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Política econômica na contramão da história

Por Nathan Blanche
Atualização:

Em 1860, em discurso ao Congresso norte-americano, o presidente Abraham Lincoln declarou sabiamente que "não se pode criar prosperidade desencorajando a poupança. Não se pode amparar o pobre arruinando o rico. Não se pode ajudar os seres humanos continuamente fazendo por eles aquilo que eles podem e devem fazer por si próprios". Infelizmente, o governo brasileiro não tem seguido essa ideia.Ao longo da última década, é possível identificar dois grupos distintos na América Latina no que diz respeito ao desenvolvimento econômico. De um lado, México, Chile, Peru, Colômbia e Brasil (até 2006). De outro, Argentina e Venezuela.No primeiro grupo foram adotados modelos de gestão econômica tendo como princípio abertura comercial, liberdade do fluxo de capitais, câmbio flutuante, responsabilidade fiscal e regime de meta de inflação, operado por bancos centrais independentes. Já no segundo bloco a política econômica se baseia no intervencionismo do Estado na economia, maior protecionismo, controle do fluxo de capitais, controle de preços e irresponsabilidade fiscal.O primeiro bloco tem conseguido taxas elevadas de crescimento, desemprego baixo, ganhos de renda e controle da inflação. No segundo, o resultado tem sido crescimento instável, investimento em desaceleração, inflação elevada e deterioração das contas externas. Em alguns deles já se nota desabastecimento de produtos e ágio de mais de 50% no mercado negro de câmbio.A partir de 2008 e, sobretudo, após a eleição da presidente Dilma, o Brasil abandonou o grupo dos estáveis e enveredou para o tipo de gestão vista no segundo grupo. A nova matriz econômica é baseada em relaxamento da política monetária, expansionismo fiscal e manipulação de preços e controle do câmbio e uso de barreiras tarifárias para elevar a competitividade do setor industrial. Os resultados disso são deterioração do saldo comercial, queda do investimento, crescimento pífio e inflação mais alta.Ademais, com as frequentes mudanças nas regras do jogo, por meio de normativos cambiais para capital estrangeiro (IOF) sobre crédito e financiamento, o Brasil está voltando a ser o "patinho feio". E o aumento das incertezas já reflete na elevação do prêmio de risco em relação aos países do primeiro bloco, apesar do elevado montante de reservas internacionais.Apesar da piora dos indicadores econômicos e das expectativas, continuam a surgir medidas, pacotes e propostas no sentido de dobrar as apostas no atual modelo econômico. Conselheiros próximos à presidente têm sugerido: 1) elevar a meta de inflação, atualmente em 4,5% ao ano, já alta em comparação à média da meta dos países do primeiro bloco (2,75%); 2) reduzir o superávit primário via expansão dos gastos correntes; 3) desvalorizar o real; e 4) intensificar a concessão de crédito subsidiado por meio de bancos públicos. Essa piora de gestão vem resultando em aumento de incertezas, redução de investimentos e menor crescimento da economia. Além disso, manifesta-se na redução do fluxo de capitais para o País, que está negativo neste ano. Para um país que tem baixo nível de poupança doméstica (14,8% do PIB) e, portanto, necessidade de poupança externa para crescer, a notícia é péssima, principalmente quando se observa o excesso de liquidez existente no mundo.A necessidade de capitais para financiar o déficit em conta corrente no ano é de US$ 110 bilhões. Caso a entrada de dólares não se confirme, haverá um potencial de desvalorização do câmbio, o que só se agrava, tendo em vista que 10% da dívida pública está nas mãos de estrangeiros e que cerca de US$ 320,6 bilhões é a posição de estrangeiros em ações. Neste caso, o efeito será inflação mais elevada e retração da atividade econômica.Diante dos frágeis indicadores econômicos e das eleições em 2014, ou o governo dobra sua aposta na nova matriz econômica ou retoma o bem-sucedido tripé de política econômica baseado em câmbio flutuante, responsabilidade fiscal e meta de inflação.A chance de que a segunda alternativa seja a escolhida é pequena. Sendo assim, conformemo-nos todos em entrar no túnel do tempo para as décadas de 1970 e 1980. A conta a pagar, com relação a crescimento, inflação e bem-estar, será alta já a partir de 2015.* É SÓCIO-DIRETOR DA TENDÊNCIAS CONSULTORIA INTEGRADA

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