União Europeia, onde está em consulta pública a possibilidade de se introduzir sanções a mercadorias cuja produção tenha causado desmatamento.

O economista Livio Ribeiro, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, diz, porém, que o maior risco estaria nos fluxos de investimento direto e financeiro. “O País poderia ser enquadrado por não ter boas práticas ESG (sigla em inglês para aspectos ambiental, social e governança), e isso ser um limitador de investimento, como já vimos fundos europeus fazerem.”

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As dificuldades decorrentes da política ambiental são uma das poucas questões que os especialistas já veem como definidas. Em outras áreas, ainda será preciso aguardar maiores sinalizações (leia mais abaixo). Por enquanto, ainda não está definido nem quem será responsável por comandar a implementação do acordo de facilitação de comércio, assinado em setembro, e que em tese poderia reduzir a burocracia nas exportações. A intenção é que o documento seja também a base para um acordo comercial mais amplo. 

Para Barral, não é possível prever se Biden vai dar continuidade ao projeto. O economista-chefe do banco MUFG Brasil, Carlos Pedroso, afirma, porém, acreditar que o presidente eleito será pragmático. “Vejo os EUA mantendo os acordos. A relação entre os países tende a ser amigável, porque o Brasil também tem uma importância geopolítica na região.”

A concretização de um acordo comercial entre os países seria, segundo Barral, a única forma de alavancar as exportações brasileiras para os EUA. “Quando o consumo aumenta lá, o Brasil não tem competitividade para aumentar sua parte.”